MOSTRAR VISUALIZAÇÕES DE PÁGINAS

sexta-feira, 19 de abril de 2013

"O FANTÁSTICO DA VIDA É ESTAR COM ALGUÉM QUE SABE FAZER DE UM PEQUENO INSTANTE, UM GRANDE MOMENTO"---AUTOR DESCONHECIDO---TIRE OS OLHOS DAS DIFICULDADES E ENFRENTE A REALIDADE---EVA IBRAHIM


                                          E, FOI ASSIM.
O automóvel adentrou ao pátio do Hospital e Maternidade buzinando freneticamente; as pessoas ali presentes deram passagem. Certamente deveria estar ocorrendo uma emergência, tal a velocidade com que o veículo chegou e estacionou em frente à porta de entrada. O homem abriu a porta, saiu correndo e dizendo que havia um bebê nascendo. Dois enfermeiros apareceram com uma maca para levar a paciente para o Centro Obstétrico. Os curiosos se posicionaram para ver a ocorrência e poder comentar o fato.
A mulher foi retirada do automóvel e, gemendo muito, foi colocada sobre a maca, que se tingiu de vermelho pelo sangue que escorria do seu vestido. Carlos, o marido, parecia uma barata tonta, andava de um lado para outro sem parar. O guarda do Pronto Socorro pediu que se acalmasse e retirasse o veículo dali. 
O homem ficara desesperado quando a mulher disse que a bolsa de águas havia se rompido. Mal conseguira colocar as roupas, que deveria levar ao Hospital, no automóvel, pois, estava com muita pressa. Carlos precisava correr para não perder mais um bebê; disso ele tinha certeza. O primeiro filho do casal nasceu prematuro e não sobreviveu.
Sua esposa estava fazendo repouso desde que foi constatado que sua placenta era baixa e poderia ter um parto de urgência. Estava explicado o desespero de Carlos, que era filho único e tinha loucura por ter muitas crianças em casa. 
Eloisa entrara em depressão quando perdeu o primeiro filho; ambos sofreram muito. Agora era a hora de realizar o sonho de ter um bebê em casa; um filho muito amado e desejado. Uma menina com nome forte, escolhido pelo pai, Valentina Duarte Fonseca como a avó paterna.
Ele tirou o automóvel da entrada e estacionou no pátio, longe da porta de emergência. Quando voltou foi tomar um copo de água e preencher a ficha da mulher. Parecia estar em transe, agia automaticamente com o olhar perdido em algum ponto indefinido. 
Procurava por Eloisa, que parecia ter sumido por aqueles corredores imensos e assustadores. Foi orientado pelo segurança do local a aguardar notícias da esposa na saleta de espera do Centro Obstétrico, no quinto andar. Um estranho silêncio reinava no local, o que deixava o homem mais inquieto, queria saber o que estava acontecendo lá dentro; estava com medo.
Depois de um longo tempo, uns quarenta minutos, que pareciam uma eternidade, apareceu uma enfermeira dizendo que Eloisa estava na sala de parto. Eufórico, o futuro papai, pediu para assistir o parto e lhe foi dado um gorro e um avental para entrar na área restrita, onde aconteceria o nascimento do bebê.
A enfermeira retornou e ele ficou sozinho com o avental e o gorro nas mãos. Não sabia o que fazer com aquilo ou como colocar aquela estranha roupa. Então, tirou a roupa que estava usando, pois achou que não poderia entrar naquele recinto com uma roupa qualquer. Rapidamente, Carlos colocou o avental aberto nas costas, o gorro enfiado na cabeça e, em seguida adentrou á Sala de Parto..
A equipe toda aguardava a chegada do bebê que já podia ser visualizado. A técnica de enfermagem que iria recepcionar o recém-nascido olhou assustada quando o homem passou por ela. Carlos tinha o traseiro nu, sapatos com meias e o gorro na cabeça. O homem estava sem a roupa de baixo, apenas com o avental aberto atrás; a equipe toda franziu as sobrancelhas. Naquele momento solene do nascimento de uma criança todos se entreolharam e riram disfarçadamente. A atenção da equipe médica fora desviada para a situação cômica de ter um acompanhante somente com um avental transparente dentro da sala de parto.
O anestesista, que era quem estava com as mãos desocupadas, pegou uma tira de esparadrapo e fechou a traseira do avental do homem. Em seguida deu um banco de inox para ele sentar-se e todos riram, pois deveria estar gelado; a sala tinha ar condicionado. Carlos estava tão nervoso que nem percebeu a situação que fora criada por ele; além de hilária era inusitada. Um acompanhante quase pelado na sala de parto!
A criança nasceu bem e Carlos acompanhou tudo só de avental. Quando Eloisa foi para a sala de recuperação o homem foi orientado a colocar suas roupas, que nunca deveria ter tirado. 
No dia seguinte ele voltou para desculpar-se com a equipe médica pelo constrangimento, mas, disse que não perderia o nascimento da filha por nada, nem que tivesse que ficar totalmente despido; a ansiedade o impedira de raciocinar. Feliz e com um sorriso no rosto foi visitar as duas mulheres de sua vida, Eloisa e Valentina. Um texto de Eva Ibrahim.

