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quarta-feira, 13 de junho de 2018

"LIBERDADE É UMA PALAVRA QUE O SONHO HUMANO ALIMENTA, NÃO HÁ NINGUÉM QUE EXPLIQUE E NINGUÉM QUE NÃO ENTENDA". CECÍLIA MEIRELES

OS CARAS PINTADAS ESTÃO DE VOLTA

CAPÍTULO ONZE
             No sábado, após o jantar, a família de Alberto se reuniu para a preparação de suas vestimentas e acessórios, que usariam no dia seguinte. A família iria participar do movimento contra a corrupção, que acontece em grande escala no governo brasileiro. Houve uma convocação geral nas redes sociais e nas mídias para o protesto, que aconteceria no domingo 15 de março de 2015.

          A mãe e os três filhos pediram ao pai que lhes contasse como fora o movimento dos “caras-pintadas” contra o governo de Fernando Collor de Melo, uma vez que ele participara da grande passeata, que mobilizou o país em meados de 1992. E, que posteriormente culminou com sua renúncia em 29 de dezembro de 1992, horas antes de sua cassação.

         Alberto gostava de contar as lutas que presenciara e participara durante os anos difíceis da Ditadura Militar. Queria ensinar aos filhos o valor da democracia e o temor que sentia quando ouvia alguém dizer que queria a ditadura de volta. Assim, ele deixava claro aos seus filhos, que a coisa mais importante do mundo é a liberdade: imprensa livre, ter paz para trabalhar, poder ir e vir sem medo. Lutar pelos seus direitos e cumprir com seus deveres. Nossos avós e pais lutaram para formar uma sociedade de direito e devemos preservá-la, custe o que custar.

              Alberto, então, começou a contar a história que ele vivenciara como cara pintada e que trazia na memória com muito orgulho.

             - A passeata dos caras pintadas no início da década de noventa, se espalhou pelo Brasil. Consistia num movimento contra os desmandos do governo do Presidente Collor, que assumira o governo com muitas promessas de lutas contra a corrupção, ajustes fiscais, econômicos e amparo aos descamisados. Porém, suas atitudes e decisões demonstraram que todas as suas promessas eram falsas. E, que por trás havia um grande esquema de corrupção. Depois do confisco da poupança, o que deixou a população perplexa e as decisões tomadas pelo governo, que não favoreciam os interesses da nação, houve uma tomada de consciência geral.  Então, houve a maior mobilização de protesto popular contra um governo, já visto no Brasil.

            A massa popular era composta de pessoas de todas as idades e principalmente por adolescentes, que munidos de sua mais poderosa arma, a Bandeira do Brasil, gritavam palavras de ordem. Grupos saíram às ruas vestidos de preto, outros com as cores do país e muitos com os rostos pintados para a guerra. Uma luta em prol da democracia, de um país mais justo e contra um governo corrupto.

            Diante de tantos clamores e mobilização popular, que procurava de alguma forma se proteger, para impedir o retrocesso aos anos de repressão da ditadura, a voz do povo se fez ouvir. Enfatizou o homem, emocionado.    
       
           As crianças prestavam atenção ao que o pai dizia e de vez em quando faziam alguma pergunta, pois, ainda não compreendiam bem o que era uma ditadura ou um governo corrupto.

             – Preciso contar um pouco da história dessa época, para que vocês entendam os fatos como eles aconteceram. Disse Alberto, compenetrado.

             Sua esposa e os filhos estavam atentos, queriam estar bem informados, para entender o movimento ao qual participariam no dia seguinte.

            - Desde os anos sessenta, depois da instauração da ditadura militar e seu regime de censura e repressão, o povo brasileiro ansiava pelo direito à liberdade. Então, houve muitas lutas subversivas contra o poder militar, que oprimia a sociedade civil com mão de ferro.

            Um dos grandes momentos de luta pela democracia foram os movimentos estudantis do final dos anos sessenta, em plena Ditadura Militar, onde jovens universitários saíam as ruas para protestar abertamente contra o governo, expressando ideias, geralmente, de esquerda. Muitos desapareceram e outros foram presos e exilados; foi uma fase obscura da política brasileira, “A DITADURA MILITAR”. Nessa luta apareceram algumas lideranças e entre elas o ex-Presidente Lula e a atual Presidente Dilma Roussef, que lutavam na clandestinidade.

           A ditadura durou 21 anos, de 1964 a 1985. O primeiro presidente eleito pelo povo foi Fernando Color de Melo que assumiu em 1990 e renunciou em 1992, assumindo seu vice, Itamar Franco. Com o fim de seu mandato foi eleito Fernando Henrique Cardoso, que cumpriu dois mandatos seguidos.

           Em 2002 assumiu o novo Presidente eleito, Luís Inácio Lula da Silva. Seria a primeira vez que a esquerda assumiria o poder e nas primeiras medidas tomadas, o governo anunciou um projeto social: a campanha “Fome Zero”. Seu primeiro mandato foi de encontro as expectativas do povo carente de mudanças e melhoria nas condições de vida da população de baixa renda.

           Entretanto, depois da esquerda assumir o governo e mostrar uma nova maneira de assistir aos mais necessitados, levando o país a uma estabilidade aparente, vieram à tona uma enxurrada de decepções e corrupções em todos os escalões do governo, acordando o gigante que estava adormecido.

E, na eleição de 2014 com uma disputa acirrada, a presidente Dilma conseguiu se manter no poder em meio a muitas denúncias de corrupção. Depois de sua posse ela tomou medidas impopulares e contrárias as suas promessas de campanha, o que levou o povo a se posicionar contra seu governo e pedir a sua saída através do impeachment. 

