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sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

HOJE INICIAMOS UMA NOVA HISTÓRIA EM CAPÍTULOS. "MULHERES DE PAPEL" DE EVA IBRAHIM. --" RENUNCIO AS HONRAS, MAS NÃO A LUTA" EVITA PERON

                            MULHERES DE PAPEL.
                                 CAPITULO UM.
            Marcos chegou do aeroporto e jogou sua bolsa sobre a mesa de jantar e olhando de relance viu sua esposa, Clara, sentada no sofá folheando uma revista. Desconfiada a mulher levantou-se para recebê-lo, fazia quatro dias que ele viajara para o Rio de Janeiro e não atendia o celular. Lá no fundo ela sabia que estava sendo traída, mas não tinha forças para reagir, nem mesmo abordar o assunto; temia acabar na rua da amargura.
          Educadamente ele disse: - Tudo bem?
Ela aquiesceu com a cabeça e se aproximou esperando que ele lhe desse um beijo, porém, ele foi saindo e dizendo que na sexta-feira teriam um jantar no Clube de Campo.  E, enfatizando as palavras, determinou que ela fosse ao salão de beleza e ficasse apresentável, pois era um jantar de casais e ele tinha negócios naquele meio; precisava se apresentar em grande estilo. Finalizando ele disse que não queria uma “jeca” como sua acompanhante, que fosse comprar uma roupa nova.
          Marcos saiu e Clara com os olhos cheios de lágrimas experimentou uma variedade de emoções: medo, raiva, negação e finalmente pegou o telefone para marcar o salão de beleza. Ficaria muito bonita, ele teria que engolir o que dissera. Se ela era uma “Jeca” ele teria que aguentá-la, gostasse ou não; teria que aprender a respeitá-la, pois tinham dois filhos adolescentes, que precisavam do pai. Clara dependia do marido para tudo, ele fizera com que ela deixasse seu trabalho no Banco, para ser apenas dona de casa e agora não a queria mais.
          Quando mudou seu estilo de vida e fez escolhas conscientes ao longo do caminho, a mulher achava que seu casamento duraria para sempre. Marcos era bom e tinha uma vida financeira estável e ela o amava. E, tendo mais tempo livre ela poderia criar seus filhos e dar a eles tudo que nunca tivera. Clara vivia feliz com sua família, suprimira seus sentimentos e aceitava tudo que o marido queria. Acatava as novas oportunidades, aquelas mais adequadas ao seu novo estilo de vida.
          Desde o Natal, agora já era setembro, ela percebeu que o marido andava estranho e grosseiro, também notou que fora se afastando aos poucos; ele a ignorava. À noite ele se deitava e dormia e ela chorava. Quando Clara o abraçava ele resmungava e tirava o braço dela, não queria manter contatos mais íntimos.
 Como ela gostaria de ter a coragem de expressar seus sentimentos ou o que restara deles. Muitas pessoas já suprimiram seus sentimentos a fim de manter a paz em sua família e ela não seria diferente. Como resultado, a maioria teve uma existência medíocre e nunca se tornaram quem eram realmente capazes de se tornar. Marcos e Clara mantinham as aparências para não magoar os filhos, mas, havia um oceano entre eles.
          Clara pensava em suas antigas amizades, que deixara escapar; só restaram as mulheres dos empresários que faziam parte do grupo de seu marido. Falsas e fúteis foi à conclusão que a mulher chegou; não poderia dividir seus problemas com elas e sua família morava no interior. Estava à mercê do destino, precisava pensar nos filhos, João e Renata.
        Muitas pessoas não percebem, até o fim, de que a felicidade é uma escolha. Ela estava presa a velhos padrões e tradições e uma delas era acompanhar o marido ao jantar de negócios. Queria ver a cara da secretária de Marcos, que era a culpada de suas aflições. Uma loira escultural, que estava saindo com seu marido e ela sabia de tudo, mas não poderia deixar ninguém perceber nada. Deveria ficar bonita, falar pouco e sorrir levemente para todos os amigos de Marcos; era assim que ele queria que ela se comportasse.
Um texto de Eva Ibrahim.

