ERA UM
PISO DE ALGODÃO
Ainda estava escuro quando o táxi
adentrou o pátio do Aeroporto de Viracopos em Campinas, São Paulo; levava
apenas uma passageira no banco de trás. Rapidamente o veículo parou junto a
guia da plataforma de embarque e a moça abriu a porta, era Veridiana, uma bela
mulher de quarenta anos. Estava ansiosa, mal dormira á noite, iria voar pela
primeira vez. Tremia só em pensar.
— Será que o medo vai me impedir de
subir no avião? O que a trouxera até ali foi o amor que sentia por Samuel, ele
a esperava no fim da linha; tinha que ir ou ele pensaria que ela desistira de
tudo.
Nos últimos dez anos a mulher se dedicara ao trabalho e a criação do casal de gêmeos, que agora eram adolescentes. Artur, seu marido, a abandonara para tentar a sorte no Tio Sam e raramente mandava notícias. Era uma mulher divorciada, solitária e conformada. Mas, um dia conheceu Samuel, ele foi ao escritório em que ela trabalhava e seus olhares se cruzaram de um jeito especial; foi amor à primeira vista. O rapaz voltou outras vezes, até se declarar. A vida parecia mais bonita e tudo mudou para ela, queria ser feliz.
Seiscentos quilômetros os separavam e o jeito mais rápido de encontrar seu amor era o avião, por isso estava ali, no aeroporto de Viracopos. Na verdade, estava com muito medo, mas, decidida a ir em frente. Seu voo teria duas conexões, era o único que iria até seu destino, a cidade mineira.
Passou pelo chek in e sua bagagem
foi levada pela esteira, agora não poderia desistir. Adentrou a sala de espera
e viu muita gente esperando a chamada para o embarque. No salão, bem iluminado,
estavam homens, mulheres, crianças, jovens e velhos de diversos lugares e raças
diferentes; todos atentos e agindo naturalmente.
Veridiana procurou um lugar perto de duas
mulheres, que conversavam banalidades sobre crianças e seu coração foi se
acalmando. A moça sentou-se e fez uma oração aos anjos, prometendo a si mesma
que faria uma viagem feliz.
Alguns
aviões subiram e quando chamaram seu voo ela deu um salto e seguiu os
passageiros, que se dirigiam ao micro-ônibus que estacionara em frente a saída.
Entrou e ficou entre aquelas pessoas se deixando levar. Uma aeromoça sorridente
a cumprimentou indicando o caminho. Ao seu lado sentou um Japonês com cara de
poucos amigos; certamente voariam calados, pensou a mulher.
O avião parecia um peixe, comprido e fino; estava lotado. Para atender os clientes havia duas aeromoças muito bonitas; a comissária deu as boas-vindas aos passageiros que estavam a bordo da aeronave. Veridiana pensou que não queria ser mãe de aeromoça ou mulher de piloto, pois, certamente viveria aflita e com o coração nas mãos.
O avião parecia um peixe, comprido e fino; estava lotado. Para atender os clientes havia duas aeromoças muito bonitas; a comissária deu as boas-vindas aos passageiros que estavam a bordo da aeronave. Veridiana pensou que não queria ser mãe de aeromoça ou mulher de piloto, pois, certamente viveria aflita e com o coração nas mãos.
A mulher ouvia as instruções que o
comandante dava pelo microfone antes de levantar voo, mas, lá no fundo estava
decepcionada. Pensava que avião era um lugar luxuoso, para gente “chik” e
artistas de cinema. Aquele parecia um ônibus comum, com gente comum se
preparando para voar; era tudo muito apertado.
— Onde estaria a magia e o
encantamento que sempre imaginou?
— A aviação perdeu o glamour de Hollywood e
passou a ser transporte do povão. A mulher tirava suas conclusões quando o
comandante avisou que iriam decolar.
A aeronave começou a andar lenta, seguia
devagar e de repente, vum, subiu rapidamente. Parecia um coletivo interestadual
voando, Veridiana esticou o pescoço para olhar as construções diminuírem de
tamanho até desaparecer. Sentiu um frio na espinha, era assustador. O japonês
recostou na janela impedindo a visão da mulher e logo vieram as aeromoças com
os comes e bebes, para distrair os ocupantes do aerobus. Mal acabaram de comer
e o comandante avisava da chegada a Curitiba.
