DINAMITE
Lucas chegou à casa da tia Lola, levado
pelos pais, em uma missão muito importante, escolher um cãozinho. A cadela, mãe
dos cinco filhotes, fora comprada pelo pai do menino, Celso, irmão de Lola,
como sendo cachorro “macho”. Na empolgação, o homem não se lembrou de olhar os
órgãos genitais do animal, apenas aceitou o cão que lhe foi vendido e seguiu
viagem; era uma surpresa para seu filho Lucas.
O nome fora escolhido pelo
menino, “Roger”; durante alguns dias o cão corria e brincava no jardim da casa,
tornara-se amigo da criança. Foi levado ao veterinário para tomar banho e
vacinas, era peludo e estava gordo; uma beleza de cachorro. Quando o Celso foi busca-lo teve uma grande
surpresa. O seu cão era uma cadela, o veterinário explicou ao rapaz. O homem
fora enganado, pagara por “Roger” e trouxera a “Rogéria”. O homem ficou nervoso
e queria tirar satisfações com a loja, mas seu filho já tinha se apegado a
cadela e a melhor solução encontrada foi deixar o animal na casa de sua irmã, que
não se importava em ter um filhote de cachorro do sexo feminino em sua casa. Assim,
Lucas, o sobrinho poderia visita-la quando quisesse. E, quando que nascessem
filhotes, Lucas iria escolher um cãozinho “macho”, filho da Rogéria, que morava
com a tia Lola.
Rogéria era uma cadela de raça,
uma bela fêmea de “Pastor alemão”. Tinha pedigree e certificado “falso” porque
constava ser um cachorro. Ela era mansa, tinha pelos pretos e amarelos; uma
fêmea bonita e vistosa. Logo arrumou um namorado na rua de sua nova casa. Um elegante
e vistoso cão “Vira-lata” marrom, que a deixou prenha. Quando nasceram os cinco
cãezinhos, a mulher não sabia o que fazer; teria que recorrer à doação. Lucas
estava lá para escolher o seu presente de aniversário; um cãozinho fofo. Antes
de levar o cão escolhido todos examinaram os órgãos genitais do animalzinho,
pois, seu pai não queria cadela, ele temia que houvesse procriação em sua casa.
O menino saiu com seu presente no
colo, estava muito feliz. Lucas olhou para ele e disse que ele tinha focinho de
“Dinamite” e assim passou a ser chamado.
Dinamite era forte, saudável e
bagunceiro. Um cão que comia chinelos, meias e roía o que estava por perto. Por
diversas vezes Celso ameaçou leva-lo para o sitio de um conhecido. Lucas
chorava, o pai se comovia e Dinamite continuava na casa. Certo dia a mãe do
menino foi ao Supermercado e comprou carne moída, iria fazer quibes para o
jantar.
A mulher colocou a carne sobre a
mesa e foi guardar o restante do dinheiro no quarto, quando voltou à carne
havia sumido. Saiu à procura e encontrou o cachorro com o focinho dentro do
pacote de carne; ele comeu um quilo de carne moída. Só não foi jogado na rua
porque Lucas chorava de soluçar; mais uma vez sua mãe relevou a traquinagem;
ela amava o filho e não queria vê-lo desesperado.
Dinamite já estava com dois anos,
um cachorro adulto, malandro e medroso. Em dias de jogos de futebol ele se
escondia debaixo do automóvel da família; a cada rojão era um ganido dolorido.
A avó de Lucas adoeceu e a filha
andava muito preocupada com a mãe; planejara uma visita naquela tarde. Era uma
boa caminhada e antes de sair, a mulher procurou o cão para deixa-lo no
quintal, mas, não o encontrou. Deduziu que estava na rua e seguiu com o filho
para visitar sua mãe.
A tarde quente e ensolarada
prometia chuva de verão no fim do dia, porém ela voltaria logo para sua casa;
antes da chuva, pensou. Deixara a casa toda limpa, pois comprara um jogo novo
de sofás e estava feliz com sua casa arrumada.
Ficara algum tempo conversando
com sua mãe acamada enquanto Lucas brincava no quintal. De repente ouviu-se o
barulho de um trovão e a mulher saiu para ver o tempo, que estava muito escuro.
Sua mãe a aconselhou esperar a chuva passar, pois o tempo fechara de repente e
viria muita água pela frente. A filha concordou, era perigoso sair com tantos
relâmpagos e trovões.
Depois de uma hora a tormenta
havia passado e mãe e filho tomaram o caminho de casa. Havia muitas árvores
caídas nas ruas, a tempestade fora arrasadora. Ao chegar a casa o menino
lembrou-se do cachorro:
- Onde o cão ficara durante a
tormenta?-
Ao abrir a porta eles descobriram
onde estava o Dinamite. Sobre o sofá novo em meio a muita espuma revirada em
toda a sala. Ele destruíra o sofá novo, rasgando e mordendo a espuma; havia
buracos profundos em cada assento. O cachorro ficara dentro da casa e com os
trovões entrou em desespero e atacou o sofá.
A mulher abanava a cabeça
apreensiva, como explicar a situação ao marido; ele ficaria furioso. Lucas
olhava assustado para sua mãe, como reparar o desastre provocado por Dinamite?
Essa pergunta pairava no ar. O
cão se aproximou abanando o rabo, não entendia que poderia virar um cão sem
teto nas próximas horas. Dinamite e o menino saíram dali e a mãe começou a
fazer a limpeza do local.
Quando terminou a faxina, a
mulher viu o tamanho do estrago. Buracos esfiapados de circunferência de vinte
centímetros, em cada assento. Seu sofá estava destruído e ela teria que
explicar ao marido que o cão era inocente, deveria ter olhado melhor antes de
fechar a casa. Para amenizar a situação ela preencheu os buracos com espuma da
almofada e colocou sobre o assento uma toalha florida; ganharia tempo para
arrumar uma desculpa.
Lucas, temeroso de perder o
cachorro, se manteve calado; deixaria que a mãe resolvesse a situação
complicada. O pai saia cedo e voltava tarde da noite, assim, alguns dias se
passaram até que, no sábado, o pai sentou-se no sofá. Estranhou o desnível e
levantou-se retirando a toalha que cobria os buracos.
Atônito, o homem chamou sua
mulher.
- O que era aquilo? Perguntou espantado
e furioso.
Mãe e filho se postaram em frente
ao homem pedindo que ele perdoasse o cachorro, pois, ele não tivera culpa. O
pai saiu sem responder e foi deitar-se, depois pensaria no caso.
No dia seguinte ele foi trabalhar
e deixou mãe e filho na expectativa; não sabiam o destino de Dinamite. A noite,
após o jantar ele expôs sua decisão: Se ficassem com Dinamite o sofá ficaria
rasgado, porque ele não pagaria o concerto. Porém, se quisessem consertar o
sofá ele doaria o cachorro a um amigo. Era uma escolha justa, pois todos
estavam errados.
Lucas foi deitar-se chorando e
sua mãe foi conversar com o filho. Ficariam com Dinamite e ela deixaria a
toalha sobre o sofá até conseguir economizar dinheiro para comprar outro sofá. Por
ora a situação fora contornada e Lucas passou a vigiar Dinamite até ele crescer
e sossegar.
Há dois anos a toalha está cobrindo o sofá e o Dinamite continua bagunceiro, mas nada que se pareça com a tragédia do
sofá, que já incorporou a toalha.
Um sofá novo está prometido para
o próximo Natal, o pai relevou a decisão para fazer sua família feliz.
Um texto de Eva Ibrahim.