NAS MÃOS DE DEUS
CAPÍTULO DEZ
A
menina já nasceu guerreira, uma criança prematura que mamava muito; estava
sempre com fome. Os médicos explicaram à Cesane que a filha ficaria na
incubadora até ganhar peso, isto é, ter dois quilos. Cristal nasceu com um
quilo e seiscentos gramas, mas já perdera peso, então, depois de três dias,
estava com um quilo e quatrocentos gramas.
A
pressão arterial de Cesane foi controlada depois do parto e, em alguns dias
iria para casa. No entanto, ela queria ficar perto da filha e passou a
queixar-se de dores aqui e ali. O médico percebeu que as queixas não condiziam
com os exames e o estado físico da paciente. Ela estava muito bem e poderia ter
alta; já não precisava ocupar um leito de Hospital.
Fazia uma
semana que Cristal viera ao mundo e uma pessoa inesperada apareceu para uma
visita, era o pai da menina, Roger. Cesane, assustada, mal conseguiu manter-se em pé ao vê-lo parado na porta do quarto. Alda, rapidamente, amparou a filha e
encarando o sujeito foi logo dizendo:
- O que você
está fazendo aqui? Quem deixou que entrasse?
- Estou aqui para conhecer a criança, que é minha
também. É filho ou filha? Meu informante não soube dizer o sexo do bebê. Falou
com a ironia de sempre.
A moça sentou-se na poltrona, estava pálida, fraca e
com medo do que aquele homem poderia fazer com Cristal. O amor, que um dia
sentira por ele, agora se transformara em raiva e repulsa.
Ele ficou parado na porta esperando para saber onde
estava a criança. Mas, para a sorte de todos o médico apareceu e, percebendo a
situação, pediu ao rapaz que se retirasse ou chamaria a segurança.
Ele
saiu resmungando que voltaria para ver a criança, deixando atrás de si o medo
estampado no rosto da mãe e da avó de Cristal. As duas abraçadas choraram pela
infeliz situação vivida.
-
Será que nunca teriam sossego? Agora aquele inconsequente estava de volta e os
problemas também. Alda murmurou entre lágrimas.
Rui
chegou mais tarde e prometeu proteger a filha e a neta daquele cafajeste. Nunca
deixaria ele aproximar-se da sua família.
Cesane
precisou tomar um calmante para dormir e não queria deixar a filha ali e ir
para casa. No entanto, ela estava bem e teve que deixar o hospital, não havia
motivo para ocupar um leito de hospital, dissera o médico.
Amparada pela mãe, ela se foi com lágrimas nos olhos e com a condição de
poder estar ali todos os dias com a filha. A menina ficaria na neonatologia
para conseguir o peso mínimo para ir para casa.
Durante
um mês as duas mulheres foram ao hospital diariamente e tinham a promessa do
médico, de que Cristal poderia ir para casa, uma vez que ela estivesse com o
peso exigido. Finalmente o dia tão esperado chegou; Cristal estava com dois
quilos de peso.
No
domingo à tarde, Rui foi buscar as três mulheres de sua vida no hospital e nada
poderia ofuscar aquela felicidade. Nem mesmo o temor do aparecimento do pai da
criança. Roger se tornara um fantasma ameaçador para todos naquela casa,
principalmente para Cesane, que temia por Cristal.
Os
meses passavam sem nenhuma novidade, a menina crescia forte e Cesane parecia
mais calma e conformada em ser mãe solteira. Seus pais supriam toda e qualquer
necessidade da mãe e da filha. Roger havia desaparecido novamente e eles
esperavam que nunca mais aparecesse por ali.
Cristal estava com seis meses de idade quando aconteceu uma fatalidade,
que abalou Cesane mais uma vez. Um amigo de Rui apareceu ali para contar a triste
novidade:
- Roger sofreu um acidente e morreu no local,
estava de motocicleta e bateu de frente com um caminhão, voando pelos ares. O
fato aconteceu na cidade vizinha, por isso, pouca gente ficou sabendo da ocorrência, concluiu o rapaz.
A
moça precisou ser amparada, afinal ainda o amava e, Roger era o pai de Cristal.
Alda e Rui se entreolharam e com um suspiro disseram:
-
Pelo amor de Deus, vamos esquecer esse rapaz e guardar somente uma lembrança
boa para dar à Cristal. Que descanse em paz, morreu do jeito que viveu,
loucamente.
O
casal lamentou formalmente e com um suspiro entreolharam-se; o sossego estava
de volta àquele lar. Eles supririam a falta do pai para criar aquela pedra
preciosa, que era a Cristal; estavam nas mãos de Deus.
Um texto de Eva Ibrahim