Continua na próxima semana.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

“SOLIDÃO É A MANEIRA QUE O DESTINO ENCONTRA PARA LEVAR A PESSOA AO ENCONTRO DE SI MESMA”. HERMANN HESSE. —“É MUITO FÁCIL SER PEDRA, O DIFÍCIL É SER VIDRAÇA”. PROVÉRBIO CHINÊS.


                                 BRILHANDO COM AS ESTRELAS.
                                         CAPÍTULO 15
Antonio estava completamente decidido a viver recluso, não queria prejudicar mais ninguém. Ele sentia que todas as pessoas que se aproximavam dele, sofriam algum tipo de agravo à saúde; era a maldição da pedra amarela, disso ele tinha certeza.
           Deixou a barba crescer e saia de casa somente uma vez a cada mês, para manter sua casa e suas necessidades básicas. Seu visual era de um homem sem vaidade; roupas simples e surradas, porém, limpas. Os vizinhos o apelidaram de “Ermitão”. O homem não tinha amigos e não gostava de intrusos. Cuidava de sua casa e tinha o Lobo para espantar curiosos, que de tanto ficar sozinho se tornara um cachorro muito bravo.
         A solidão é um sentimento no qual a pessoa fica com uma profunda sensação de vazio, sem motivos para viver; muitos entram em depressão. Porém, quando é voluntária pode trazer uma paz compensadora; era uma opção de vida para Antonio. Ele tinha seu amigo, o Bernardo, que ele amava como se fosse seu filho. Bernardo, desde a morte de Verônica, fora seu companheiro e ouvinte. O boneco sabia tudo da vida daquele homem, que o criara para não enlouquecer; era sua fuga do mundo lá fora. O Lobo era o guardião da casa e só permitia a aproximação de seu dono e de mais ninguém.
        Antonio criou para si uma estação solidão; uma parada da vida. Ali ele era soberano e assim vivia tranquilo. Seus dois companheiros lhe davam o equilíbrio necessário para continuar vivendo nesse mundo, que lhe trouxera muitas inquietações. Antonio, Bernardo e o Lobo, eram amigos para sempre.
Alguns anos se passaram e todos da região sabiam da existência do Ermitão, que era um homem pacato, mas não gostava de ser incomodado. Todo mês ele era visto recebendo sua aposentadoria e comprando mantimentos, depois se recolhia até o mês seguinte. Os vizinhos conheciam sua rotina e sempre o avistavam fazendo algum conserto em sua casa ou pondo o lixo na rua. Certo dia alguém reparou que ele estava sumido e ninguém o via, fazia dias. O cachorro estava inquieto e emagrecido.                           
       –Será que aconteceu alguma coisa com o homem? Os vizinhos, apreensivos, resolveram chamar a polícia.
Quando a viatura da polícia chegou, o cachorro desesperado foi comer a comida que a vizinha trouxera para distraí-lo, enquanto os policiais entravam na casa.
         Ao redor da casa havia um cheiro de carniça, algo de muito errado estava acontecendo ali, disse um policial ao outro. Quando o policial arrombou a porta e entrou na casa, sentiu que o cheiro ficara mais forte e com uma mão segurando o nariz pôs a outra mão no coldre e adentrou ao quarto. Antonio e o Bernardo, lado a lado na cama, pareciam dormir.
        O policial se aproximou e pondo a mão no homem sentiu que estava frio e duro. Espantado, deu um passo para trás deduzindo que fazia dias que o homem estava morto; só não entendeu a presença do boneco na cama, em seguida chamou reforço.
