CAPÍTULO
QUATRO
Otávio passou a manhã do dia dez de
junho trabalhando, parecia meio alheio ao que estava acontecendo na farmácia.
Saiu apressado, assim que foi rendido pelo seu colega; o destino era a padaria,
que ficava no final da avenida. Entrou e foi até a atendente do estabelecimento.
Depois de um leve cumprimento, pediu que ela lhe dissesse qual era o bolo que o
rapaz, na semana anterior, havia encomendado para sua namorada. Otávio era
frequentador assíduo do lugar e a moça já o conhecia, por isso a conversa fluiu
fácil.
- Por favor, eu quero um bolo igual
ao dele e com morangos em cima. A moça tomou nota do pedido e marcou para ser
retirado na tarde do dia seguinte, véspera do dia dos namorados. O rapaz saiu
alegre, estava confiante, iria se declarar à Milena.
Seguiu andando pela avenida,
que estava cheia naquele horário, entretanto, ele parecia flutuar e não
percebia o movimento ao seu redor; estava feliz. Um estado de espírito há muito
tempo esquecido. Então, avistou uma floricultura, era o que estava procurando. Otávio
queria encomendar um ramalhete de rosas vermelhas e deixar um cartão para ser
entregue com as flores. Estas, deveriam estar nas mãos de Milena ao cair da noite
do dia onze; exatamente as dezenove horas, precisou o rapaz.
“Ao amor, com carinho.
Milena,
para mim você representa o amor e a felicidade; me dê uma chance por favor.
Beijos”
Otávio
Pagou e saiu andando, precisava
respirar ar puro para se acalmar. A sorte fora lançada e agora era só esperar o
dia seguinte.
Em sua cabeça passou um filme e
reviu o seu casamento, o nascimento de suas duas filhas e todos os
desentendimentos que culminaram com a separação do casal. Maria, sua esposa, se
dissolvera em alguma parte do seu passado. Hoje em dia, era apenas a mãe das
meninas. Não sentia nenhuma emoção, carinho, nada; tornara-se uma estranha para
ele.
Otávio não acreditava que algum dia voltasse a amar, mas, agora estava
apaixonado. Sentia o mesmo frio na espinha de quando era jovem ou até com mais
intensidade. Tinha experiência e sabia quais erros evitar, completara cinquenta
anos e sentia que tinha muita vida pela frente. No entanto, precisava de uma
nova oportunidade para provar que o amor é importante, porque a solidão deprime
e mata.
Naquela noite, Otávio rolou na
cama durante algumas horas, estava muito ansioso e não conseguia dormir. Já na
madrugada ele adormeceu e acabou acordando com o Sol na vidraça da sala, que
refletia em seu quarto; não ouviu o despertador. Chegou esbaforido em seu trabalho, suscitando
espanto por parte de seus colegas. Era um homem correto demais, para chegar
atrasado no serviço.
- Otávio está diferente, com um
brilho no olhar, será que está apaixonado? Cochicharam as atendentes do local.
À tarde, saiu do trabalho e
passou na padaria para pegar o bolo, teria que entregar pouco antes das
dezenove horas, queria estar lá, quando as flores chegassem.
As dezoito e quarenta e cinco
ele já estava pronto, e postado em frente ao espelho. Otávio estava limpo e
cheiroso, precisava demonstrar asseio para a moça que queria conquistar.
Chegou na portaria do prédio de
Milena com a caixa nas mãos. Pediu ao porteiro para perguntar se ele poderia
subir, para levar um bolo para ela e as crianças. A moça estranhou, mas, educadamente
disse que poderia subir:
- Por que será que o vizinho vai
trazer bolo para mim e as crianças? O que estará acontecendo? Não teve tempo
para mais nada, ele já estava ali; a campainha tocou.
Milena, que acabara de chegar do
trabalho foi atender a porta. A situação era estranha, ela conhecia o vizinho
de vê-lo na janela, apenas isso. E, agora ele estava ali com uma caixa nas
mãos. A moça ficou vermelha e o convidou a entrar, não poderia fazer diferente;
era uma moça educada. Ele entregou o bolo dizendo:
- Milena, eu trouxe um bolo para
você e as crianças, para comemorar o dia dos namorados.
Ela ficou sem jeito e o convidou a
sentar-se; não esperava passar por aquela situação. Passou alguns minutos e o
interfone tocou novamente. Era o porteiro avisando que estava subindo um
entregador de flores. Ela ficou parada, meio paralisada com tantas novidades.
A campainha tocou e ela recebeu um
lindo ramalhete de rosas vermelhas com um cartão. A moça, trêmula, abriu o
cartão e ficou de queixo caído. O cartão era do vizinho, que estava sentado em
seu sofá.
Otávio ficou olhando e sorrindo para
a moça, que estava espantada com as flores e o cartão nas mãos.
Um
texto de Eva Ibrahim Sousa