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quarta-feira, 20 de março de 2019

"JÁ OUVI SILÊNCIOS SÁBIOS, JÁ OUVI CONSELHOS VÃOS, JÁ VI BEIJOS SEM USAR OS LÁBIOS, E TOQUE SEM USAR AS MÃOS. E DESSA OBSERVÂNCIA CALMA, UM VERSO EU DEIXO DE LIÇÃO: FELIZ É QUEM TOCA COM A ALMA, E ENXERGA COM O CORAÇÃO" GABRIEL CASTRO

A ENCRUZILHADA

CAPÍTULO NOVE
             Alceu olhava para sua esposa e via nela um porto seguro, então, a abraçava com os olhos. Estava carente, num momento frágil de sua vida. Havia muitas questões para serem decifradas, ele não era igual as pessoas de suas relações. Sentia uma presença ao seu lado, mas não tinha certeza se era seu anjo ou alguma entidade perdida.

            Elisa estava desconfiada de sua lealdade, pois, ele gritara com uma mulher, enquanto dormia. Alceu tentou segurar as mãos de sua esposa, porém, ela as retirou de seu alcance e levantando-se disse:

              - Quero uma boa explicação, ou a partir de hoje você irá dormir no quartinho dos fundos. Não quero traidor ao meu lado!

               Ela estava realmente muito brava e ele sabia que não seria fácil convencê-la; sentia que ela cumpriria o prometido. No entanto, sabia também, como comovê-la e começou a chorar. Elisa voltou e sentou-se ao seu lado, era uma mãezona. Assim, entre um soluço e outro, ele começou a contar tudo que havia acontecido e terminou dizendo:

           - Nunca mais eu vou fazer entregas sozinho, ou vou com André ou com um funcionário do supermercado. Eu fiquei muito impressionado com aquela visão, não quero mais passar por isso.

           Elisa abraçou o marido, que parecia uma criança assustada. Ela sabia como era difícil a luta interna, que o marido travava, desde os dezessete anos, com coisas desconhecidas. Deitou-se bem juntinho ao marido e ficou alisando seus cabelos até ele adormecer, estava condoída pela situação. Enquanto isso, Alceu se acalmava e voltava a dormir. Elisa, apreensiva, fez uma oração, precisavam de paz, tinham filhos para criar.

         Assim, mais alguns anos se passaram e quando ele completara quarenta e cinco anos, aconteceu um fato muito estranho. Era final de tarde da quinta-feira santa e o freguês, que estava a cavalo, pediu ao Alceu para levar suas compras até o sítio. Argumentou dizendo, que no dia seguinte nada ficaria aberto e ele precisava dos mantimentos.

            Alceu era prestativo, mas desta vez titubeou, porque o sítio ficava a doze quilômetros do supermercado. Aquela era uma região de muitos pequenos agricultores, sitiados ao redor da cidade. Uma clientela fiel e difícil de se negar alguma coisa. Sendo assim, diante da insistência do freguês, concordou, mas levou com ele um funcionário da empresa.

             Já era tarde e ele não conhecia o caminho, foi se orientando pelo rabisco que o freguês fizera numa folha de papel. Estava escuro quando chegaram à casa do cliente, descarregaram e saíram rapidamente, não queriam chegar tarde em casa.

            Pegaram a estradinha de volta e chegaram à uma encruzilhada, que não tinham reparado estar ali antes. Ficaram espantados, mas não havia outra estrada para ser seguida.

             - Estamos perto, com certeza. Dizia Alceu, tentando convencer a si próprio. Não é possível! Cadê a estrada por onde passamos?

            Alceu estava ficando nervoso e repetia que estavam perto, o tempo todo, para o companheiro. No entanto, nunca chegavam, parecia que andavam em círculos. Luís, seu companheiro, estava preocupado, sua esposa não gostaria que ele chegasse tarde em casa, eram recém-casados.    

             Nessa época não havia celular, somente o relógio e o rádio do caminhão. Depois de uma hora de idas e vindas o caminhão morreu, o motor simplesmente apagou. Alceu tentou fazer o motor pegar novamente, mas não obteve sucesso.

           Quando olhou o relógio, já marcava vinte e três horas e trinta minutos. Os dois homens sentaram-se no banco e tentaram cochilar, nada poderiam fazer senão esperar, que alguém passasse por ali ou esperar o dia amanhecer.

Quando eles iam pegar no sono, ouviram o barulho de cavalos, mas, quando saíram para pedir ajuda, não havia nada lá fora. Voltaram e ficaram encolhidos no banco do caminhão, estavam ficando com medo.

Já passava da meia noite e era sexta-feira santa, deveriam estar em casa e não no meio do mato. Os dois homens se entreolharam e começaram a rezar o “Pai Nosso”, estavam em uma encruzilhada.
 Um texto de Eva Ibrahim Sousa

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