domingo, 14 de abril de 2013

"QUERO A DELÍCIA DE PODER SENTIR AS COISAS MAIS SIMPLES"---MANUEL BANDEIRA.--- SONHAR É VIAJAR COM O CORAÇÃO, PELAS ASAS DA IMAGINAÇÃO".---EVA IBRAHIM


                                         SONHAR É PRECISO.
            Enquanto Celina olhava o enorme e majestoso balão colorido sobre a relva, sentia-se hipnotizada, eram muitas lembranças que passavam por sua cabeça. Estava acompanhada do marido e dos filhos, mas, custava crer que iria voar em um balão de verdade. Era lindo, tinha um cesto enorme pousado ali no chão; incrível mesmo! Raul lhe fizera uma surpresa e ela ficara muda. Era um sonho de criança voar lentamente ao sabor do vento e planar no ar como os pássaros.
           Hoje em dia é um passeio turístico programado e seguro. O grupo era composto de 16 pessoas, que iriam voar a bordo do balão naquela manhã; o baloeiro, dois tripulantes e treze passageiros, Chegaram bem cedo, ás cinco horas da madrugada do domingo; ainda estava escuro, mas o Sol não tardaria a aparecer. Enquanto aguardavam os preparativos finais para a subida no cesto da aeronave, Celina, sentada em um toco de árvore, buscava as mais remotas lembranças; anos felizes que passara em Barbacena.
          Celina, duas irmãs, um irmão e dois primos, passavam férias em um casarão antigo no centro da cidade de Barbacena, casa dos avós maternos das crianças. Na construção havia um lindo jardim distribuído harmoniosamente em frente á casa; flores variadas de muitos tipos embelezando a moradia antiga. Separado por cerca viva havia um grande quintal com árvores frutíferas. Uma enorme árvore se sobressaia entre as demais, era uma mangueira, que dava muitos frutos saborosos e sem fio. As crianças a chamavam de rainha do quintal, pois comiam as mangas todos os dias. Seus galhos frondosos serviam de cadeira e um deles de suporte para a balança que comandava as brincadeiras.
         O tio Roque, que era solteiro e ainda morava com os pais, colocara uma tábua bem no alto para as crianças sentarem e amarras de corda para segurar e não correr o risco de caírem. Daquele local podiam ver a cidade e a Igreja da “Boa Morte” que ficava bem ao alcance dos olhos. Na verdade era uma mangueira que dava frutos doces como o mel das abelhas e onde as cinco crianças davam asas à sua fértil imaginação.
         Celina e o primo Jairo eram os maiores e mais sonhadores; imaginavam reis, rainhas, fadas, super-heróis e viagens mirabolantes. O tio, muitas vezes, contava histórias fantasiosas dos livros do escritor francês Júlio Verne. Uma delas era: “Cinco semanas em um balão” e outras tantas histórias famosas. As cinco crianças ouviam atentas e depois imaginavam viagens no “Zepelin” e balões encantados. Ficavam de olhos fechados e mãos dadas para gerar energia; fora o tio quem lhes falara sobre a energia das mãos. Passavam horas sentadas sobre a tábua da árvore, embaladas pelo farfalhar das folhas ao sabor do vento. Quando a fome aparecia era só esticar o braço e se fartar com a fruta suculenta. Para descer, o tio fizera uma escada de corda; era fantástico!
         Uma rotina de todos os dias, durante as férias escolares. Eles ficavam brincando no quintal pela manhã e a tarde no alto da mangueira. Imaginavam que eram vigias e olheiros avançados para detectar a aproximação dos piratas. A mangueira era o ponto mais próximo do mar, um posto indispensável para a segurança da população. Lá podiam ver a vizinhança e sentir o vento no rosto. Quando batia o sino da Igreja da Boa Morte anunciando a hora da Ave Maria eles desciam da árvore e seguiam para casa, era hora de entrar, ordens da velha avó.
         Quando o Mané, vizinho da chácara, faleceu, o tio levou as crianças ao velório e fez cada um deles beijar os pés do defunto, dizia que era para não ficar com medo do morto. Foi o maior sacrifício já imposto a eles. Não adiantou nada, pois eles tremiam ao pensar na morte. Um dia Celina propôs aos irmãos e primos irem até a Igreja tirar essa história de morte a limpo. O padre Bento, já bem velhinho, foi atender as crianças.