      Houve um alvoroço na rua com a chegada da pericia e do caminhão de defuntos. Na casa foi encontrado o endereço de Nalva, a irmã de Antonio, que veio, juntamente com sua filha, para enterrar o corpo do irmão, de quem há muito tempo não tinha notícias.
       A mulher, surpresa, não sabia por que seu irmão desaparecera. Durante algum tempo procurara por ele, depois desistira, ele sabia seu endereço, se quisesse vê-la que a procurasse, declarou no plantão policial. Nalva ficara surpresa com a nova vida de seu irmão e a presença daquele boneco na cama de Antonio, era tudo muito estranho.
        Estava em suas mãos resolver aquela situação e precisava encontrar os documentos de Antonio, por isso ela começou a mexer em seus guardados e encontrou a mala dentro do guarda roupas.
         Ao abrir a mala ela percebeu que apesar de vazia, tinha alguma coisa dentro do compartimento fechado com zíper. Abriu o zíper e colocou a mão para pegar o pequeno volume. A mulher quase desmaiou quando viu que era a pedra amarela que estava ali. Com a pedra na mão, Nalva começou a orar, era inacreditável.
       -Como aquela pedra fora parar ali? Estava muito longe de onde sumira; era um enigma de difícil solução. Nalva sacudia a cabeça enquanto mostrava a pedra à sua filha.
Havia alguma coisa maligna naquela pedra e ela iria se aconselhar com o Padre. O pároco a aconselhou a devolver a pedra para o lugar de origem e sossegar seu coração, nada poderia ser feito além de muita oração para o seu irmão.
         Enquanto o corpo de Antonio estava sendo periciado, ela e sua filha teriam que resolver o que fazer com o cachorro e o boneco. O Lobo já estava velho e era um cão muito bravo, por isso a vizinha resolveu ficar com ele; guardaria sua casa e terminaria seus dias ali mesmo. Conversando com a vizinha ela falou do boneco e disse que não sabia o que fazer com ele. Era de seu irmão e não queria, simplesmente, jogá-lo fora.
       - Não!
        Exclamou a mulher eufórica, ela conhecia um pessoal, que todos os anos desfilavam nas escolas de samba do Rio de Janeiro, no sambódromo. Faziam bonito na pista do “Marquês de Sapucaí”, a passarela do samba e ela tinha a certeza que eles dariam um lugar de destaque ao boneco, pois era muito bem cuidado. Nalva concordou entregando Bernardo à mulher. 
         Depois de dois dias e resolvendo tudo por ali, Nalva e a filha foram ao enterro do corpo de seu irmão e em seguida retornaram à sua cidade. A mulher tinha uma missão a cumprir, queria que seu irmão pudesse descansar em paz.     Voltaria à represa e jogaria a pedra amarela o mais fundo possível, para nunca mais ouvir falar daquela triste história, que atormentou a vida de seu irmão.
            Assim foi feito e Nalva cumpriu sua missão. Quando voltava para sua casa já havia anoitecido e o céu estava carregado de estrelas. E, elevando seu olhar para o alto, viu que uma estrela brilhava mais que as outras e concluiu, olhando para sua filha:
         -Bernardo iria brilhar nos desfiles de carnaval, enquanto Antonio tomaria conta dele lá de cima, brilhando com as estrelas.
Um texto de Eva Ibrahim.
Aqui termina “ESTAÇÃO SOLIDÃO”, a história de Antonio e o mistério da pedra amarela, que jamais será desvendado.


