UM DIA
APÓS O OUTRO
CAPÍTULO
QUATRO
A noite foi um pesadelo; Cirilo Artur
passou o tempo todo vigiando sua esposa e a cada som diferente, ele pulava da
poltrona. Olhava as luzes da cidade pela janela do quarto, estavam no terceiro
andar do hospital universitário, e imaginava a vida lá fora, sem o fantasma do
câncer corroendo seus pensamentos.
Orou a noite toda, procurava um
alento divino. Seu corpo estava dolorido por estar em uma poltrona incômoda,
mas, o que mais doía era seu coração. Batia acelerado e formava uma bola em sua
garganta, que o impedia de comer; uma sensação de vômito iminente. Sentia-se
mal, estava vivendo um drama.
Precisava acreditar que aquilo tudo era
passageiro, e que logo Olívia estaria de volta ao lar. A paciente dormiu porque
tomou calmante e quando acordou, lembrou-se do diagnóstico e começou a chorar.
Olívia
tomou banho e logo chegou o café, que ambos somente beliscaram, não tinham
fome; estavam inquietos e temerosos. Uma tristeza enorme por estar sofrendo uma
dor causada por um inimigo invisível, para o qual, não tinham armas para lutar.
Se fosse um membro ou um órgão
doente poderia ser extirpado, mas a leucemia estava no corpo todo, como
enfrentar aquela situação? Não sabiam a resposta.
O médico chegou para a visita matinal e trazia
novidades.
– Já temos um plano para atacar o
câncer que está fazendo você sofrer. Disse, olhando Olívia nos olhos.
- Logo mais, virão busca-la para
marcar a radioterapia e iniciar o tratamento para minar os nódulos aparentes.
São pequenas marcas e riscos para identificar o local exato onde a radiação
deverá incidir. E, amanhã iniciaremos o tratamento com a primeira sessão de
radioterapia. Iremos explicar tudo passo a passo; não tenha medo, existe
algumas reações adversas, mas a aplicação é indolor.
Dr. Júlio Rocco, estava escrito em seu jaleco, Cirilo Artur prestou
atenção enquanto ele falava. Era um homem de meia idade e falava calmamente,
parecia que estava em uma conversa informal do dia a dia; no entanto, para o
casal era uma questão de vida ou morte.
Ambos ouviram calados, não sabiam do
que se tratava. Radioterapia, quimioterapia eram novidades para eles. Entretanto,
sabiam que não era uma coisa boa, mas armas agressivas contra a doença.
O médico percebeu o desconforto e
sorriu com uma carreira de dentes alvos; era um sorriso acalentador e foi logo
dizendo:
- Conforme a doença é o remédio e,
neste caso tem que ser muito amargo. Em seguida pegou o estetoscópio para ouvir
os pulmões de Olívia. Sorriu novamente e, dizendo que estava tudo dentro do
esperado, saiu fechando a porta de mansinho.
Cirilo Artur sentiu-se
reconfortado, aquele homem era um calmante para seu coração desesperado. A vida
de Olívia estava em boas mãos, pensou, beijando sua esposa no rosto. A paciente
também parecia mais calma, até sorriu para o marido.
Olívia foi levada para a marcação
da radioterapia e Cirilo Artur aproveitou para sair e tomar um pouco de ar
puro. Tinha uns quarenta minutos até que sua esposa voltasse para o quarto.
Ele desceu os três andares até a
recepção e sem saber o que fazer, sentou-se em uma mureta do lado de fora.
Estava tão preocupado que não percebeu a aproximação de um rapaz pálido e sem
cabelos, que lhe fez uma pergunta:
- Você tem horas, por favor?
- Dez horas E cinco minutos, respondeu e
olhando para o rapaz sentiu que havia algo em comum com os pacientes do
hospital.
- A minha sessão de quimioterapia
começa as dez e meia, ainda falta um tempo, e sorriu para Cirilo Artur, que
reparou que ele estava careca e poderia lhe contar coisas sobre o tratamento.
Estava desesperado e qualquer luz, por pequena que fosse, seria benvinda.
Conversaram um pouco sobre a
doença, que era a mesma de Olívia e logo apareceu um senhor, que Jonas, o rapaz
careca, apresentou como sendo seu pai. O homem estava com a cabeça raspada e
disse para Cirilo Artur, que havia raspado a cabeça em solidariedade ao filho,
que amava muito.
Ambos se foram abraçados, deixando um
sentimento de grandeza de alma no ar. Uma certeza de que não estavam só naquela
triste jornada; havia apoio emocional entre eles.
Um texto de Eva Ibrahim