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sexta-feira, 29 de novembro de 2013

“SOLIDÃO É A MANEIRA QUE O DESTINO ENCONTRA PARA LEVAR A PESSOA AO ENCONTRO DE SI MESMA”. HERMANN HESSE. —“É MUITO FÁCIL SER PEDRA, O DIFÍCIL É SER VIDRAÇA”. PROVÉRBIO CHINÊS.


                                 BRILHANDO COM AS ESTRELAS.
                                         CAPÍTULO 15
Antonio estava completamente decidido a viver recluso, não queria prejudicar mais ninguém. Ele sentia que todas as pessoas que se aproximavam dele, sofriam algum tipo de agravo à saúde; era a maldição da pedra amarela, disso ele tinha certeza.
           Deixou a barba crescer e saia de casa somente uma vez a cada mês, para manter sua casa e suas necessidades básicas. Seu visual era de um homem sem vaidade; roupas simples e surradas, porém, limpas. Os vizinhos o apelidaram de “Ermitão”. O homem não tinha amigos e não gostava de intrusos. Cuidava de sua casa e tinha o Lobo para espantar curiosos, que de tanto ficar sozinho se tornara um cachorro muito bravo.
         A solidão é um sentimento no qual a pessoa fica com uma profunda sensação de vazio, sem motivos para viver; muitos entram em depressão. Porém, quando é voluntária pode trazer uma paz compensadora; era uma opção de vida para Antonio. Ele tinha seu amigo, o Bernardo, que ele amava como se fosse seu filho. Bernardo, desde a morte de Verônica, fora seu companheiro e ouvinte. O boneco sabia tudo da vida daquele homem, que o criara para não enlouquecer; era sua fuga do mundo lá fora. O Lobo era o guardião da casa e só permitia a aproximação de seu dono e de mais ninguém.
        Antonio criou para si uma estação solidão; uma parada da vida. Ali ele era soberano e assim vivia tranquilo. Seus dois companheiros lhe davam o equilíbrio necessário para continuar vivendo nesse mundo, que lhe trouxera muitas inquietações. Antonio, Bernardo e o Lobo, eram amigos para sempre.
Alguns anos se passaram e todos da região sabiam da existência do Ermitão, que era um homem pacato, mas não gostava de ser incomodado. Todo mês ele era visto recebendo sua aposentadoria e comprando mantimentos, depois se recolhia até o mês seguinte. Os vizinhos conheciam sua rotina e sempre o avistavam fazendo algum conserto em sua casa ou pondo o lixo na rua. Certo dia alguém reparou que ele estava sumido e ninguém o via, fazia dias. O cachorro estava inquieto e emagrecido.                           
       –Será que aconteceu alguma coisa com o homem? Os vizinhos, apreensivos, resolveram chamar a polícia.
Quando a viatura da polícia chegou, o cachorro desesperado foi comer a comida que a vizinha trouxera para distraí-lo, enquanto os policiais entravam na casa.
         Ao redor da casa havia um cheiro de carniça, algo de muito errado estava acontecendo ali, disse um policial ao outro. Quando o policial arrombou a porta e entrou na casa, sentiu que o cheiro ficara mais forte e com uma mão segurando o nariz pôs a outra mão no coldre e adentrou ao quarto. Antonio e o Bernardo, lado a lado na cama, pareciam dormir.
        O policial se aproximou e pondo a mão no homem sentiu que estava frio e duro. Espantado, deu um passo para trás deduzindo que fazia dias que o homem estava morto; só não entendeu a presença do boneco na cama, em seguida chamou reforço.
      Houve um alvoroço na rua com a chegada da pericia e do caminhão de defuntos. Na casa foi encontrado o endereço de Nalva, a irmã de Antonio, que veio, juntamente com sua filha, para enterrar o corpo do irmão, de quem há muito tempo não tinha notícias.
       A mulher, surpresa, não sabia por que seu irmão desaparecera. Durante algum tempo procurara por ele, depois desistira, ele sabia seu endereço, se quisesse vê-la que a procurasse, declarou no plantão policial. Nalva ficara surpresa com a nova vida de seu irmão e a presença daquele boneco na cama de Antonio, era tudo muito estranho.
        Estava em suas mãos resolver aquela situação e precisava encontrar os documentos de Antonio, por isso ela começou a mexer em seus guardados e encontrou a mala dentro do guarda roupas.
         Ao abrir a mala ela percebeu que apesar de vazia, tinha alguma coisa dentro do compartimento fechado com zíper. Abriu o zíper e colocou a mão para pegar o pequeno volume. A mulher quase desmaiou quando viu que era a pedra amarela que estava ali. Com a pedra na mão, Nalva começou a orar, era inacreditável.
       -Como aquela pedra fora parar ali? Estava muito longe de onde sumira; era um enigma de difícil solução. Nalva sacudia a cabeça enquanto mostrava a pedra à sua filha.
Havia alguma coisa maligna naquela pedra e ela iria se aconselhar com o Padre. O pároco a aconselhou a devolver a pedra para o lugar de origem e sossegar seu coração, nada poderia ser feito além de muita oração para o seu irmão.
         Enquanto o corpo de Antonio estava sendo periciado, ela e sua filha teriam que resolver o que fazer com o cachorro e o boneco. O Lobo já estava velho e era um cão muito bravo, por isso a vizinha resolveu ficar com ele; guardaria sua casa e terminaria seus dias ali mesmo. Conversando com a vizinha ela falou do boneco e disse que não sabia o que fazer com ele. Era de seu irmão e não queria, simplesmente, jogá-lo fora.
       - Não!
        Exclamou a mulher eufórica, ela conhecia um pessoal, que todos os anos desfilavam nas escolas de samba do Rio de Janeiro, no sambódromo. Faziam bonito na pista do “Marquês de Sapucaí”, a passarela do samba e ela tinha a certeza que eles dariam um lugar de destaque ao boneco, pois era muito bem cuidado. Nalva concordou entregando Bernardo à mulher. 
         Depois de dois dias e resolvendo tudo por ali, Nalva e a filha foram ao enterro do corpo de seu irmão e em seguida retornaram à sua cidade. A mulher tinha uma missão a cumprir, queria que seu irmão pudesse descansar em paz.     Voltaria à represa e jogaria a pedra amarela o mais fundo possível, para nunca mais ouvir falar daquela triste história, que atormentou a vida de seu irmão.
            Assim foi feito e Nalva cumpriu sua missão. Quando voltava para sua casa já havia anoitecido e o céu estava carregado de estrelas. E, elevando seu olhar para o alto, viu que uma estrela brilhava mais que as outras e concluiu, olhando para sua filha:
         -Bernardo iria brilhar nos desfiles de carnaval, enquanto Antonio tomaria conta dele lá de cima, brilhando com as estrelas.
Um texto de Eva Ibrahim.
Aqui termina “ESTAÇÃO SOLIDÃO”, a história de Antonio e o mistério da pedra amarela, que jamais será desvendado.


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