RETALHAR
O CORPO
CAPÍTULO
ONZE
Quando Valentina completou dois anos
da cirurgia bariátrica, e com o peso estabilizado por seis meses, era hora de
enfrentar a nova etapa, em busca da beleza corporal. A moça estava com setenta
e oito quilos, mas não poderia ficar de biquíni ou roupa decotada e sem mangas.
A magreza trouxera novos problemas para ela, e acentuou o complexo de
inferioridade, já existente. Ganhou em leveza, agilidade, saúde, mas estava
longe de se achar bonita.
As peles ficavam penduradas nos
braços, nos peitos, nas coxas e na barriga, formando uma pochete sobre a púbis;
ela evitava olhar-se no espelho. Odiava aquilo tudo, ainda era virgem e jamais
tiraria a roupa diante de um rapaz.
- Morreria invicta, pensava com
raiva do mundo.
Muitas noites passara chorando, ela
não tinha mais jeito. Tratava de se cobrir rapidamente com roupas largas;
sentia-se pior do que antes de perder peso.
Valentina, acompanhada da mãe, saiu
do consultório médico com os olhos cheios de lágrimas. A colocação do médico
assustou a paciente. Ele disse que para ela tirar todo aquele excesso de
pelancas teria que:
- Retalhar o corpo para tirar todo as
sobras de peles, então, se tornará uma moça magra e muito bonita. Afirmou o
médico com uma ponta de ironia.
A mãe ficou na defensiva, tinha
medo daquelas palavras, parecia o gado no açougue sendo retalhado depois de
abatido. Sentia-se ofendida, mas o médico foi objetivo e claro em sua
explanação. Disse que era assim que ele queria, que a sua paciente tomasse um
choque de realidade e, então, estaria pronta para iniciar as novas cirurgias.
Clara conversou com o marido e lhe
explicou tudo; Rui concordou em levar Valentina para concluir o que haviam
começado. A filha estava magra, porém continuava com complexos de inferioridade,
pois vivia de roupas largas e soltas em seu corpo; parecia uma assombração. E,
continuava motivo de chacotas dos colegas e conhecidos. Apenas o Ferrugem a
acompanhava e a defendia das bocas malditas.
- Agora, estamos na reta final e ela
deve se submeter ao que for preciso para se livrar das peles, que sobram em seu
corpo. Afirmou a mãe preocupada.
O plano cirúrgico foi montado pelo
médico. Quatro cirurgias reparadoras no mínimo, em primeiro lugar a
abdominoplastia. Em seguida a mamoplastia com colocação de silicone, pois as
mamas de Valentina simplesmente sumiram, deixando dois trapinhos murchos pendurados.
Quando estivesse recuperada seria feita a intervenção nos braços e por último
nas pernas.
- Mais um ano de lutas com o bisturi, e
só restarão cicatrizes em pontos pré-determinados, afirmou o médico para a mãe
e a filha, que se mostravam ansiosas.
Somente
então, Valentina poderá dizer que está magra e pronta para a vida, foi a
conclusão a que Clara chegou. Havia ainda, um longo caminho a ser percorrido.
Um texto de Eva Ibrahim.
Continua
na próxima semana.