O tempo estava nublado e a
temperatura três graus a menos que Campinas; todos os passageiros foram levados
ao salão de espera do aeroporto. Depois de uma hora fizeram a chamada para o
embarque em outro avião, que os levaria ao Rio de Janeiro. A mulher estava
surpresa por não sentir medo, a situação parecia natural; vivia um sonho
estranho e real.
O avião era maior e não poderia ser
comparado a um peixe como o primeiro, era mais espaçoso, parecia um ônibus de
turismo ou um Tubarão jovem. O comandante avisou que estavam atrasados e por
isso voaria em uma velocidade maior. Rapidamente chegaram a região de Angra dos
Reis e foram orientados a olhar para ver suas belezas naturais.
Havia um barulho nos ouvidos da moça,
que os cobriu com as mãos; o japonês quebrou o silêncio dizendo que era a
velocidade e altitude que provocavam aquela sensação de subida de Serra.
Chegaram ao Aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, num voo perfeito.
Veridiana pensava na situação que
se encontrava, passageira de primeira viagem, e chegou à conclusão de que voar
é rápido e perigoso, pois aquilo parecia uma panela de pressão. Ali estavam os
passageiros e Deus, nada mais importava, não havia saída. Mas, tinha que
admitir ser muito bom ser conduzida ás alturas, como os pássaros, planando no
ar.
Lembrou-se da Guerra nas Estrelas,
filme que seus pais assistiam quando era pequena. Rapidamente foram orientados
a subir em uma Perua e seguir até o outro avião que já estava esperando os
passageiros. Veridiana apenas seguia e obedecia aos comandos, parecia um robô,
mas quando olhou pela janela do pequeno avião, este era o menor de todos, viu
que uma turbina estava preta e comentou com o vizinho de banco, agora um jovem
cabeludo.
— Parece que já pegou fogo. O rapaz fez que
sim com a cabeça e enfrentaram outra subida.
O voo fora estimado em trinta
minutos e ficaram admirando a paisagem do Grande Rio; lugares lindos, belezas
naturais a encher os olhos. Enquanto eram servidos os lanches foram para cima
das nuvens. A moça olhou pela janela e viu um grande piso de algodão branquinho
e fofo; havia muita paz e tranquilidade na paisagem.
— Só pode ser Deus aqui presente,
pensou a mulher.
Naquele momento ela sentiu que a vida
é concessão divina e a fragilidade humana não é compatível com a soberba e
arrogância dos terrestres. Uma energia superior pairava naquela imensidão de
algodão e os passageiros do aerobus apenas observavam calados. Coisas de Deus
estavam naquela paisagem linda, inclusive a permissão para seres humanos
contemplar aquilo tudo. Veridiana ficara inerte e embevecida com aquele momento
mágico, devia isto á Samuel, pois, foi seu amor que a fez subir na aeronave.
Estava viva e feliz voando por
esse mundão azul; a violência está em terra, no alto reina a paz e o silêncio;
Veridiana parecia hipnotizada. Voltou a si com a turbulência que ocorreu quando
a aeronave baixou das nuvens. Foi anunciada a chegada a Juiz de Fora e a moça
agradeceu aos anjos aquela oportunidade.
Seu coração disparou e a ansiedade
aumentou, iria reencontrar Samuel, o homem de sua vida. O avião pousou e quando
ela desceu, ele estava acenando na porta de acesso do desembarque. A distância
era pequena e Veridiana caiu nos braços do seu amor com muitos beijos e
abraços. Seguiram abraçados e ela disse ter feito uma boa viagem, mas, o que
ele não sabia é que agora ela era uma nova mulher; mais espiritualizada.
Uma
pessoa mais ciente da presença de Deus e da magia que envolve a vida. Aquele
foi um voo para descobertas interiores, que mudaram sua maneira de pensar,
porém, naquele momento ela trazia o coração transbordando de amor e só queria
ser feliz.
Depois pensaria com calma naquela visão do paraíso. Uma coisa ficou definida, toda vez que alguém falasse a palavra Céu, ela pensaria naquele piso de algodão tendo a certeza que Deus existe e reina sobre tudo, com muito amor.
UM TEXTO DE EVA IBRAHIM, QUE ESTÁ PUBLICADO NO SITE DO RELEITURAS E NO LIVRO "OUÇA O BARULHO DO VENTO".