SUA VISÃO DE MUNDO
CAPÍTULO SEIS
Gilda estava nervosa com o primeiro dia
da permanência de Sandro na Escola Infantil para cegos; temia que ele se
assustasse e desistisse da escola. A professora do menino foi recebê-lo com
alegria e depois pegou em sua mão para conduzi-lo à sala de aulas. Ele titubeou
e quis chorar, porém, Gilda o abraçou dizendo que ficaria ali até as aulas
terminarem. Sandro iria completar seis anos e teria iniciada sua alfabetização,
mas, para isso teria que sofrer um processo de adaptação, para depois iniciar
seu aprendizado em braile.
O grupo de educadores daquela escola explicaram para Gilda, que teriam que estimular a construção de sua visão mental
de tudo que o cercava, dando significado a cada som ouvido, ou sentido a cada
coisa percebida. A mulher ficou no fundo da sala, observando quieta tudo que se
passava naquele local.
Seu
filho permanecia sentado ouvindo a professora e os sons das outras crianças que
estavam na sala de aulas. Essas crianças são mais quietas, pois precisam ouvir
para decodificar a mensagem, então, são raros os burburinhos.
Com muita segurança a professora chamava
cada criança pelo nome e os estimulava a contar um pouco de suas vidas. Sandro
ficou em pé e disse que não podia ver porque tinha machucado seus olhos e todos
o aplaudiram desejando boas vindas ao pequeno menino. Gilda chorou
silenciosamente, as lágrimas corriam pelo seu rosto indo morrer em sua boca,
deixando um gosto salgado em sua alma. Aquele momento a elevou aos céus. Ela,
então, compreendeu que tinha uma grande missão a cumprir; era coisa de Deus.
A escola tinha uma proposta de apresentar
o mundo para as crianças através dos sons, do toque, percepções táteis e
gustativas, para suprir a falta da visão estimulando e explorando os outros
sentidos. Começaram fazendo sons repetitivos e exercícios bucais para aprender
a soltar a voz. A sala tornou-se um lugar de sons de todos os tipos, as
onomatopeias estavam presentes.
-O gato faz que som? E, todos miavam.
-O
cão faz que som? E, todos latiam.
E, assim
sucessivamente os sons invadiam a sala. Rapidamente chegou a hora do recreio e mãe e filho se
abraçaram; o menino estava alegre, gostara da escola.
A ausência da visão seria compensada
estimulando e explorando os outros sentidos, que permaneciam intactos, levando
em conta suas potencialidades. A professora daquela classe parecia ter
consciência da importância de considerar o potencial de cada criança e não
salientar suas limitações. A criança cega terá em seus outros sentidos, seus
olhos para o mundo e a música fará com que sinta muitas sensações, que sua alma
reconhecerá em sentimentos e emoções, explicou a professora para Gilda.
O som dos pássaros cantando, uma porta
rangendo, os carros passando, o vento assoviando e o farfalhar dos galhos das
árvores entre outros sons, despertam a percepção auditiva, que será seu maior
trunfo na falta da visão. Além disso, terá aguçado o tato no reconhecimento
das superfícies e de todas as coisas que podem ser tocadas; O contato com as pessoas e coisas próximas será um aliado
imprescindível ao ouvido, para a formação de sua visão de mundo.
O Instituto era excelente, ali
trabalhavam as sensações gustativas, o olfato e a expressão corporal acompanhada
de músicas. Percebeu-se que a música tinha o poder de relaxamento e
contentamento; a criança aprende a se desenvolver através dela.
Os dias iam passando e Gilda não
precisava ficar assistindo as aulas, deixava o menino na escola e depois voltava
para busca-lo. Ele estava gostando da escola e demonstrava alegria quando
contava coisas que estava aprendendo com as outras crianças cegas.
A mulher percebeu seus progressos quando
ele pedia para tocar seu rosto com as mãozinhas e de seu pai também. Depois
sorria dizendo que eram bonitos. O tato permite que a criança sinta a
temperatura, textura, forma e linhas de expressão.
Em outro dia, Gilda viu o menino tateando
seu próprio rosto, sua pele, as roupas, enfim, tudo que fazia parte de seu
corpo. Depois perguntou a mãe quais eram as cores de suas roupas. A mãe lhe
explicou que ele estava muito bonito e com roupas coloridas, pois, era seu
príncipe. Portanto, ele poderia criar uma representação simbólica para cada coisa
que o cercava; ela seria a luz de seus olhos enquanto vivesse. O amor se
fundiu em um longo abraço.
Um texto de Eva Ibrahim.
Um texto de Eva Ibrahim.
Continua
na próxima semana.