ADEUS AO PAI
CAPÍTULO OITO
Sandro crescia com saúde, estava
acostumado com a escuridão; aceitava a situação e procurava aguçar os outros
sentidos. Aprendera a tocar órgão e sentia-se feliz. O menino tinha ouvido
apurado e talento musical. O padre Guima arranjou um lugar para ele tocar na
Igreja ao lado da organista da paróquia. Gilda era a sombra do menino, cuidava
e protegia o filho de todas as maneiras; Sofia também ajudava em tudo que fosse
necessário.
Porém, Danilo estava cada dia mais
deprimido e se afogava na bebida; perdera o gosto de viver. Quando chegava à
sua casa, tarde da noite e bêbado, acusava Gilda da cegueira do filho, depois
deitava e dormia. Não era um homem mau, apenas não se recuperara do acidente do
filho; ele se dizia acovardado. Trabalhava para sustentar sua família e nas
horas de folga bebia muito.
Quando Sandro estava com treze anos
Danilo adoeceu e foi hospitalizado. Estava com cirrose hepática em estado
avançado, era um caso irreversível, dissera o médico. Depois de alguns dias
internado, Danilo faleceu.
Gilda se desesperou e foi saber por que
o marido se fora tão rapidamente; era jovem demais para morrer. O médico foi
categórico em afirmar que seu fígado não aguentara tanta bebida e a
consequência fora à morte.
O padre Guima ajudou Gilda com os
funerais e a consolou; gostava daquela família, que fora marcada com um fato
tão terrível, o acidente que causou a cegueira do menino. Depois ele explicou à
Gilda que muitas pessoas quando sofrem algum tipo de perda se fecham e perdem
também o rumo. Ficam deprimidas e começam a beber, depois se isolam do mundo e
chegam ao fundo do poço; então, desistem de viver. A morte ocorre por suicídio
ou de forma natural, isto é, em consequência da agressão imposta ao organismo,
como foi o caso de Danilo.
A mulher estava viúva, não sabia
descrever como se sentiu diante daquela notícia tão dolorosa e como poderia
agir diante do filho, que agora teria privada sua convivência com o pai.
Danilo, apesar de tudo, sempre procurou dar carinho ao filho e fazer suas
vontades. Seria mais uma perda irreparável imposta ao menino, que já tinha
sofrido muito com sua cegueira.
Gilda teria que compensá-lo de alguma
maneira, contava com Sofia ao seu lado para minimizar a ausência do pai. O
menino chorou e ficou abatido por vários dias, gostava do pai e não entendia
por que ele morreu. Gilda tentava suprir a falta de Danilo dando toda a assistência
que podia ao filho.
O
tempo passava rápido, Sandro com dezoito anos de idade se formou no segundo grau e ganhou um acordeão de
sua mãe; o rapaz ficou muito feliz. Rapidamente aprendeu a tocar o instrumento e foi
convidado a tocar em uma Banda, que se apresentava na noite. Depois estenderam
suas apresentações para festas de casamentos e Bailes de Debutantes. Sandro se
entrosou rapidamente e passou a faturar um bom dinheiro com seu trabalho.
Tornara-se um homem interessante e de gosto apurado.
–
Ganhava seu sustento e poderia se casar, não estava morto, tinha sentimentos e
queria companhia. Todos os seus amigos tinham mulher ou namorada, ele também
queria ter um amor, dizia Sandro para sua mãe.
Era um rapaz bonito e inteligente;
apareceram algumas moças interessadas nele, porém, Gilda as afastava do filho.
Dizia que eram interesseiras e que ele se casaria com uma moça igual a ele. Assim, não haveria perigo de ser traído.
A mulher recebia a pensão do marido e
vendia as tapeçarias que fazia juntamente com a Sofia. O filho ganhava seu
dinheiro tocando na banda com os amigos; era o que gostava de fazer.
Entretanto, Sandro era ambicioso e queria aprender a tocar piano e músicas
clássicas; demonstrava muito orgulho quando dizia que era músico. Na verdade,
ele descobriu a música e nela se descobriu; foi o que o ajudou a superar a
falta de visão.
Gilda procurou um Conservatório de músicas
onde houvesse partituras em braile, para que ele recebesse as aulas
necessárias. O Conservatório ficava na cidade vizinha e a mãe ou Sofia o
acompanhavam à escola. Passados dois meses, ele queria viajar sozinho,
aprendera a viajar de ônibus. E, fazia questão de demonstrar independência, que
podia e sabia andar sozinho com sua bengala.
Nas primeiras vezes, Gilda fingia que não
ia e o seguia para ter a certeza que nenhum mal lhe aconteceria. Com o tempo
ela foi deixando que Sandro fosse sozinho, ele era esperto e a escola ficava em
frente à parada de ônibus. O motorista e o cobrador sempre o ajudavam e assim
ele sentia-se seguro.
Sandro
gostava de frequentar o Conservatório, ficava eufórico no dia em que tinha
aulas; fazia questão de estar vestido impecavelmente. Gilda e Sofia ficaram
desconfiadas de que havia algo mais naquela escola. Gilda o acompanharia de
longe, para assuntar o motivo de tanta euforia.
Um
texto de Eva Ibrahim.
Continua
na próxima semana.