sexta-feira, 22 de novembro de 2013

"O CONFLITO NÃO É ENTRE O BEM E O MAL, MAS ENTRE O CONHECIMENTO E A IGNORÂNCIA" BUDA--- A ESTRADA VAI ALÉM DO QUE SE VÊ. EVA IBRAHIM.


                             
                                        A RECLUSÃO
                                        CAPÍTULO 14
      Os dias passavam lentamente para Antonio, que tinha pressa de ver seu dedo cicatrizado. Finalmente, após dois meses a ferida fechou e o homem estava ansioso para retornar aquela mata e encontrar a cobra para acabar com a vida dela. Desta vez iria preparado com um facão bem afiado, para cortar a cabeça da causadora de tanta dor e da deformidade de seu dedo. O dedo de Antonio perdera o movimento, pois a lesão atingiu o nervo; o médico disse que ele tivera muita sorte, pois poderia ter morrido.
       Não gostava de fazer amizades, mas, o Jofre foi quem o socorreu e ele era um bom contador de histórias, por isso ele o convidou para acompanhá-lo na nova caminhada pela mata. Ouvindo as histórias de Jofre, Antonio se esquecia da maldição da pedra amarela e conseguia sorrir. O homem desejava retornar ao lugar onde ficava à nascente de águas e talvez encontrar a cobra novamente, queria surpreendê-la, como foi surpreendido. Era uma aventura programada por dois homens, que agora já estavam experientes e atentos; qualquer barulho estranho, os dois paravam e vistoriavam o local.
      O lugar estava cheio de cobras, eles viram duas se esgueirando pela mata, porém, não puderam alcançá-las. A trilha aberta por Antonio estava quase fechada e os dois homens tiveram que limpar os galhos que haviam crescido no local. Com o caminho aberto eles chegaram rapidamente até a gruta e saciaram a sede com a água fresca. Depois se sentaram nas pedras e ficaram olhando as aves e os bichos que viviam ali. O lugar era lindo e os dois amigos prometeram voltar outras vezes. O Sol se punha no horizonte quando Antonio e Jofre voltaram para suas casas. Finalmente Antonio desistira de matar a cobra, porque ele entendeu que ele fora o agressor e ela somente se defendeu.
        Os passeios na mata e as pescarias no rio da região tornaram-se rotina na vida dos dois homens. Eles se despediam no portão, pois Antonio não queria que seu amigo entrasse em sua residência. Bernardo continuava na casa protegido dos olhares curiosos das pessoas; o Lobo atacava quem tentasse adentrar o quintal da casa.  E, assim o tempo corria sem novidades. Antonio, Bernardo e o Lobo viviam tranquilamente, longe de tudo e de todos os conhecidos, que um dia fizeram parte da vida de Antonio.
        Certo dia, Antonio acordou com o barulho de palmas em seu portão, assustado levantou-se e foi ver quem era. O filho de Jofre estava ali, parado e com os olhos cheios de lágrimas. Ele gaguejou e começou a chorar. Antonio perguntou o que estava acontecendo e ele disse que seu pai sofrera um acidente fatal durante a tempestade da noite anterior.
         Com a surpresa desagradável Antonio ficou mudo; não podia acreditar que mais uma vez a maldição da pedra amarela estava atingindo pessoas de quem ele gostava. Sentia-se culpado, deveria ter mantido distância do homem e provavelmente ele ainda estaria vivo.
       Acompanhou o rapaz até o necrotério onde se inteirou dos fatos. Jofre havia ido até a cidade do Rio de Janeiro fazer compras para a mercearia e na volta foi atingido por um deslizamento de terra, que soterrou seu automóvel, matando-o.
      Antonio acompanhou o enterro do amigo e em silêncio voltou para sua casa; estava deprimido. Seu único consolo era o Bernardo que ouvia seus lamentos. Estava sozinho novamente; era sua sina, viver na solidão.            
Um texto de Eva Ibrahim.
Continua na próxima semana.   

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

"SOBRE AS ASAS DO TEMPO A TRISTEZA VAI SE EMBORA" LA FONTAINE-- O IMPORTANTE É ATRAVESSAR OS SEUS DESERTOS. EVA IBRAHIM.

