CAPÍTULO DEZ
Fernando parecia sereno ao contar os fatos vividos enquanto estava em
coma; para ele parecia natural relatar onde estivera. No entanto, Marília
ficara espantada e não sabia como reagir àquela história. Não poderia demonstrar
incredulidade ou menosprezar o que ele dizia naquele momento, mas era difícil
aceitar sem fazer perguntas.
Ela
foi salva pela campainha, que determinava o final do horário de visitas. Teria
até o dia seguinte para enfrentar Fernando e tentar entender aquilo tudo. Saiu
atordoada e andou rapidamente, parecia querer fugir de alguma coisa. E, quando
percebeu, já estava em frente à sua casa.
Sentia-se realmente preocupada, precisava contar para o seu irmão e ouvir seus conselhos. Estava acuada, não sabia se cortava ou incentivava aquela história, que seu
marido insistia em contar.
O
conselho recebido do irmão era para ela ouvir e não contrariar. Fernando estava
em um processo de recuperação e retorno à vida. Marília pediu perdão a Deus por
ser tão incrédula, no entanto, ouviria com atenção as histórias que seu marido
contasse; seu irmão estava certo. E, por mais difícil que fosse, tentaria
entender, para ajudar na recuperação do seu amor.
Voltou
ao hospital e encontrou o marido na enfermaria. Lá ela poderia ficar durante
uma hora inteira com Fernando. Demonstrou toda sua satisfação em ver os
progressos do marido, estava feliz. No entanto, Marília procurava não entrar
naquele assunto novamente, temia ouvir aquela história, que para ela era
fantasiosa.
O lanche da tarde chegou e ela ajeitou o marido para comer, Fernando ainda precisava de ajuda; estava debilitado e se cansava atoa. O paciente comia, lentamente, alguns biscoitos e ela, vez ou outra, levava a xícara até
sua boca para que sorvesse o chá.
Não falavam,
apenas se olhavam, para que Fernando pudesse engolir os biscoitos. Sua garganta
estava sensível pelo longo tempo que estivera com um tubo na garganta.
Entretanto, quando terminou de tomar o chá morno ele falou:
- Interessante, eu não me lembro de ter comido
qualquer coisa, enquanto estava no campo dos lírios. Também não me lembro de
sentir fome ou sede; estava satisfeito com tudo naquele lugar. Afirmou o
paciente, pensativo. Depois prosseguiu:
- Um dia eu
segui uma borboleta, que estava sempre por perto e fui até a beira do rio. Fiquei
cansado, deitei e dormi embaixo de uma árvore. Não senti medo nem desconforto,
estava tudo bem. Lá era tudo muito natural, não havia medos nem sobressaltos.
Marília
ficou mais assustada, ele falava de uma realidade que não existia. Então, ela
concordou com a cabeça e tratou de mudar de assunto. O esforço para se
alimentar o deixou sonolento e Fernando dormiu.
Ela levantou-se da cadeira e foi até a janela para olhar a vista.
Marília quase caiu para trás, quando viu uma borboleta azul do lado de fora do
vidro da janela.
–
Meu Deus! Exclamou e deu um passo para trás. – Seria a mesma borboleta que Fernando
dissera ter seguido?
Em
seguida, começou a rezar pedindo a Deus para proteger seu amor. Não contaria a
Fernando, que tinham uma visita na janela, para que não ficasse impressionado.
Os
dias foram passando e na maioria deles a borboleta estava lá. Tornara-se um
segredo incontável, nunca diria a ninguém sobre aquele fato. Depois de quinze
dias na enfermaria, ela recebeu a notícia de que Fernando estava de alta para
casa.
Antes de sair do hospital ela foi até a janela e lá estava a visitante. Mentalmente, ela
implorou a Deus que aquela história terminasse ali. Nunca mais queria ver
aquela borboleta, sentia medo dela.
Seu
marido saiu do hospital andando com alguma dificuldade, precisava de tempo para
sua total recuperação.
–
Fernando está vivo e sem sequelas neurológicas, por um milagre de Deus. Dissera
o médico para a mulher emocionada.
Marília abraçou o marido, estava
pronta para ajudá-lo a seguir em frente, o restante ficaria no passado. A única
certeza que ela tinha é que seu marido esteve entre a vida e a morte,
aguardando uma decisão dos céus. Fernando estivera entre os lírios na companhia
de uma borboleta azul.
A borboleta fora uma espécie de anjo salvador,
que zelava pela sua recuperação e, agora sua missão terminava ali. Fernando
estava bem e retornando à vida.
Um texto de
Eva Ibrahim Sousa