              - Portanto, é para esse movimento que estamos nos preparando, frisou Alberto. O movimento em prol da ética, da moral e da cidadania. Por mais saúde, segurança, educação e transportes, que estão sucateados em nosso país

           Diante desse cenário confuso “os caras-pintadas” retornarão às ruas; os mais velhos, que participaram da primeira versão, os filhos e netos deles, todos unidos para mais uma vez defender o seu país de um governo corrupto.

          Os filhos de Alberto estavam em idade escolar e os dois mais velhos já tinham ouvido falar sobre essa história. Mas, a menina Ana Clara, que estava no primeiro ano do ensino fundamental, ainda não conhecia essa história, que seu pai contava com tanto entusiasmo e patriotismo.

       Alberto continuava contando que, “os caras-pintadas” tornaram-se ícones de uma nova maneira, que o povo descobriu, de se fazer democracia; forçar a queda de dirigentes corruptos e incompetentes. Em seguida, todos foram dormir, precisavam descansar para cumprir seu dever cívico no dia seguinte.

          O domingo amanheceu ensolarado depois de vários dias de chuva, no entanto, uma brisa fresca deixava o dia perfeito para a passeata. Logo após o almoço, a família de Alberto se preparou e saiu para cumprir seu dever cívico em defesa de um Brasil melhor. Todos vestidos com roupas nas cores da Bandeira do Brasil, apitos, chapéus, bandeiras e as caras pintadas de verde, amarelo, azul e branco; estavam alegres e felizes.

             Saíram do bairro do Ipiranga e tomaram o ônibus em direção ao Vale do Anhangabaú, no centro da cidade de São Paulo. O local foi escolhido como ponto de encontro para uma das maiores manifestações do movimento contra a corrupção, os aumentos de tarifas abusivos e a instabilidade do atual governo da presidente Dilma.

           Chegando ao local, eles foram se juntar a outros grupos, que estavam se organizando para iniciar a passeata.  Um dos líderes do grupo pegou o microfone e começou a falar qual a diferença entre os caras pintadas antigos e os atuais. Em 1992, o povo queria tirar um político da Presidência, baseados em suas atitudes impopulares e provas de corrupção. Nos dias atuais a luta é contra um partido, Partido dos Trabalhadores e a disseminação da corrupção em todas as esferas do governo.

          Para Alberto, a decepção e revolta do povo é o que existe de comum entre os dois momentos. Ele acredita que contra o PT a revolta é ainda maior do que com o Collor; o sentimento está na cara das pessoas e é maior do que em 1992.

            Alberto conta, com um certo saudosismo, que em 1992 os jovens eram mais comprometidos e atuantes, mesmo sem acesso à internet e as redes sociais. Hoje em dia, com acesso a todo tipo de tecnologia, os jovens demonstram menos interesse. Os caras-pintadas atuais são pessoas mais velhas e experientes, levando os jovens para um compromisso com a democracia. São idosos, cadeirantes, artistas, jogadores de futebol e muitas crianças acompanhando os pais. A população está muito mais informada do que antes e querem um país livre e sem corrupção. Os caras-pintadas da atualidade estão fartos de corrupção e falcatruas; pedem a prisão dos corruptos e a queda do governo.

           O líder do grupo que estava reunido permanecia com o microfone na mão e continuava seu discurso:

           -Não adianta ir para uma manifestação e achar que já fez a sua parte e se acomodar. Agora é a hora de iniciar uma longa luta. Nesse primeiro momento servirá de alerta para os governantes saberem que o povo não é bobo, e unidos tem muita força. A corrupção não está somente em todos os partidos, faz parte do sistema. As pessoas precisam ir às ruas brigar pelas reformas política, tributária e jurídica.

Em seguida, saíram em passeata cantando o Hino Nacional Brasileiro e gritando palavras de ordem; foi uma festa da liberdade de expressão e fortalecimento da democracia. A manifestação ocorreu em âmbito nacional e quando a família de Alberto regressou a sua casa, já estava escurecendo e as crianças, apesar de felizes, estavam exaustas. Depois do banho e de um lanche foram dormir e marido e mulher se abraçaram, tinham ensinado aos filhos um sentimento muito importante: o amor e respeito a Pátria. O valor dos símbolos do país, que é a Bandeira e o Hino Nacional, que devem representar seu povo em todos os momentos, apresentações, lutas e competições que participarem.

Portanto, as crianças aprenderam em um dia, muito mais do que em um ano de estudos, pois, vivenciaram um momento importante de civismo. Os filhos de Alberto e os filhos de milhares de famílias que participaram de tão importante manifestação, criaram dentro do peito uma semente de patriotismo. Coisa antiga, meio adormecida diante de tanta modernidade e tecnologia, que tomou conta da nova geração. Eles estão aprendendo o valor da presença física e do som da voz em uma luta contra um inimigo gigante: um governo corrupto. As ruas estavam pintadas, as caras pintadas, e as casas pintadas de verde e amarelo A manifestação ocorreu em âmbito nacional e a mobilização assustou quem não acreditava no movimento.

- Sair detrás do computador e gritar a plenos pulmões o orgulho de ser brasileiro, não tem preço. É sentir a liberdade no rosto, pois, os caras-pintadas estão de volta, concluiu Alberto, satisfeito.

           Então, Maria Alcina que estava na sacada da casa do filho, olhou para o céu e com um suspiro murmurou.

          – Boa noite lua, você ainda me faz sonhar e agora, com um país mais justo.           
          - Ah! Eu quero registrar que tenho certeza, que São Jorge e o dragão ainda moram na lua... Em seguida entrou e foi descansar.


Um texto de Eva Ibrahim Sousa
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