RECOLHENDO OS CACOS
CAPÍTULO TRÊS
Dentro
daqueles braços ele sentia-se seguro e desabou a chorar; precisava do colo da
amiga. Uma amizade recente, mas nascida da solidariedade e muito importante
para ambos. A moça estava ali para lhe dar o que ele mais precisava naquele
momento, carinho e silêncio. Jardel tinha um nó na garganta e não conseguia
falar nada; estava tomado pela emoção.
Dirigiu
seu automóvel entre lágrimas e vez ou outra um soluço era sentido; o único som humano
que havia ali. Nenhuma palavra foi dita durante o trajeto; era desnecessário. Quando
chegaram a sua casa, que estava fechada, ele pediu que Larissa entrasse com
ele. Ela concordou, não poderia deixa-lo sozinho naquele momento.
O
rapaz, desfigurado pela dor que trazia na alma, jogou-se no sofá; estava
exausto. Ela olhou ao redor e sentiu pena de tudo aquilo. Uma casa nova, bem
arrumada, cheia de poeira e com jeito de abandono. Um lar destruído pela
doença; perdera a função, era apenas uma casa.
Enquanto
ela foi até a cozinha e olhou a geladeira para ver se havia algum alimento para
servir ao amigo, Jardel adormeceu, as emoções foram muitas. Não havia quase
nada para comer naquele local e ela se preocupou em comprar alguma coisa para
ele comer quando acordasse. Saiu sem fazer barulho e voltou rapidamente, pois,
havia uma padaria na esquina da casa de Jardel.
O
telefone tocou e ela ficou sem saber se iria atender ou não; finalmente
resolveu atender. Era a mãe do rapaz, queria saber como estava e convidá-lo
para jantar. Ela se apresentou como uma amiga e disse que ele adormecera. Iria
fazer alguma coisa para ele comer quando acordasse e depois voltaria ao
Hospital ver o filho, que estava internado se recuperando da cirurgia. A mãe
agradeceu e disse que ele já havia falado do caso do filho dela durante o
velório e contando do apoio recebido.
Larissa comprou pães, frios e
fez café; preparou a mesa para quando Jardel acordasse. Deixou um bilhete
dizendo que estaria no Hospital caso precisasse dela. Ajeitou um cobertor sobre
ele, apagou as luzes, saiu e jogou as chaves por debaixo da porta.
O cansaço era grande e Jardel dormiu
sem se movimentar. Acordou quando o Sol bateu em seu rosto pela fresta da
vidraça. De um pulo, sentou-se no sofá, então, a realidade surgiu nua, trazendo
todo aquele sofrimento de volta. Estava tudo acabado, sua esposa se fora e
agora ele tinha uma filha para criar e muitos cacos para recolher.
Sentiu-se sujo, ainda estava com as
roupas do dia anterior e lembrou-se do cemitério e de sua caminhada até o
túmulo, onde o corpo de Lídia ficara enterrado. Pensou na filha, que estava com
a avó e desejou que estivesse bem; outra hora iria ver a menina. Agora
precisava tomar um banho, comer alguma coisa, seu estômago estava vazio e
dolorido. Em seguida levantou-se, olhou e viu o bilhete, a mesa posta e
sorriu, alguém pensara nele.
Lembrou-se
de Larissa e do abraço que recebera, depois iria até o Hospital para saber do
menino. A moça lhe inspirava carinho, havia um sentimento bom crescendo em
relação a ela. No entanto, precisava recolher os cacos de sua vida antes de
qualquer outra coisa.
Um texto de Eva Ibrahim