                            DIAS TERRÍVEIS
                             CAPÍTULO 13
A dor era lancinante e subia pelo braço; parecia que havia uma faca espetada no seu dedo polegar. Chegou da mata rapidamente, o tanto que sua canseira permitiu e foi lavar a mão desesperadamente, depois tirou a roupa que usava e saiu atrás do dono da mercearia. Jofre, o comerciante, ficou muito assustado ao ver os dois furos da picada da cobra na mão de Antonio.
Indagou que tipo de cobra fizera aquele estrago e ele não sabia dizer. Quando jogou a cobra para longe viu que era grossa como um cano de água e tinha uma variação de marrom em seu corpo. Não vira mais nada, a dor parecia cegá-lo, precisava de ajuda. Jofre pediu ao filho para tomar conta da venda e levou o conhecido para o Pronto Socorro, era caso de urgência.
O médico que o atendeu disse que poderia ser muito grave e como não sabia o tipo de cobra que o havia picado, ele tomaria o soro antiofídico polivalente e ficaria em observação para acompanhar a evolução do quadro. Com um olhar sério e penetrante, o velho médico, lhe disse:
 - Há casos de picadas de cobras que deixam aleijões horríveis no local da picada, esperamos que não seja o seu caso. Depois disse que Antonio ficaria internado para observação até o dia seguinte ou poderia morrer sozinho.
A contra gosto foi colocado em uma maca com o braço elevado e orientado a ficar em repouso absoluto. O homem sentiu medo e concordou em ficar ali até o dia seguinte. Jofre saiu dizendo que voltaria no outro dia.
Antonio não se conformava com a situação em que se encontrava, a única explicação que vinha a sua cabeça era a perseguição da pedra amarela. Era um homem marcado pela desgraça e nada poderia fazer. Se conseguisse encontrar a tal pedra, a levaria para a represa de onde foi retirada.
Foi uma noite de muitos pesadelos e aflições; sentia muita dor e a picada da cobra parecia se repetir o tempo todo. Despertou com o rosto inchado e mal conseguia abrir os olhos, sentia-se mal, o dedo latejando e vermelho; o veneno era potente, não havia dúvidas.
O Doutor chegou e perguntou se havia feito xixi e Antonio disse que não. O velho médico, muito sério, disse que ele só seria liberado após a primeira micção e o resultado dos exames. Não deixaram ele se levantar e depois do xixi no papagaio ele foi tranquilizado; sua urina não continha sangue, era um bom sinal.
 No horário de visitas o Jofre chegou para vê-lo e Antonio queria ir embora. Insistiu muito e o médico concordou desde que ele permanecesse em repouso durante três dias e depois retornasse ao Hospital para nova avaliação.
Agradeceu ao novo amigo e adentrou à sua casa, precisava dar comida ao Lobo e ver como o Bernardo estava. Olhou no espelho e não se reconheceu, estava muito inchado, barbudo e fedido. Daquela vez, a pedra amarela quase o matou, foi por pouco. Entrou debaixo do chuveiro, precisava se livrar daquele cheiro horrível de mato misturado com Hospital. Deu comida ao Lobo e foi deitar-se, estava muito fraco.
Em três dias ele ainda estava mal, o corpo dolorido e o dedo vermelho e muito inchado. O retorno ao médico foi preocupante; seu dedo desenvolvera uma celulite no local da picada e poderia piorar ainda mais, disse o médico receitando antibióticos.
Antonio estava travado pelos últimos acontecimentos, mal conseguia andar dentro da casa, seu consolo era Bernardo, que ouvia suas queixas e reclamações.
Depois de uma semana ele saiu para comprar comida no empório do Jofre, que era a única relação que mantinha com o mundo fora de sua casa. Comprou o que precisava e tratou de voltar para sua casa, ainda estava debilitado.
Deitado na rede juntamente com Bernardo, o homem olhava as estrelas e se perguntava por que acontecera aquilo com ele? Esperava que seu dedo melhorasse e que dias melhores viessem, porque aqueles foram terríveis.
Um texto de Eva Ibrahim.
Continua na próxima semana.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

"NÃO HÁ NENHUMA ÁRVORE QUE O VENTO NÃO TENHA SACUDIDO". PROVÉRBIO HINDU--- AS VEZES BASTA VALER A PENA. EVA IBRAHIM.

