COM MUITA FÉ
CAPÍTULO TRÊS
A tarde chegou e a menina estava eufórica,
nunca estivera fazendo visitas em hospitais. Era uma grande novidade e se
arrumou com mais afinco. Apesar da dor de cabeça intermitente, que a fazia
sentir um pequeno coração na altura da testa, Angel queria rever o rapaz, que
estava ferido no hospital.
Deixou seus cabelos negros e
encaracolados soltos ao vento, assim encobria parcialmente o curativo e
acentuava sua beleza natural. Ela tinha grandes olhos esverdeados, olhos de
camaleão, diziam em sua casa.
- Cada vez que olho para ela, estão de uma cor
diferente. Sua mãe dizia e completava, que eram olhos incisivos e
desconcertantes. As vezes eram verdes, outras vezes, cor de mel. Quando sua
dona ficava irada, eles escureciam a um tom de marrom escuro, profundo e
misterioso. Seus irmãos saiam de perto, pois era sinal de agressividade, na
certa. Angel era uma menina brava, mas tinha um bom coração, que fora tocado
pelo acidente de Marcelo.
Sua mãe arrumou uma sacola com
algumas frutas e acompanhou a menina até o hospital. Lá estavam a mãe, o pai e
uma irmã do rapaz, esperando para visitá-lo. Pareciam ansiosos e Angel se
apresentou, dizendo da sua preocupação com a saúde do rapaz. Depois, mostrou sua cabeça
costurada debaixo do curativo e, que estava ali para dar apoio ao colega de
desventura. A família do rapaz ficou surpresa e acabaram sorrindo para a moça.
- Ele teve muita sorte mesmo, disse
o pai de Marcelo. E a mãe completou:
- Graças a
proteção de Nossa Senhora Aparecida, o nosso menino está vivo. Em seguida, o
casal se abraçou, estavam comovidos.
Quando a porta foi aberta para as visitas, entraram os pais do paciente e depois
iriam as duas moças. Celina, a irmã de Marcelo e Angel companheira ocasional do
atendimento no pronto socorro. Olga e as duas moças ficaram aguardando a vez. A
mãe estava ali apenas para acompanhar a filha, não pretendia atrapalhar as
visitas.
Algum tempo depois, os pais de
Marcelo saíram e as duas meninas adentraram ao recinto.
Celina abraçou seu irmão e seus
olhos se encheram de lágrimas, estava emocionada, não conseguia falar; tinha um nó na garganta. Ficou alguns minutos olhando para ele e, depois sentou-se na poltrona dando lugar à
Angel.
A nova amiga chegou perto da
cama e pegou nas mãos do rapaz, que continuavam quentes e cheias de calos. Foi
somente naquele momento que ela percebeu, que as mãos dele estavam cheias de
áreas grossas. Então, o rapaz explicou, orgulhoso.
- Eu seguro o touro bravo com essas mãos e a
força é tamanha, que formam calosidades, pelo atrito com a corda do cabresto.
Angel sabia pouca coisa sobre
peões de boiadeiro, mas, já o admirava como se admira a um herói. Era o homem e
o animal, numa luta desconcertante e fora do normal, dentro de uma arena. Uma
demonstração de poder humano, perigoso, grotesco e que arrasta multidões em
suas apresentações. Os músicos e cantores vestidos à caráter, apresentam
verdadeiros shows de músicas sertanejas, depois da contenda dentro das arenas.
Os palcos são montados ao lado
das arenas e as apresentações se estendem até a madrugada. São eventos que tem
um poder milionário e turístico, proporcionando progresso aos locais de suas
apresentações. Aquele mundo desconhecido a atraia, a ponto de querer ficar por
perto do rapaz.
Na
mesinha de cabeceira estava uma imagem de Nossa senhora Aparecida, que a mãe do
rapaz colocara ali. Angel depositou suas frutas ao lado da imagem. No peito de
paciente, que tinha a blusa do pijama aberta, brilhava a medalha da santa,
agora limpa e polida.
- Marcelo está bem protegido, eu também quero
uma medalha dessas! Pensou Angel.
Havia uma certeza de sua
recuperação, apesar de todos os exames feitos e a preocupação externada pelos
médicos. O coice poderia trazer consequências desastrosas, pois o impacto no
cérebro fora grande. No entanto, a confiança e certeza da proteção recebida da
santa, os deixavam tranquilos.
Ali estavam pessoas de muita fé.
Um
texto de Eva Ibrahim Sousa