         –O que queriam saber? Perguntou o velho pároco. O primo Jairo gaguejou, mas Celina o socorreu dizendo:
        - Como sua Igreja pode ser chamada de “Boa Morte”, a morte deve ser muito ruim!             
        Padre Bento com muita paciência explicou às crianças que a morte faz parte da vida e se alguém morre na graça de Deus teve uma boa morte. Não ficaram satisfeitos, mas, aceitaram à explicação e deixaram aquela história de lado. Nunca mais queriam ver defuntos e muito menos beijar-lhes os pés.
         -Que nojo!
 Disse Jairo e todos concordaram.
         Aos domingos iam à missa e depois ficavam brincando de subir e descer às escadas da Igreja. À tarde eles sentavam-se no jardim da praça e ficavam imaginando as viagens mais fantásticas do mundo. O tio Roque apanhava o livro de Júlio Verne “Volta ao mundo em oitenta dias” e incentivava a imaginação das crianças. Na verdade eles adoravam aquele tio desocupado que tinha muitos livros de aventuras; ele já estava aposentado, foi professor no ginásio da cidade.
         O balão estava pronto e seus dirigentes aguardando os passageiros. Celina voltou à realidade seguindo até o balão com os filhos e o marido para realizar aquele sonho de criança. Uma nostalgia se instalou em seu semblante, queria os irmãos e primos naquele balão. As pessoas foram se ajeitando dentro do cesto, uma criança começou a chorar, mas logo se acalmou e a aeronave iniciou a subida lentamente. Todos olhavam ao redor e uma luz forte surgia no horizonte; era o amanhecer no campo. A paz reinava no local e as pessoas embevecidas procuravam uma melhor posição para ver e filmar aquela aventura única.
         O balão sobe com o ar quente do gás propano, que alimenta o fogo do maçarico. Quando acionado faz um barulho característico e forte quebrando o silêncio do passeio. A aeronave voa ao sabor do vento, que deve ser propício, senão a aventura pode se tornar perigosa. Há ausência total da sensação de movimentos, somente a percepção do chão se afastando. Voo raso sobre as copas das árvores e depois sob lentamente a centenas de metros do chão, deixando os passageiros extáticos diante da uma visão panorâmica indescritível. Um voo tranquilo levado pelo vento, onde se pode avistar a sombra do balão, lá embaixo. Os cães latem alvoroçados, as galinhas correm assustadas, pois devem pensar que pode ser um gavião gigante. O gado fica agitado correndo de um lado para o outro enquanto as pessoas acenam dando adeus aos passageiros do balão.
         A vista é maravilhosa e o passeio inesquecível, dura cerca de uma hora no ar cobrindo uma distância de cerca de trinta quilômetros. No final do percurso o baloeiro procura um espaço seguro para descer. Em terra há o apoio da equipe que se comunica através do rádio; é um verdadeiro rali seguir o balão. São estradas de terra esburacadas através dos campos. É permitido que carros particulares de parentes que estão no balão, também sigam a nave.
Escolhido o local do pouso começa a descida lentamente e lá embaixo o grupo de apoio fica esperando o pouso do balão. Quando descem ocorre a festa de comemoração, onde é servido champanhe á todos os participantes e guaraná às crianças.
         Leva meia hora para recolher e dobrar todo o balão, depois a “Van” conduz os passageiros ao Hotel para um delicioso café da manhã. O passeio deixou Celina extasiada e muito grata a seu marido por ter permitido que acontecesse a realização de um sonho de criança. Estava muito feliz e queria contar aos primos o seu passeio deslumbrante. Teria que voltar à Barbacena, aquela cidade era o berço de seus sonhos e rever o tio Roque, agora já bem velhinho, para lhe contar do passeio. O tio Roque ficaria muito feliz.... Um texto de Eva Ibrahim.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