                   ADENTRANDO À MATA.
                           CAPÍTULO 12
         Deixou a casa com alguns móveis para Flora e se mandou com o boneco, o Lobo e algumas coisas de uso pessoal. Na carta que deixou sobre a mesa  da cozinha, dizia que o aluguel estava pago por três meses e ela estava livre e ele também. Gostava dela e do menino, mas preferia ficar sozinho.
          A mulher não entendeu nada, mas teve que aceitar, ele não deixara endereço com ninguém; não queria ser encontrado.
         A sua vida começava naquele dia, seu passado estava enterrado, respirou profundamente e adentrou à nova casa com a mala e uma mochila nas mãos. O cachorro, a cama, o fogão e alguns utensílios domésticos ele trouxera no dia anterior com um caminhão de aluguel. Colocou a mala sobre a cama e tirou o Bernardo dali, dizendo que nunca mais ele teria que ficar preso na mala, pois, aquela era sua casa.
          No dia seguinte, tratou de sair para comprar comida e conhecer a vizinhança. O dia foi cheio de compras: móveis usados, televisão, geladeira, sofá, mesa, cadeiras e uma rede para colocar na área dos fundos. O homem estava contente e sorriu abraçado ao Bernardo, antes de se deitar para dormir.
         Durante uma semana, Antonio teve muito trabalho para organizar sua casa e finalmente estava tudo como ele desejava. Á noite ele e o Bernardo cismavam deitados na rede, o que fazia o homem pensar em sua vida. Pensou em Verônica, no acidente e depois franziu a testa lembrando-se da pedra amarela. Agarrou-se ao Bernardo e olhou para o céu agradecendo a Deus pela felicidade que estava sentindo. Agora, ele vivia pertinho do céu e podia ver muitas estrelas brilhando; a paz daquele lugar o deixava extasiado.
        Decorridos trinta dias que ele chegara à nova moradia, resolveu adentrar a mata que ficava nos fundos de sua casa; queria conhecer o local. O dono do armazém lhe dissera que por aquelas bandas havia uma bica de águas, que descia da montanha visualizada no horizonte. Pouca gente sabia da existência daquela água pura, pois o acesso era difícil e perigoso. E, no rio que cortava a mata havia muitas cobras venenosas.
         Porém, a curiosidade de Antonio foi maior que o falatório das pessoas da região, ele queria saber o que havia no fundo do seu quintal e se preparou para aquela aventura; tinha tudo planejado. Ainda estava escuro quando o homem com uma mochila nas costas e um facão nas mãos, foi em direção à mata.
        Antonio vestia roupas grossas e botas de cano alto para se proteger das cobras e dos galhos das árvores; estava precavido. Lentamente abria caminho com o facão e com muita persistência batia firme nos troncos das árvores; o mato era alto, cerrado e cheio de insetos e aracnídeos. A formação de árvores era densa e úmida, parte do que sobrou da Mata Atlântica, a antiga floresta do litoral brasileiro. Raramente algum caçador se aventurava a ir para aqueles lados, havia histórias de onças e cobras venenosas naquele local. O dono do armazém garantiu que ali, no meio da mata, havia uma nascente de águas.
      A temperatura passava dos trinta graus e não havia o que matasse a sede; Antonio bebia avidamente cada gole da água que levara. Muitas vezes pensou em voltar, mas algo o fazia seguir em frente. Seguia lentamente, pois cada metro percorrido era conseguido com muita força nos braços, que chegava a latejar.
         Antonio parou para descansar e viu um tronco de árvore que parecia um banco e sentou-se para comer um lanche que trouxera na mochila, já passava das onze horas da manhã.
         O Sol abrasador castigava a região, havia um alerta geral, só faltava surgir algum incêndio; o homem sentiu medo. O lugar era cheio de sons estranhos; “Os sons da mata” Ele já ouvira falar sobre isso, mas se sentia inseguro; era tudo muito grande e sombrio; seus ouvidos estavam aguçados. Era um piar aqui, outro acolá, um farfalhar de galhos, bandos de pássaros voando e outros sons não identificados. Nunca fora covarde e agora estava testando sua coragem, pensou apreensivo.
         Por entre as árvores, o Sol brilhava forte e ele tinha percorrido apenas dois quilômetros, o esforço fora grande. Os cipós, as árvores de pequeno porte e outras vegetações formavam uma cortina, impedindo a passagem do homem. Aos poucos ia vencendo a mata virgem. Quando o Sol já estava alto, chegou á uma pequena clareira de onde viu uma montanha com formação rochosa.
         Ao pé da montanha havia um vale com muitas árvores, era um bom sinal, a mina de água poderia estar ali. Seguiu em frente e lá em baixo encontrou um veio de água; a mina estava perto, tinha que procurar. Rodeou a rocha seguindo o rastro da água e encontrou a nascente dentro de uma gruta. Com uma folha de seringueira improvisou uma concha para pegar água e beber até saciar a sede; estava contente, achara um “Oásis”.
         O lugar era fresco e a mata verde; encontrou alguns bichos, aves e insetos. Havia muita vida no meio da mata em função da água que ali corria. Era pequena a quantidade de água que escorria da montanha por causa da seca, mas estava ali e era o que importava. Teria que voltar, já passava das três horas da tarde, temia que escurecesse e ele tivesse que pernoitar na mata; sentiu um arrepio que percorreu seu corpo.
Antonio estava muito cansado, não estava acostumado com serviço tão pesado; seus braços pareciam pesar toneladas. Ele seguia o caminho inverso, mas, assim mesmo, tinha que usar o facão e quando pegou em um galho para cortá-lo sentiu uma dor intensa na mão esquerda. Ele agarrara uma cobra, que estava enrolada no galho. Instintivamente jogou a cobra para bem longe. E, com a mão doendo muito, apertou até sangrar, para o veneno sair. Desesperado e sem saber se aquela cobra era venenosa ou não, Antonio seguiu em frente com a certeza que aquele fato estava relacionado com a maldição da pedra amarela.
        Um texto de Eva Ibrahim.

