SOB O LUAR DE SÁBADO A NOITE
CAPÍTULO CINCO
Para os costumes da época Maria Alcina
já era uma moça feita e poderia namorar para se casar. A revolução feminista
ainda não havia começado e a sociedade patriarcal dominava as famílias. E,
nessa linha de pensamento os pais queriam casar as filhas o mais rápido
possível, para não correr o risco de ter alguma surpresa desagradável.
Ser mãe solteira, ou cair na boca do
povo por um namoro mais íntimo, significava que nenhum homem desposaria a moça
em questão para ser mãe de seus filhos. Recebia o codinome de “mulher da vida”
e as portas se fechavam para ela.
A virgindade e a ingenuidade ainda
faziam parte dos dotes exigidos para as moças casadoiras. Para ser considerada ultrapassada
ou coroa, bastava ter passado dos vinte anos sem estar compromissada
seriamente.
Então, a aproximação acontecia com
olhares furtivos na praça, onde as moças andavam em círculos, enquanto os
rapazes ficavam de braços cruzados, observando-as. Muitas vezes, quando ficavam
interessados, ofereciam músicas no serviço de alto falantes, que havia no
coreto da praça.
Essa paquera acontecia aos sábados
à noite na praça principal. As moças ficavam sentadas no caramanchão, ou circulando ao redor do
chafariz, que volteava suas águas ao farfalhar do vento e ao som das músicas
românticas. Depois de olhares e sinais de aprovação, os envolvidos passavam a
semana inteira querendo rever o objeto de seus sentimentos, mas tinham que
esperar o sábado seguinte.
As
moças tinham horário para sair e voltar para casa. Saiam as dezenove horas e
deveriam estar em casa as vinte e uma horas, salvo as terças-feiras, que havia
uma sessão de cinema para as moças. Era gratuito para quem estivesse
acompanhada de um rapaz. Todas as moças arrumavam um par para adentrar ao
cinema, mesmo que fosse somente para entrar, depois se separavam.
Certo dia, na casa da Maria Alcina,
chegou uma visita, era sua avó materna, que viera para passar uns tempos com a
família da filha. Na casa havia muitas crianças, oito filhos, pai, mãe e uma
tia velha, que ajudava a criar os pequenos; consequentemente, havia pouco
espaço. Por esse motivo, a avó foi dormir no sofá da sala e todos se ajeitaram.
Maria Alcina, que estava de namorico
com o Fred, saiu com uma vizinha de sua idade e foram a uma quermesse no largo
da Igreja local. Ao sair, foi alertada para retornar à casa as vinte e uma
horas, sob pena de ser castigada se houvesse atraso.
No horário marcado o Fred a acompanhou até o
portão de sua casa, onde se despediram com o primeiro beijo furtivo. Meio
atordoada com a nova experiência, a menina bateu na porta da sala e sua avó
levantou-se e foi abrir para ela entrar, retornando ao sofá posteriormente.
Maria Alcina foi dormir com mil sonhos na cabeça e apagou profundamente.
As
vinte e três horas, houve um pequeno alvoroço na casa, que acordou a avó. Mas
como ninguém disse nada, ela voltou a pegar no sono, mesmo com o barulho do velho automóvel
DKV e seu som característico: PU, PU, PU, PU, PU.... saindo em disparada.
Quando o relógio bateu meia noite,
o automóvel retornou acordando a avó novamente, que assustada ao perceber que
sua filha estava chorando, perguntou:
- O que aconteceu? Quem morreu?
- A Maria Alcina sumiu, respondeu
aos prantos Doralice, a mãe da menina.
A velha senhora, espantada, disse
que estavam doidos, pois a neta voltara para casa fazia tempo.
– Foram olhar no quarto? Na cama?
Então,
Doralice cheia de esperanças, correu para o quarto e teve uma crise nervosa ao
ver a filha dormindo. Pegou o chinelo e começou a bater em Maria Alcina, mesmo
ela estando coberta. A menina pulou da cama, com os olhos arregalados e
perguntou?
- Por que a senhora está me
batendo? Então, a avó que estava na soleira da porta respondeu:
- Porque são dois loucos, que
primeiro vão procurar a filha na rua, que já estava dormindo fazia tempo, ao
invés de olhar no quarto.
- Fui eu quem abriu a porta para
ela quando chegou da rua. Por que não me perguntaram? Esbravejou a velha
senhora olhando para a filha.
– Não pensei nisso, sempre sou eu quem abre a
porta para ela entrar, respondeu a mãe da menina, rindo e chorando ao mesmo
tempo.
Um texto de Eva Ibrahim Sousa