UMA FRESTA DE SOL
CAPÍTULO
QUARTO
Fernando dormiu como um anjo, depois
da dose noturna de vários medicamentos e Celina apagou recostada na poltrona ao
lado da cama do marido; estava exausta. Ela acordou com o barulho que o
enfermeiro fez ao entrar no quarto, para verificar os sinais vitais do paciente.
De sobressalto ela ficou em pé assustada, só então, lembrou-se que estava no
Hospital.
O clarão do novo dia a deixou confusa;
por um momento pensou que estava em sua casa, entretanto, a realidade estava
ali, nua e crua. Ela, o marido e o pessoal do Hospital, foi o que restou do seu
casamento, que fora tão esperado. Ela não curtiu nada do dia mais importante da
sua vida, saiu às pressas da Igreja direto para o Hospital. Não viu o bolo nem
a festa, que havia sido preparada para o casal.
Depois ficou sabendo que doaram os
quitutes para um orfanato. Uma nostalgia tomou conta de Celina. De todos
aqueles acontecimentos, pelo menos, uma coisa boa, fizeram a felicidade de
muitas crianças carentes. Sua mãe lhe contou o destino da sua festa quando lhe
entregou o casal de noivinhos, que estavam em cima do bolo e seus olhos
encheram de lágrimas.
Celina apertava os bonequinhos na mão
e pensava que aquilo era uma grande ironia, os dois bonecos pareciam muito
felizes e ela perdida em incertezas. Aquele dia que estava amanhecendo, seria o
terceiro de um casamento muito sonhado, que havia sido freado pela doença
repentina de Fernando.
Celina foi ao banheiro e quando
se olhou no espelho levou um susto, estava horrível; perdera o viço. Com
certeza, aquelas duas noites passadas na poltrona do Hospital, não lhe fizeram
bem. Estava ansiosa, preocupada e acima de tudo decepcionada, precisava
desabafar com alguém ou explodiria a qualquer momento.
Tentou conversar com o enfermeiro
para ver se conseguia saber alguma coisa a mais, sobre o estado do marido,
porém, o funcionário respondia por monossílabos, o que a deixou mais irritada.
Tomou um banho e esperou para ajudar o marido tomar o café, depois iria dar uma
volta, enquanto o enfermeiro cuidava da higiene de Fernando. A desculpa dada
fora que iria comprar algumas revistas para passar o tempo. Estava muito triste
e precisava desabafar, mas não poderia ser em frente ao marido. Saiu com
destino certo, a Igreja onde se casara, o Padre poderia ouvi-la e lhe dar bons
conselhos; era conhecido da família.
A
missa já havia começado e ela sentou-se no banco dos fundos da Igreja; olhou
para o lado e viu um cachorro deitado perto do altar de Nossa Senhora. Ficou
comovida, ele também era uma criatura de Deus e como tal estava ali
respeitosamente. Aquele pensamento alegrou seu coração, também precisava de
Deus e certamente ele não a abandonaria. A missa estava no final e ela ficou
esperando as pessoas saírem para se aproximar do altar principal.
Quando
conseguiu chegar ao altar o padre já havia saído pela sacristia, então, ela se
ajoelhou diante do Santíssimo e orou com fé entre lágrimas de preocupação.
Queria o marido bom para retomar seu casamento, esperara muito por isso.
Ficou
ali durante um bom tempo e quando saiu sua alma estava leve; com certeza Deus
ouvira suas preces. Voltaria ao Hospital renovada e com algumas revistas na
mão. O cachorro estava em frente à Banca de jornais e abanou o rabo quando ela
passou; ficou cismada.
-
Seria apenas um cachorro ou um anjo?
Sua mãe sempre dizia que os cães são anjos
disfarçados para ajudar os seres humanos. Foi caminhando em direção ao Hospital
e quando chegou teve uma bela surpresa. Fernando poderia ir para casa, estava
com alta médica.
Um
texto de Eva Ibrahim.
Continua
na próxima semana.