COMO
UMA PLUMA
CAPÍTULO
QUATRO
Foi a primeira noite que Daniela dormiu
em paz, depois do aborto. As palavras do padre caíram como um bálsamo em seu
coração. No dia seguinte, a moça foi com Mateus buscar seus pertences no apartamento,
onde morava com uma amiga. Então, passou a morar com seu noivo, que assim
poderia ficar mais tranquilo, sabendo que ela estava bem. Todos os dias saiam
juntos para o trabalho.
Daniela precisava de apoio, para se
recuperar do trauma sofrido ao perder o bebê. Era uma dor sem muita
consistência, um sonho de acalentar o filho, que nunca viu ou sentiu. O aborto
aconteceu prematuramente e não havia lembranças físicas de sua presença.
O noivo agia como um psicólogo em
relação ao assunto, para ele o bebê ficou no passado e ele queria sua mulher de
volta, pois a amava muito. Precisava reconstruir a relação de cumplicidade, que
havia entre eles, antes do episódio traumático.
Aos poucos e com muito carinho e
compreensão, Daniela voltava a sorrir, apesar de algumas vezes, dormir chorando.
A tristeza tomava conta da moça, especialmente quando via crianças com suas
mães, ou quando parava em frente a vitrines de lojas especializadas em roupas
para recém-nascidos. Mateus evitava lugares onde a moça pudesse ficar
emocionada.
Assim, a vida continuava e o
casamento estava adiado, para quando a noiva se sentisse recuperada. Disseram
ao pai dela, que a situação estava difícil e iriam esperar mais um pouco para o
enlace. Portanto, ganhavam tempo para arrumar as coisas necessárias para as
bodas.
Pouco a pouco, ela foi voltando a
ser a mesma moça alegre, que Mateus conhecera e se apaixonara. O final do
ano se aproximava e eles faziam planos para o casamento e, quem sabe, uma nova
gravidez. Havia se passado cinco meses do aborto e decidiram que já estava na
hora de regularizar a situação.
Voltaram à casa dos pais da jovem e combinaram
o casamento para o final de dezembro, queriam iniciar o ano casados. Havia
planos para uma lua de mel em Caraguatatuba. Precisavam voltar ao lugar onde
Daniela perdeu seu primeiro filho, para passar uma borracha naquele sofrimento.
Na prática, já estavam casados,
apenas a família da moça não sabia que moravam juntos. Tudo resolvido e eles se
acomodaram, deixando de lado os cuidados para não engravidar.
A jovem estava no trabalho, quando olhou para
o calendário sobre sua mesa, então, de um estalo percebeu, que sua menstruação
estava atrasada. Na hora do almoço, falou de suas suspeitas para Mateus, que
prometeu passar na farmácia para comprar um teste de gravidez.
Chegando em sua casa, o rapaz
entregou o teste para sua noiva, ambos estavam ansiosos. E, quando a fita
coloriu dois risquinhos, ambos se abraçaram. Daniela estava grávida novamente e
a esperança apareceu estampada nos olhos dos dois. O choro foi inevitável, a
emoção envolveu o casal. No entanto, uma pergunta ficou no ar.
Será que teriam forças para reviver toda
aquela situação de medo e incertezas? A ferida ainda estava aberta, precisavam
da ajuda de um profissional.
No dia seguinte, foram ao ginecologista,
precisavam de esclarecimentos ou ficariam doidos. O médico, que conhecia toda
aquela história, sorriu e deu os parabéns ao casal.
- Você precisa se submeter a
alguns exames, ficar atenta a qualquer sinal de dor ou sangramento, no mais terá
que seguir as orientações e, com certeza, tudo correrá bem. Foi o que o médico
disse.
O profissional experiente foi
convincente, acalmou o casal, que saiu dali com muitas esperanças, de ter o
filho tão desejado. A alegria voltou ao rosto de Daniela, que nesse momento se
lembrou de sua professora dizendo, que precisamos praticar a resiliência.
Saíram abraçados, já não estavam sós, a moça
trazia um novo ser em seu ventre. Mateus, então disse:
- Precisamos contar para todos os familiares,
nosso filho já está a caminho.
- Sim meu amor, mas, antes vamos
regularizar nossa situação, meus pais ficarão alegres com nosso casamento.
Depois receberão a notícia de que serão avós. Respondeu a moça sorrindo.
O rapaz não se conteve e a beijou no
meio da rua, estava muito feliz.
Pessoas que passavam pelo local,
pararam para admirar a manifestação de amor em público. Em seguida, o casal saiu
do local rindo, nada importava naquele momento; estavam leves como uma pluma
pairando no ar.
Um texto de Eva Ibrahim Sousa