O ANJO
CAPÍTULO
SETE
Uma década se passou e Alceu nunca
mais teve visões ou ouviu vozes. Estava casado, tinha duas filhas e continuava
a trabalhar com o pai e o irmão. O comércio crescera bastante e, consequentemente
necessitou de ampliação, tornando-se um supermercado, que dava sustento a todos.
Marília e o marido também trabalhavam no novo estabelecimento; eram muito chegados
à família. E, os avós continuavam morando ali, tranquilos e felizes.
Certo dia, um conhecido da roça
adentrou ao supermercado e encheu um carrinho de compras, depois pediu ao Alceu
se ele poderia fazer a entrega em sua casa. O freguês deveria seguir viagem até
a cidade vizinha. Tinha negócios lá e sua mulher precisava da comida para o
jantar.
Quirino ouviu a conversa e ficou
preocupado. Fazia dias que chovia sem parar e, a estrada que dava acesso à casa
de Raimundo era de terra, em uma região de morros e montanhas. Corria notícias
de que havia quedas de barreiras por aquelas bandas.
- Alceu, se você for fazer a
entrega do Raimundo debaixo desse tempo, é melhor que leve seu irmão junto.
Disse o pai preocupado.
– Sim pai, vou chamar o André. Concordou
o rapaz.
Carregaram o caminhão com mais
pedidos, que entregariam ao longo do caminho. Estavam acostumados com os
fregueses, sempre pedindo para entregar as compras em suas casas. Entretanto, o
sítio do Raimundo ficava a quinze quilômetros da cidade e era um trajeto
perigoso em dias de chuva.
Quando
saíram o céu estava fechado, uma barra negra se aproximava, trazendo uma grande
tormenta para a região; era a promessa da natureza.
André
ainda tentou argumentar com Alceu dizendo:
- Vamos deixar as entregas para amanhã bem
cedo, parece que vai cair o mundo e pode ser perigoso.
Mas, Alceu respondeu que se
comprometera com os fregueses, que aguardavam os alimentos para fazer o jantar.
– Não podemos perder a confiança
dos nossos clientes, vamos em frente.
As estradas de terra esburacadas e
tortuosas provocavam um arrepio no corpo dos dois rapazes. Em dez minutos,
começou a chover torrencialmente e o caminhão seguia a quarenta por hora. Havia um silêncio, que era quebrado pelos
relâmpagos, que riscavam o escuro da noite e os dois irmãos se encolhiam temerosos.
Alceu não enxergava quase nada.
Estavam
no meio do caminho quando avistaram um veículo parado junto ao barranco, era um
automóvel preto com o pisca alerta ligado.
André pediu para o irmão parar,
para socorrer quem estivesse em perigo dentro do automóvel. Poderia ter
mulheres e crianças ali, que não poderiam ignorar.
Alceu diminuiu a velocidade para
encostar o caminhão, no entanto, apareceu um homem diante do veículo, fazendo
sinal para eles seguirem em frente.
O homem vestia uma roupa esquisita,
parecia um árabe, daqueles que usam túnicas brancas. Era uma figura estranha,
que acenava freneticamente, indicando a estrada. Os dois irmãos sentiram medo e
Alceu acelerou, saindo dali rapidamente. Depois de alguns longos minutos de
correria, avistaram um posto de gasolina e resolveram entrar e tomar um café
quente; estava muito frio.
Ao adentrar o recinto perceberam que
não havia ninguém por ali, no entanto, estava tudo aberto e resolveram procurar
o dono. André esbarrou em uma estante derrubando uma lata, que fez muito barulho,
então ouviram pedidos de socorro. Seguiram os gritos e chegaram nos fundos do
posto. Os apelos de socorro vinham detrás da porta do depósito, que estava
trancada.
Os dois rapazes arrombaram a porta
e encontraram o dono, a sua esposa, o filho e dois funcionários. Depois de
deixarem o local, contaram que foram assaltados por três rapazes, que chegaram
em um carro preto e estavam fortemente armados.
Fazia uma hora mais ou menos, então o dono do
posto perguntou por onde vieram e eles disseram ter visto um veículo preto
parado com o pisca alerta aceso.
Alceu ficou pálido e o André amparou o irmão.
– Meu Deus, se tivéssemos parado, seríamos
assaltados também. Disse André.
- Aquele homem da túnica branca
era o mesmo que vi na janela do hospital, ele nos salvou. Deve ser meu anjo da
guarda. Balbuciou Alceu.
Aguardaram a chuva diminuir,
tomaram um café quente e prosseguiram para fazer as entregas. Quando voltaram
já era tarde, todos haviam se recolhido, menos Quirino, que aguardava os filhos
chegarem.
- Graças a Deus vocês chegaram, eu
estava com um mal pressentimento, disse o pai aliviado.
- Você estava certo pai, um anjo
nos salvou de um assalto. Responderam em coro os dois irmãos.
Um
texto de Eva Ibrahim Sousa