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sexta-feira, 4 de outubro de 2013

"PERDER-SE TAMBÉM É CAMINHO...." CLARICE LISPECTOR --- VIVER E PONTO FINAL! EVA IBRAHIM.

                                  ESTAÇÃO SOLIDÃO,
                                   UMA NOVA VIDA.
                                        CAPÍTULO 7
      O homem saiu á caminho do ponto de ônibus carregando seu maior troféu; um amigo para conversar. Antonio estava alegre, nunca mais sentiria solidão. Ele entrou pela porta dos fundos do coletivo para colocar a mala e depois desceu para passar na catraca. Houve murmúrios entre os passageiros, a mala tomava espaço e alguns passageiros não gostaram. Ele manteve a calma segurando a mala com muita força, não respondia ás provocações. Mantinha-se firme em seu propósito de levá-la para casa, ali estava o que de mais precioso ele tinha no momento.
        Desceu no ponto de ônibus em frente à praça, uma quadra antes de sua casa e sentou-se no banco com a mala ao lado. Esperaria mais um pouco, queria evitar os olhares curiosos dos vizinhos. Por volta das dez da noite ele seguiu para seu lar, estava satisfeito.
       Era sexta-feira e ele teria o final de semana inteiro para acostumar-se com a nova situação. Tirou o boneco da mala e o deitou na cama de casal; precisava vesti-lo para dormir. Pegou o pijama xadrez que havia comprado e vestiu o Bernardo. 
         - Ficou lindo! Pensou Antonio.
Satisfeito, o homem dizia que ali ele teria tudo que precisasse e em troca deveria  ouvir os seus problemas diários. Foi até a geladeira e preparou dois copos de leite com chocolate, depositando-os sobre a cômoda do quarto. Sentou o novo amigo na poltrona e disse:
         -Vamos tomar leite para dormir, já é tarde e, comida pode pesar no estômago.
Com uma mão segurava o copo de Bernardo e com a outra levava á boca enquanto sorvia o líquido gelado. Como se fosse uma brincadeira, o homem levou o copo á boca do boneco e depois perguntou:
        -Está gostoso, Bernardo?
 Em seguida, satisfeito, seguiu até a vasilha de leite do Lobo e despejou o líquido ali. O cão lambeu até a última gota e foi deitar-se sobre o tapete da entrada da casa. Antonio agradeceu a Deus aquela paz e felicidade que estava sentindo. Deitou o amigo ao seu lado na cama, apagou a luz e dormiu como nunca havia dormido antes; ele voltara á dormir em sua cama de casal.
       Era domingo e Antonio queria proporcionar ao amigo um almoço especial, mas não tinha prática no fogão, então saiu e entrou num restaurante para comprar comida para duas pessoas. Chegando á casa ele arrumou a mesa com dois pratos, como sua mulher fazia quando ainda vivia ali. Colocou Bernardo sentado na cadeira junto á mesa e sorrindo elogiou o amigo dizendo que ele estava bonito. Em seguida iniciou o almoço, comendo com satisfação; de vez em quando ele falava com Bernardo sentado á frente do prato. Tomou nas mãos o copo de cerveja e brindou com o outro copo cheio, que estava próximo do prato do amigo.
      Feliz da vida levou o boneco para a sala dizendo para ele ver televisão. Antonio arrumava a cozinha depois de levar a comida de Bernardo para o Lobo, quando a campainha tocou. O homem teve um sobressalto e correu para espiar quem estava no portão. Era um mendigo pedindo comida e ele tratou de dispensá-lo logo, não queria intrusos, nem visitas. Voltou para a cozinha com uma ruga de preocupação na testa.
        –E se chegasse algum parente ou conhecido?
        - O que faria-?
       Voltou para a sala e sentou-se ao lado de Bernardo, estava pensativo e preocupado, precisava preparar uma estratégia para qualquer situação inesperada que surgisse. Ninguém poderia descobrir o boneco, senão pensariam que ele estava doido. Estava preparado para viver uma nova vida, porém queria privacidade total.
     Antonio estava feliz, descobrira um jeito de não enlouquecer e manter sua cabeça ocupada, como sempre gostou. O Lobo tomava conta do jardim, qualquer coisa que mexesse no portão ele latia enfurecidamente e isso era ótimo, guardava a casa e protegia o Bernardo. O homem sentado no sofá ao lado do amigo parecia feliz; dois amigos assistindo televisão, tão caracterizado fora o boneco. De vez em quando Antonio sorria e fazia algum comentário olhando para Bernardo.
       Quando o sono começou a fazer com que abrisse a boca ele disse ao amigo que era hora de dormir. Como um pai ele trocou a roupa de Bernardo e novamente trouxe o leite com chocolate e tomou. Em seguida, levou á boca do boneco e depois deu ao Lobo, que por sinal, logo estaria uma bola, pois comia toda a comida de Bernardo.
       Deixou tudo arrumado para sair para o trabalho na segunda-feira; deixaria ração para o cachorro e o seu amigo trocado e arrumado, sentado no sofá. O Lobo comia qualquer coisa, vivera muito tempo nas ruas da cidade.
        Na segunda feira as horas não passavam, ele estava ansioso pensando em sua casa; teria que levar comida para os dois e fazer uma chave para a mala e outra para o guarda roupas; passaria em um chaveiro. A ideia era que se alguém fosse visitá-lo, ele teria um local para esconder o amigo. Uma semana passou rapidamente sem nenhum problema; ele saia do trabalho á tarde, passava no restaurante e seguia com pressa para ver como estava o amigo. Tinha muito trabalho para manter a casa e estava contente, tinha uma família para cuidar.
         Na sexta-feira á noite o telefone tocou e deixou o homem nervoso, era sua irmã Nalva, que morava no interior. A mulher dizia que chegaria no próximo sábado para uma visita de dois dias. Ele quase disse para ela não vir, mas levantaria suspeitas; a irmã pensava em ajudá-lo e não seria justo impedi-la de visitá-lo. Teria que esconder o Bernardo na mala, dentro do guarda roupas.
       Nalva chegaria ás 10 horas da manhã com a filha adolescente e mexeria em tudo. O homem, franzindo a testa, pensou que seria um péssimo final de semana. Antonio teria que esconder o Bernardo. Ele demorou a pegar no sono e quando dormiu teve muitos pesadelos. Sonhou que sua irmã apontava o dedo para ele dizendo que estava louco.
          –Onde já se viu ter um boneco como amigo?
            Sua irmã gritava e a sobrinha ria sem parar.
           Antonio acordou suando.
          -Afinal a vida era sua e ninguém tinha nada a ver com isso.
Pensou irritado, enquanto levantava-se para guardar o boneco e a mala; logo suas visitas chegariam.
       O taxi encostou e sua irmã, com um largo sorriso no rosto, desceu e foi apanhar as malas. Antonio se apressou a ajudar a irmã, gostava dela e estava feliz em revê-la.
Nalva estava acompanhada da filha adolescente. Abraçou o irmão e sorriu feliz ao ver que ele estava bem.

Um texto de Eva Ibrahim.


Continua na próxima semana.
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