ESTAÇÃO
SOLIDÃO,
UMA NOVA
VIDA.
CAPÍTULO
7
O homem saiu á caminho do ponto de
ônibus carregando seu maior troféu; um amigo para conversar. Antonio estava
alegre, nunca mais sentiria solidão. Ele entrou pela porta dos fundos do
coletivo para colocar a mala e depois desceu para passar na catraca. Houve
murmúrios entre os passageiros, a mala tomava espaço e alguns passageiros não
gostaram. Ele manteve a calma segurando a mala com muita força, não respondia
ás provocações. Mantinha-se firme em seu propósito de levá-la para casa, ali
estava o que de mais precioso ele tinha no momento.
Desceu no ponto de ônibus em frente à
praça, uma quadra antes de sua casa e sentou-se no banco com a mala ao lado. Esperaria
mais um pouco, queria evitar os olhares curiosos dos vizinhos. Por volta das
dez da noite ele seguiu para seu lar, estava satisfeito.
Era sexta-feira e ele teria o final de semana inteiro para acostumar-se
com a nova situação. Tirou o boneco da mala e o deitou na cama de casal;
precisava vesti-lo para dormir. Pegou o pijama xadrez que havia comprado e vestiu
o Bernardo.
- Ficou lindo! Pensou Antonio.
Satisfeito,
o homem dizia que ali ele teria tudo que precisasse e em troca deveria ouvir os seus problemas diários. Foi até a
geladeira e preparou dois copos de leite com chocolate, depositando-os sobre a
cômoda do quarto. Sentou o novo amigo na poltrona e disse:
-Vamos tomar leite para dormir, já é
tarde e, comida pode pesar no estômago.
Com
uma mão segurava o copo de Bernardo e com a outra levava á boca enquanto sorvia
o líquido gelado. Como se fosse uma brincadeira, o homem levou o copo á boca do
boneco e depois perguntou:
-Está gostoso, Bernardo?
Em seguida, satisfeito, seguiu até a vasilha
de leite do Lobo e despejou o líquido ali. O cão lambeu até a última gota e foi
deitar-se sobre o tapete da entrada da casa. Antonio agradeceu a Deus aquela
paz e felicidade que estava sentindo. Deitou o amigo ao seu lado na cama,
apagou a luz e dormiu como nunca havia dormido antes; ele voltara á dormir em
sua cama de casal.
Era domingo e Antonio queria
proporcionar ao amigo um almoço especial, mas não tinha prática no fogão, então
saiu e entrou num restaurante para comprar comida para duas pessoas. Chegando á
casa ele arrumou a mesa com dois pratos, como sua mulher fazia quando ainda
vivia ali. Colocou Bernardo sentado na cadeira junto á mesa e sorrindo elogiou
o amigo dizendo que ele estava bonito. Em seguida iniciou o almoço, comendo com
satisfação; de vez em quando ele falava com Bernardo sentado á frente do prato.
Tomou nas mãos o copo de cerveja e brindou com o outro copo cheio, que estava
próximo do prato do amigo.
Feliz da vida levou o boneco para a
sala dizendo para ele ver televisão. Antonio arrumava a cozinha depois de levar
a comida de Bernardo para o Lobo, quando a campainha tocou. O homem teve um
sobressalto e correu para espiar quem estava no portão. Era um mendigo pedindo
comida e ele tratou de dispensá-lo logo, não queria intrusos, nem visitas.
Voltou para a cozinha com uma ruga de preocupação na testa.
–E se chegasse algum parente ou
conhecido?
- O que faria-?
Voltou para a sala e sentou-se ao lado
de Bernardo, estava pensativo e preocupado, precisava preparar uma estratégia
para qualquer situação inesperada que surgisse. Ninguém poderia descobrir o
boneco, senão pensariam que ele estava doido. Estava preparado para viver uma
nova vida, porém queria privacidade total.
Antonio estava feliz, descobrira um
jeito de não enlouquecer e manter sua cabeça ocupada, como sempre gostou. O
Lobo tomava conta do jardim, qualquer coisa que mexesse no portão ele latia
enfurecidamente e isso era ótimo, guardava a casa e protegia o Bernardo. O
homem sentado no sofá ao lado do amigo parecia feliz; dois amigos assistindo
televisão, tão caracterizado fora o boneco. De vez em quando Antonio sorria e
fazia algum comentário olhando para Bernardo.
Quando o sono começou a fazer com que
abrisse a boca ele disse ao amigo que era hora de dormir. Como um pai ele
trocou a roupa de Bernardo e novamente trouxe o leite com chocolate e tomou. Em
seguida, levou á boca do boneco e depois deu ao Lobo, que por sinal, logo
estaria uma bola, pois comia toda a comida de Bernardo.
Deixou tudo arrumado para sair para o
trabalho na segunda-feira; deixaria ração para o cachorro e o seu amigo trocado
e arrumado, sentado no sofá. O Lobo comia qualquer coisa, vivera muito tempo
nas ruas da cidade.
Na segunda feira as horas não passavam,
ele estava ansioso pensando em sua casa; teria que levar comida para os dois e
fazer uma chave para a mala e outra para o guarda roupas; passaria em um
chaveiro. A ideia era que se alguém fosse visitá-lo, ele teria um local para
esconder o amigo. Uma semana passou rapidamente sem nenhum problema; ele saia
do trabalho á tarde, passava no restaurante e seguia com pressa para ver como
estava o amigo. Tinha muito trabalho para manter a casa e estava contente,
tinha uma família para cuidar.
Na sexta-feira á noite o telefone
tocou e deixou o homem nervoso, era sua irmã Nalva, que morava no interior. A
mulher dizia que chegaria no próximo sábado para uma visita de dois dias. Ele
quase disse para ela não vir, mas levantaria suspeitas; a irmã pensava em
ajudá-lo e não seria justo impedi-la de visitá-lo. Teria que esconder o
Bernardo na mala, dentro do guarda roupas.
Nalva chegaria ás 10 horas da manhã com a
filha adolescente e mexeria em tudo. O homem, franzindo a testa, pensou que
seria um péssimo final de semana. Antonio teria que esconder o Bernardo. Ele
demorou a pegar no sono e quando dormiu teve muitos pesadelos. Sonhou que sua
irmã apontava o dedo para ele dizendo que estava louco.
–Onde já se viu ter um boneco como
amigo?
Sua irmã gritava e a sobrinha ria
sem parar.
Antonio acordou suando.
-Afinal a vida era sua e ninguém
tinha nada a ver com isso.
Pensou
irritado, enquanto levantava-se para guardar o boneco e a mala; logo suas
visitas chegariam.
O taxi encostou e sua irmã, com um
largo sorriso no rosto, desceu e foi apanhar as malas. Antonio se apressou a
ajudar a irmã, gostava dela e estava feliz em revê-la.
Nalva
estava acompanhada da filha adolescente. Abraçou o irmão e sorriu feliz ao ver
que ele estava bem.
Um texto de Eva Ibrahim.
Continua na próxima semana.