"QUE SEJA LIVRE O QUE CHEGAR. QUE SEJA DOCE O QUE FICAR. E QUE SEJA BREVE O QUE TIVER QUE IR". ---MOZART.---NÃO HÁ LUGAR PARA ONDE CORRER, QUANDO SE DESEJA FICAR... EVA IBRAHIM.


                                  O RATO FININHO.

A primavera chegou trazendo flores, colorindo os jardins e modificando as paisagens; com ela também chegou á temporada das águas. Durante o dia o sol era insuportável e a tarde aparecia um barrado negro no horizonte; em seguida, entre relâmpagos, trovões e ventania era despejada muita água em toda aquela região. Árvores e casas sucumbiam ao poder dos ventos, havia muita destruição deixada pelos temporais. As moradias que permaneciam íntegras tinham suas paredes e muros embolorados com uma camada de musgo verde, por causa da grande umidade.

No final de semana era feita a limpeza geral dos quintais e das casas; rotina das famílias daquela vila. Na casa de Zuleica não era diferente. Ela, o marido, a filha e o genro procuravam manter a casa limpa e protegida de insetos, porque ali moravam os dois filhos do casal e netos de Zuleica. Sérgio, o genro, ficou encarregado de limpar o quintal e o quarto de despejos, que ficava nos fundos da casa. Mexendo em uma caixa de papelão o rapaz viu uma família inteira de ratos. A ratazana mãe com quatro filhotes; quando tirou a caixa os ratos saíram em disparada. A mãe sumiu e os filhotes desapareceram como por encanto. O genro alertou a esposa e a sogra para ficar de olho, porque se algum deles entrasse em casa seria missão impossível encontrá-lo, pois eram ratos fininhos.

No meio da semana o filho de Sérgio, disse que viu um bicho correndo na cozinha. Ele e Arlete, sua esposa, procuraram em todos os lugares possíveis e não encontraram nada, pensaram que poderia ser uma barata e esqueceram o assunto.

 No sábado seguinte, Zuleica levantou-se cedo, fez café e sentou-se na cadeira para sorvê-lo. Ouviu um barulhinho e instintivamente olhou para cima e viu o indivíduo sobre o armário, era ele o rato “Fininho”. Ela o batizou assim porque o genro havia dito que eram fininhos e um deles estava ali. A mulher arrepiou e ficou enojada só de pensar por onde aquela criatura teria andado em sua cozinha. Chamou a filha e o genro e impôs um ultimato:
 - Fininho deveria ser morto o mais rápido possível.
Com o barulho o rato correu para o quarto do casal.

 Zuleica pegou a vassoura e ficou de prontidão, por ali ele não passava. A filha pegou outra vassoura e o Sérgio armou-se com um pedaço de pau. As crianças ficaram encolhidas em suas camas, no outro quarto, tinham medo de Fininho. A caçada começou; Sérgio puxou o guarda roupas e o rato estava lá no cantinho. O homem, com seus um metro e oitenta, nada tinha de ágil, por isso seria muito difícil ele apanhar o ratinho. Quando Fininho aparecia as duas mulheres gritavam com as vassouras nas mãos e o rato corria. O marido ficava bravo; a cena se repetiu por diversas vezes, até que o camundongo entrou embaixo da geladeira.

Mãe e filha ficaram cercando as portas para ele não sair. Quando o rapaz puxou a geladeira, as mulheres gritaram em coro, “dez a zero para o rato”. Enquanto ele corria para a sala, os três se entreolharam e uma pergunta ficou no ar:
-“Como iriam pegá-lo”?
 As duas mulheres estavam assustadas e tremendo de medo de Fininho, pois sempre ouviram falar que são portadores de doenças. Zuleica pensou no marido que estava trabalhando, ele fora criado no sítio e era “especialista” em exterminar camundongos. Arlete tratou de chamar o pai para salvá-las de tão grave ameaça. O pai de Arlete chegou rapidamente; ele iria acabar com o rato Fininho; todos concordaram. Foram á luta. As mulheres com as vassouras ficaram na passagem da porta para impedir que o camundongo saísse e os homens com paus para matá-lo. Fininho era rápido e esperto o que faltava ás pessoas ali presentes. Sérgio puxou a estante e o ratinho saiu correndo antes de tomar a paulada desferida pelo avô. Foi tão rápido que as mulheres mal viram quando ele ganhou a porta da rua.

