RECORDAR É VIVER
CAPÍTULO VINTE E QUATRO
Reinaldo sabia que estava para tomar uma
atitude muito importante para sua vida; estava apaixonado por Celina. Porém,
havia um sentimento de culpa que não o deixava pegar no sono; era nostalgia de
um passado feliz. A presença de Amanda aparecia forte em seus sonhos, sempre
apontando o dedo e acusando-o de traição; se esquecera dela e dos filhos, dizia
em seus pesadelos.
Tomara
uma taça de vinho para adormecer mais rápido e não pensar em nada. Entretanto,
acordou durante a madrugada e ficou olhando o relógio mudar os ponteiros. Sua
insônia estava virando rotina, parecia haver hora certa para pensar na defunta.
Balbuciou um palavrão e se calou em seguida.
– Será que Amanda pode me ver ou ouvir?
Sentiu pena de si mesmo, estava vivendo contradições em sua vida.
Procurou os chinelos, vestiu a camisa do pijama e, então decidiu se levantar e
ligar o computador. Reinaldo precisava matar o tempo para não enlouquecer. No
computador estavam as fotos de Amanda e dos seus filhos; ele começou a chorar
enquanto via as fotos. Ali na tela estava sua vida e sua história dos últimos
oito anos.
- Como poderia se esquecer de toda a felicidade vivida? E, as crianças
como iriam receber uma nova mãe?
Essas perguntas martelavam sua cabeça, no entanto, ele assumira um
compromisso com Celina e não queria fugir dela. Estava apaixonado e queria
ficar com ela; precisava refazer sua vida. Iria se confessar com o padre
Germano, amigo da família e que conhecia sua história. Este pensamento
acalentou seu coração e ele pegou um copo com água; estava mais calmo.
Voltou para a cama e ouviu um trovão, outro relâmpago e, em seguida
outro estouro. Levantou-se e abriu uma metade da janela para ver a chuva,
porém, o vento invadiu o quarto e ele teve que fechá-la rapidamente. Naquele
momento lembrou-se de Amanda e das noites chuvosas que passara com ela aninhada
em seus braços. Lembrou-se também, do
edredom rosa que ela puxava para esconder a cabeça a cada novo estouro e ele
protestava.
- Por que essa coberta não poderia ser azul ou de outra cor? Rosa era
coisa de mulher, dizia aborrecido e Amanda ria dele.
Agora ele percebia que era feliz e não se dava conta. Lembrou-se da
noite que retornaram de uma festa de aniversário e as crianças trouxeram uma
porção de balões e soltaram no meio da sala. Depois caíram no sono, estavam cansadas
de tanto brincar. Reinaldo e Amanda foram se deitar, estavam exaustos e logo
adormeceram.
No meio da noite, ouviu-se um barulho ensurdecedor dentro do quarto do
casal e Reinaldo deu um pulo da cama, seguido de Amanda; ambos correram para
ver as crianças. Estava tudo quieto e os filhos continuavam dormindo, então, o
rapaz pegou uma faca de cortar carne e saiu para ver onde estava o ladrão. O
barulho era de tiro e a mulher ficou tremendo e implorando para o marido não
abrir a porta.
As
luzes foram acesas e nada havia do lado de fora. E, Reinaldo entrou e
abaixou-se para olhar debaixo da cama, o bandido poderia estar ali. Mas para
sua surpresa, um dos balões havia estourado naquele local; com o quarto
fechado, o barulho foi ensurdecedor. Ambos riram e acabaram caindo nos braços
um do outro.
Recordou-se
dela na cama e do jeito que dormia, do seu cheiro, dos lábios carnudos
convidando-o para muitos beijos. Voltou para a cama vazia, fazia oito meses que
Amanda sucumbira a um câncer de mama. Estava triste e solitário quando
encontrara Celina, que padecia do mesmo dor e ele sentiu a possibilidade de
refazer sua vida.
No
entanto, teria que resolver todas as amarguras e guardar as lembranças de
Amanda. Viver seu luto integralmente e se confessar com o Padre Germano para
poder recomeçar sua vida. Precisava afastar seus fantasmas para se entregar à
outra mulher, que estava a sua espera.
Um texto de Eva Ibrahim.
Continua na próxima semana.