A
PESCARIA
CAPÍTULO
DOIS
O dia já estava terminando e Murilo
não conseguia pensar em nada, para ficar fora de sua casa naquela noite. Sua
esposa iria desconfiar, se ele saísse na noite de carnaval. Ultimamente, Lívia
estava tentando agradá-lo, parecia estar pressentindo alguma coisa.
Permanecia acordada na maioria das noites e o
marido era quem arrumava desculpas, para não fazer amor. A situação tornara-se
estranha, fora invertida. Muitas vezes, Murilo voltava de encontros calorosos
com a amante e não tinha energia para novos desempenhos. Sua mulher cobrava mais
amor, mais carinho e ele justificava a falta, alegando cansaço por trabalho
exaustivo.
Raquel havia telefonado marcando um
encontro na Sapucaí, depois do desfile da escola, que ela representava como a
rainha da bateria. O amante não poderia dizer não, pois também queria estar
presente no desfile e ver sua amada brilhar.
O mecânico ficava alerta e seu coração
disparava ao pensar, que sua deusa estaria exposta ao público. Precisava vigiar
ou não teria sossego e, assim que acabasse a apresentação, ele queria estar na
dispersão, esperando por ela.
Quando
já estava perdendo as esperanças, apareceu um amigo, que fazia tempo ele não
via. Leonel era uma boa pessoa, que o mecânico conhecia desde criança e sempre,
quando aparecia, era para pedir dinheiro emprestado, que pagava religiosamente.
Dessa vez, era para passar uns dias na fazenda
de um conhecido, em Minas Gerais. Fazia parte de uma turma de pescadores, que
tinham o intuito de descansar e fazer retiro no carnaval.
Dentro da cabeça do mecânico
acendeu uma luz, era a solução para o seu problema e poderia render pelos
quatro dias de carnaval.
– Sim, eu empresto o dinheiro em
troca de um grande favor. E abriu um largo sorriso. Leonel ficou surpreso e
disse:
- Claro, o que você precisar, lhe
devo muitos favores.
Murilo tratou de fechar a oficina e
no caminho foi detalhando, aquilo que o rapaz deveria fazer.
– Vamos até a minha casa e você
vai dizer para Lívia, que me convidou para passar o carnaval em um rancho de
pescaria, em Minas Gerais.
Leonel ficou espantado e
perguntou:
- O que você vai fazer?
- Descansar pescando com você e a
turma, somente isso. Estou estressado de tanto trabalhar.
Em seguida, deu uma piscada e Leonel entendeu,
não deveria perguntar mais nada. Sua missão seria convencer a esposa do amigo,
que ele precisava descansar pescando com os conhecidos.
Chegaram a casa de Murilo e com
a cara mais deslavada do mundo, os dois, encenaram o ato de pobres pescadores
em retiro de carnaval. A mulher ficou contente, em saber que seu marido iria
descansar durante o carnaval.
- Ele está precisando, pois,
ultimamente anda muito nervoso. Concluiu Lívia.
Murilo pediu para sua esposa arrumar as malas
e as crianças, porque a deixaria na casa da mãe dela, enquanto ele estivesse
fora. Todos ficaram felizes. Lívia queria visitar sua mãe e matar as saudades.
A casa da sogra de Murilo ficava do outro lado da ponte rio Niterói, na cidade
do mesmo nome. Não era muito longe, mas era longe o suficiente, para o rapaz
sentir-se livre.
Foi uma correria até Niterói,
mas o mecânico estava feliz, com quatro dias de liberdade para se divertir ao
lado da mulher amada. Estava apaixonado e parecia um colegial ansioso pelos
carinhos, do objeto de seus desejos.
Levou suas coisas para a oficina, pois não
poderia voltar para sua casa. Os vizinhos poderiam vê-lo e contar para Lívia.
Era melhor se precaver, não queria problemas com sua mulher.
Quando Murilo voltou de Niterói para
o Rio de Janeiro, já era tarde, onze horas da noite de sexta-feira de carnaval,
mas ele ainda teria tempo para se arrumar e ir ao encontro de Raquel. A escola
de samba que ela participava, seria a terceira a desfilar, daria tempo de
aplaudi-la.
Depois, a noite seria apenas uma
criança, nos braços de sua rainha. Murilo estava muito feliz, agora era
desfrutar de toda aquela euforia, que existia na Sapucaí.
Assim, ele chegou no Sambódromo, o mundo
mágico das fantasias; ali era o local onde apenas os sonhos mais loucos, eram
permitidos.
Um texto de Eva Ibrahim Sousa