Respiraram aliviados, pelo menos não sujaram o tapete com sangue de camundongo. Mas, assim mesmo lavaram toda a casa para eliminar qualquer vestígio daquela criatura tão repelente. Ainda assustadas, as crianças puderam sair da cama. Quanto ao camundongo deve estar correndo até agora.
-“Pudera!” O susto foi muito grande! Disse Zuleica sorrindo.
-Fininho escapou por um triz e deve ter ficado com trauma de vassouras, completou Arlete aliviada. Um texto de Eva Ibrahim.

terça-feira, 2 de abril de 2013

"A ARQUITETURA DA MINHA ALMA É BARROCA. SOU FRACO, SOU FORTE, SOU LUZ, SOU SOMBRA. SOU DE AÇO, SOU DE FLORES" ---AUTOR DESCONHECIDO----O VENTO QUE PASSOU POR AQUI ME ENSINOU A VOAR.---EVA IBRAHIM


                                       O HOMEM DAS CHUPETAS.

A menina estava sentada no degrau do portão que dava para a calçada da rua, esperando seu pai chegar. De repente, levantou-se correndo e foi chamar sua mãe. Agarrou-se à saia da mãe e chorando dizia que o homem das chupetas estava lá fora. Alice tratou de acalmar sua filha de cinco anos, que soluçava sem parar. Bruna, a menina, tinha muito medo do homem das chupetas. Quando ele surgia no início da rua, todas as crianças corriam para esconder-se.
Tudo começou quando apareceu na pequena cidade, um mendigo cheio de colares coloridos. Os antigos sempre assustaram as crianças com ameaças de serem levadas pelos homens dos sacos, mas, em Visconde de Borá era o homem das chupetas quem assustava as crianças.
 O mendigo, de alcunha Degão, trazia no pescoço, pendurados, diversos colares com chupetas de crianças, que eram amarradas com barbante. Quando ele andava com o saco de objetos pessoais nas costas, os colares balançavam e faziam um barulho estranho. Parecia um guizo de cobra coral, o que tornava o maltrapilho mais assustador.
 As mães aproveitavam a figura aterrorizante para fazer medo às crianças e contê-las dentro de casa. Naquele bairro pobre da periferia a maioria das pessoas vivia com dificuldades, por isso ninguém dava esmolas; Degão mal conseguia o que comer. Porém, ele sempre trazia chupetas novas penduradas no pescoço. O homem andava por ali já fazia algum tempo e uma pergunta passou a ser feita pela população local.
-Se o mendigo não trabalhava, como ele conseguia dinheiro para comprar chupetas?
 A verdade é que cada vez que ele aparecia trazia novos colares com mais chupetas. Eram tantas que pareciam colares para o baile Havaiano. Degão tornou-se o terror das crianças, que não saiam do portão para fora, desacompanhadas. Os pequenos, que chupavam chupetas, deixavam- nas escondidas embaixo do travesseiro e só a pegavam à noite, na hora de dormir.
Um dia o mendigo apareceu no bar e pediu um trago para uma turma de amigos, que tomavam cachaça antes do jantar, para abrir o apetite, diziam. Degão tomou a cachaça e saiu apressado, quando um dos amigos propôs segui-lo para ver aonde ele conseguia as chupetas. Zeca, o mecânico e Aldo, o pedreiro, resolveram segui-lo. O homem andava rápido pelas ruas escuras e descampadas. Os dois amigos se entreolharam temerosos, estavam indo para o cemitério.
Degão pulou o muro e entrou no cemitério, desaparecendo na escuridão. Os dois amigos resolveram voltar, pois, ficaram com medo de segui-lo.
No dia seguinte voltariam para assuntar com o coveiro se o mendigo dormia no cemitério. A curiosidade aumentou quando voltaram e contaram aos outros amigos para onde o homem tinha ido. Os cinco amigos fizeram uma aposta para descobrir de onde vinham as chupetas; quem ganhasse levava uma caixa de cervejas para casa.
Zeca e Aldo já planejavam um churrasco com a cerveja que iriam ganhar dos amigos. Na hora do almoço os dois homens foram ao cemitério e encontraram o coveiro descansando na sombra de algumas árvores das alamedas entre os túmulos. Enquanto os homens conversavam chegou um casal com uma criança e adentraram ao cemitério. Zeca perguntou ao coveiro aonde o casal iria e ouviram uma história surpreendente.
O coveiro explicou que havia um túmulo onde estava enterrado um menino que morreu depois de ser picado por uma cobra venenosa e sua mãe, muito triste, colocou a chupeta do menino dentro do caixão, pois era a coisa que ele mais gostava. Alguns anos se passaram e surgiram boatos de que o menino fazia milagres; havia sempre muitas flores em seu túmulo.
E a crendice popular dizia que se as crianças dessem a chupeta para ele, nunca mais voltariam a gostar de chupetas. As mulheres da região vinham com seus filhos e deixavam as chupetas ali. No dia seguinte as chupetas desapareciam e todos pensavam que o menino viera buscar, disse o coveiro com olhar assustado.
Os dois amigos desconfiaram de quem roubava as chupetas, mas combinaram com o coveiro para dar um flagrante no ladrão. À noite eles ficariam escondidos para ver quem entrava ali. Com lanternas e máquinas fotográficas eles esperaram o meliante.
O ladrão apareceu e sob as luzes das lanternas começou a chorar.
Degão soluçava e dizia que pegava as chupetas porque quando era criança seu pai não permitira que lhe dessem chupetas e agora ele dormia com uma delas na boca. Ele adorava chupetas.
 O coveiro e os dois amigos se entreolharam surpresos, o mendigo parecia ter um retardo mental; era digno de compaixão.
Os dois amigos fizeram um pacto com o coveiro para manter aquela história em segredo, afinal as chupetas não pertenciam a ninguém e Degão era um pobre homem. Era melhor deixar essa história de lado, milagres eram coisas de Deus e eles não queriam se comprometer. A cerveja ficaria para outra ocasião. Um texto de Eva Ibrahim.

