DEIXAR
IR
CAPÍTULO
DEZ
O pastor acolheu o rapaz com um longo
abraço, ele sabia o grande amor que unia o casal. Um casamento que ele
celebrara com muito gosto. Cirilo Artur chorou no ombro do velho pastor, que
estimava como a um segundo pai. Não conseguia falar, estava tomado pela emoção;
precisava de colo.
Abraçados, seguiram para a cozinha da
casa pastoral; lá foi oferecido uma xícara de chá com biscoitos para Cirilo
Artur, que nem se lembrava de comer. Depois do chá e um pouco mais calmo,
conversaram sobre a passagem de Olívia.
– Onde eu errei pastor, fiz tudo que
pude para salvar minha mulher, e perdi a batalha. Deus não gosta de mim, por
isso me quer triste e acabado. Disse o rapaz com os olhos marejados de
lágrimas.
– Não se revolte contra Deus, ele
deve ter um propósito para você, por isso o deixou sozinho. Afirmou o velho
homem, para consolar o irmão necessitado.
Cirilo Artur simplesmente baixou sua
cabeça e chorou.
– Nunca irei blasfemar contra meu
Deus e a minha igreja, me ajude pastor, estou perdido e sem rumo.
Os dois homens ficaram
conversando, até que Cirilo Artur adormeceu sentado no sofá; não tinha ânimo
para voltar para sua casa. Então, o pastor o deitou lentamente, depois jogou
uma coberta sobre ele e foi deitar-se. Com olhar piedoso prometeu aos céus cuidar do rapaz. Seria o seu porto seguro e o ajudaria a vivenciar o seu luto, para atravessar a escuridão da solidão.
Os primeiros dias foram os mais
difíceis para Cirilo Artur; muito choro, muita mágoa e revolta também. Mas, uma
coisa o fez sorrir em meio a tantas atribulações, precisava buscar a peruca de
Olívia. Ela fora confeccionada com seus cabelos; era um pedaço dela que ficaria
com ele.
Ele voltou com a caixa contendo
o seu tesouro, uma peruca dos cabelos de Olívia. Aquilo foi um alento para suas
angustias, conhecia aqueles cabelos sedosos, que tantas vezes acariciara.
Cirilo Artur voltou ao trabalho que
o distraia durante o dia, no entanto, as noites eram difíceis de suportar. O
pastor, então, lhe propôs uma ocupação, ajuda-lo como seu assessor nos
trabalhos da igreja. Teria que fazer um curso para tornar-se missionário.
Sua missão seria dedicar-se aos muitos
trabalhos do ministério e arrebanhar novas ovelhas. Começaria em suas férias e
se gostasse teria que deixar o escritório para cumprir suas atividades em tempo
integral. O velho pastor prosseguiu explicando o seu intento.
-
O propósito do missionário é convidar as pessoas a se aproximarem da obra do
evangelho. Servir a Deus incentivando e ajudando a população a conhecer a
Bíblia, aumentando sua fé em Jesus Cristo. Aprender a expiar os seus pecados
através do arrependimento e do batismo. E, quando receber o Espírito Santo,
perseverar até o fim.
Cirilo
Artur concordou, estava sem rumo e o convite lhe parecia uma maneira de fazer o
que gostava, contribuindo para a aproximação das pessoas na igreja. Ficou três
semanas no retiro se preparando para ajudar o pastor e quando voltou estava
diferente, havia um brilho em seu olhar.
Os seus companheiros e irmãos
ficaram felizes em ver, que o rapaz se recuperava a olhos vistos. Depois do
sermão, que Cirilo Artur assistira embevecido, já no pátio da igreja, o pastor
aproximou-se e disse:
- Vejo amor em seu olhar. Isso me deixa feliz
filho.
Cirilo Artur, imediatamente olhou para cima e
lá havia uma estrela brilhando, destacando-se das demais.
Ele fez uma prece, com certeza era o
seu amor, que o guardava lá de cima. Estas foram as últimas palavras de Olívia:
“Vejo amor em seu olhar”.
- Sim, agora vou deixar ir o meu amor,
ficarei com as saudades e as lembranças, para seguir minha missão; a evangelização
dos meus irmãos em Cristo. Serei um missionário simples, humilde e dedicado.
Um texto de Eva Ibrahim