sábado, 23 de março de 2013

"A NOITE ACENDEU AS ESTRELAS, PORQUE TINHA MEDO DA PRÓPRIA ESCURIDÃO".---MÁRIO QUINTANA---"NO FUNDO É SIMPLES SER FELIZ; DIFÍCIL É SER TÃO SIMPLES".---LEONI.


                                                  O PERNALONGA.
Era uma cidade pequena localizada no planalto paulista; lugar onde a indústria têxtil empregava a maioria da mão de obra da região. As indústrias de tecidos seguia a tradição deixada pelos seus fundadores. As confecções estavam por toda parte; havia muitas lojas de roupas de crianças. A variedade era grande e pessoas de outras cidades vinham para comprar no atacado e revender.
O automóvel descia a rua principal e no volante um senhor de meia idade conversava com sua filha Laura, que estava sentada no banco do carona. Era um bom carro aquele, um Honda, corria muito e Pepe, o pai, estava contente, pois realizara seu sonho. Por isso os dois saíram da cidade vizinha para fazer compras para a loja de roupas infantis, da outra filha, a Sonia, que fora inaugurada recentemente.
Na verdade o homem queria testar o automóvel novo; estava feliz. Pai e filha ficaram satisfeitos com as compras de roupas infantis, realmente aquela fábrica, onde compraram, vendia com preço bom e vantajoso. O pai propôs parar em uma lanchonete para comerem alguma coisa, estava com fome e Laura concordou. Pepe, olhando para os lados à procura do local ideal para estacionar, viu correndo na calçada um rapaz com uma sacola na mão. Atrás dele uma porção de gente gritando – pega-ladrão – pega-ladrão.
 O homem tinha pernas longas e corria rapidamente; olhava para trás e ria com jeito abobalhado. Ninguém o alcançava, ele corria como se estivesse em uma maratona, chacoalhando a sacolinha que levava na mão. Pepe assustado parou o automóvel para ver o que estava acontecendo e de repente um policial armado de metralhadora abriu a porta de trás do carro e mandou o motorista seguir o meliante. Laura gritou assustada e seu pai disse que não poderia perseguir o rapaz, pois, aquela rua, era contra mão. Com a arma em punho o policial dizia ser autoridade e ele deveria obedecer.
Pepe, com olhos arregalados, mal conseguia dirigir tamanho era seu nervosismo; não queria estragar seu carro novo. Laura olhou para o policial com a arma apontada para os transeuntes e perguntou o que o rapaz que corria havia roubado.
-Deveria ser alguma coisa de muito valor, quem sabe alguma joalheria? Ponderou a moça.
-O que havia na sacola que o rapaz carregava? Perguntou Pepe, assustado.
Para surpresa dos dois, o policial disse que o assalto fora na padaria e ele roubara alguns pães. O motorista ficou pasmo, todo aquele movimento de pessoas e até metralhadora para pegar um ladrão de pães?
- Por acaso ali seria o “Velho Oeste” americano, na versão brasileira?
Naquele momento apareceram duas viaturas para dar apoio ao policial, que felizmente desceu do automóvel de Pepe. O Pernalonga finalmente foi rendido pela força policial. Deitado no chão e algemado ele sorria o tempo todo; era visível que tinha algum problema mental. Desapontado os policiais abriram a sacola e de lá caíram três pãezinhos do tipo francês e algumas moedas. Quando a família apareceu explicou que o dinheiro era para pagar os pães. O rapaz não era ladrão, apenas tinha um retardo mental, mas, fazia compras normalmente.
Ele pegou os pães e todos ficaram olhando para ele. Com certeza pensaram que ele não iria pagar e o rapaz assustado saiu correndo, promovendo uma verdadeira caçada. Tudo fora esclarecido e os pães foram pagos. O suposto ladrão de um metro e noventa, seguiu para a delegacia com os policiais e familiares.
Os policiais desconcertados pediram desculpas ao Pepe, que nada tinha a ver com a ocorrência. O homem e sua filha trataram de ir embora daquele lugar onde o roubo de pães era atendido com metralhadora. Por pouco seu carro novo não virou peneira; estavam na linha de fogo....,
-Ufa! Que horror.  Um texto de Eva Ibrahim.

sexta-feira, 15 de março de 2013

"UM DIA, QUANDO OLHARES PARA TRÁS, VERÁS QUE OS DIAS MAIS BELOS FORAM AQUELES EM QUE TIVESTES QUE LUTAR"... SIGMUND FREUD---POR ISSO SE QUISER SE LEMBRAR COM SAUDADES DO DIA DE HOJE, VÁ A LUTA! --- EVA IBRAHIM


                                   UMA CABEÇA FALANTE.
         Cecília parou o automóvel em frente ao portão e acionou o controle remoto, pedindo a Deus para que seu marido estivesse dormindo. Se ele percebesse que ela estava chegando tarde, não haveria desculpa que o convencesse a ouvi-la. Seria cobrada, ofendida e teria que ficar calada mais uma vez; era sempre assim, até ele se sentir satisfeito e parar de atormentá-la. Cecília entrou na garagem e desligou o automóvel. Em silêncio fechou a porta e acionou o alarme, seguia em frente com a certeza de que Arnaldo ainda estaria acordado.
         A mulher adentrou a sala e percebeu que havia uma quietude estranha, nenhum som, apenas os passos dela no chão de madeira podiam ser ouvidos no ambiente escuro. Acendeu a luz do abajur para poder tomar ciência do que havia ali e ficou surpresa ao ver sua filha dormindo no sofá. A mulher ansiosa seguiu para o quarto. O marido estava na cama dormindo e nem se mexeu quando ela entrou. Cecília respirou aliviada, iria se enfiar na cama e dormir rapidamente.
         Mais uma vez o sono não vinha, estava agitada demais para dormir e muito perturbada com os últimos acontecimentos. Foi uma tarde de muita emoção e seus olhos estavam inchados de tanto chorar. Retornara do enterro de seu pai, que havia falecido depois de um longo período de internação no Hospital. Ele morreu de um câncer de fígado, estava na fila do transplante, mas a morte o levou antes de chegar a sua vez. Cecília foi visita-lo algumas vezes e sempre quando chegava, seu marido a ofendia dizendo que ela fora atrás de homens para namorar. Ainda bem que sua filha conseguira fazer o pai dormir antes que ela chegasse, porque não iria suportar mais uma cena daquelas; estava muito triste. Fazia tempo que Cecília não ria pra valer, sua vida tornara-se um tormento, desde que seu marido adoecera.
        Quando Arnaldo e Cecília casaram-se tinham a certeza de uma vida feliz, pois havia muito amor entre eles. O casal tinha uma boa casa e um sítio de 20 alqueires de onde tiravam o sustento da família. Plantavam cana de açúcar, criavam porcos, galinhas, patos e também algumas vacas leiteiras. O caseiro fazia horta e cuidava do sítio; havia fartura no local. Logo vieram os filhos, um casal; Cássio e Luiza e os quatro viviam felizes, uma família perfeita.
        No aniversário de dez anos de Cássio a família toda se reuniu em um grande churrasco; o clima era de festa.  Já estava escuro quando todos os convidados saíram e Arnaldo sentou-se em uma cadeira, parecia desolado. Cecília perguntou se ele estava passando mal e ele disse que estava sentindo muito cansaço e parecia que suas pernas não obedeciam a sua vontade. A mulher o aconselhou a ir deitar-se logo, pois aquilo poderia ser cansaço natural, ele trabalhara bastante nos preparativos da festa. No dia seguinte, domingo de manhã, o homem levantou-se cedo e andava arrastando as pernas; elas pareciam pesadas demais. O dia foi passando e nada de Arnaldo sentir melhoras, pelo contrário, ele começou a sentir formigamento nas pernas.
        Cecília apreensiva prometeu acompanha-lo ao médico na segunda feira. O médico pediu uma porção de exames para depois fazer uma avaliação rigorosa da fraqueza e dormência nas pernas de Arnaldo. Durante a semana foram a diversos locais para exames diferentes e cada vez o homem reclamava mais de dores nas pernas. A situação estava se agravando, ele passava a maior parte do tempo deitado na cama ou no sofá. Finalmente depois de quinze dias e uma junta médica veio o diagnostico: esclerose múltipla.
        A partir dessa data a vida naquela casa mudou completamente. Cecília e Arnaldo passaram a fazer uma busca incessante da cura da doença. No início os sintomas são transitórios e Arnaldo conseguiu ficar bem durante o primeiro mês, após o diagnóstico. Estavam animados e cheios de planos, mas durante uma caminhada no sítio, o homem perdeu as forças das pernas e ficou sentado no chão. Foi levado para a casa do sítio carregado pelo caseiro. Cecília foi busca-lo e o médico achou melhor interna-lo para novos exames. Depois de alguns dias, Arnaldo melhorou e voltou para casa mais animado; parecia estar bem; as dores diminuíram.
        O médico havia explicado à Cecília que os sintomas da doença no início, vão e voltam independente do tratamento. As manifestações da doença são remitente-recorrente e às vezes demora meses ou até anos para nova manifestação. Porém, a situação de Arnaldo não era das mais fáceis, os sintomas eram característicos e bastante graves. O homem sentia fraqueza nas pernas, visão turva e descontrole urinário. Ele foi novamente internado e quando recebeu alta parecia que a doença estava controlada, disse o médico. O casal ficara esperanço, porém, foi pura ilusão.
        Durante um ano inteiro e muitas idas e vindas aos Hospitais Arnaldo percebeu que estava se tornando um inválido; mal conseguia parar em pé, tamanho era o formigamento que sentia nas pernas fracas e bambas. Os três primeiros anos se passaram com crises de média duração, mas no quarto ano, Arnaldo não conseguia levantar as pernas, até que passou a se locomover em uma cadeira de rodas; Cecília estava desolada e fazia tudo para aliviar o sofrimento do marido, tomando conta dos negócios e dando assistência às suas necessidades. Os filhos exigiam atenção da mãe que a essa altura da vida perdera as ilusões, seu marido tinha um péssimo prognóstico e ela teria que ser forte.
         Aos poucos ele foi ficando paralisado, permanecia muito tempo na cama, sua coluna estava comprometida; não andava mais na cadeira de rodas. Os anos foram passando, as crianças crescendo e Cecília lutava com os negócios e cuidava do marido que já não tinha nenhum movimento do pescoço para baixo; seu marido ficara tetraplégico. Arnaldo, aquele moço bonito com quem, um dia, ela se casara, agora era apenas uma cabeça falante. Com lágrimas nos olhos ela virou-se para dormir, nada mais poderia fazer; o relógio marcava meia-noite. Um texto de Eva Ibrahim.
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