        Continua na próxima semana.

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

"JÁ QUE É PRECISO ACEITAR A VIDA, QUE SEJA ENTÃO, CORAJOSAMENTE". LYGIA FAGUNDES TELES-- FAÇA DO PRESENTE SUA ALEGRIA. EVA IBRAHIM

              POR MAL TRAÇADAS LINHAS...
                                 Capítulo 11
        O Antonio do escritório, o viúvo de Verônica, queria ficar com a moça em troca de seus carinhos; era homem e sentia seu sangue ferver quanto o corpo de Flora roçava no seu. Porém, o Antonio solitário, o pai de Bernardo, queria sua privacidade de volta. Todos os dias ele se perguntava como poderia se desvencilhar da situação em que estava metido. O homem vivia uma contradição, no momento em que tinha Flora em seus braços sentia-se satisfeito, logo depois, crescia em seu íntimo uma revolta e ele desejava que ela desaparecesse dali; queria ficar só. Era uma luta interior que Antonio não deixava transparecer. A moça, entretanto, sentia-se a nova dona da casa.
         Vinícius caiu da bicicleta e fraturou o braço, deixando o homem apreensivo; ele temia a volta da maldição da pedra amarela. Antonio tinha pesadelos com Verônica que o acusava de traição e com Vinicius, que ele temia ser a próxima vítima da pedra amarela; teria que afastá-los dali. Gostava da criança e não queria que sofresse qualquer dano.
         A vida corria aparentemente normal, a moça era cuidadosa e companheira. Flora já se acostumara com a nova casa, foi ganhando confiança e queria muito mais do que o homem poderia esperar.
       Certo dia, a moça pediu para Antonio abrir o guarda roupas, que ela iria doar as coisas de Verônica para um asilo, assim teria mais espaço no armário para arrumar suas coisas. O homem gaguejou e quase se afogou com a saliva de tão irado que ficou. Em seguida esbravejou:
       –Ali, ninguém mexe e ponto final. 
       A relação do casal esfriou depois da postura intransigente de Antonio. Ele estava visivelmente insatisfeito com aquela situação; Flora mexia em tudo e ele temia por seu segredo; aprendera a viver sozinho. A moça teria que seguir sua vida e deixa-lo em paz; ela e o filho estavam ali por acaso, não por sua escolha, pensava, revoltado.
Flora lhe dissera que tinha irmãos no interior do Rio de Janeiro e ele pensava em leva-la para lá e mudar de casa para ela nunca mais encontra-lo. Sua aposentadoria estava para sair e ele deixaria tudo preparado para se livrar dela e do menino.
       Demorou mais três meses, que para ele parecia uma eternidade, mas a notícia de sua aposentadoria saiu e ele pulou de alegria; tinha planos para ele, o Bernardo e o Lobo. Tivera bons momentos com Flora, mas o medo de ser descoberto em seu segredo estragara o prazer de uma vida a dois. Antonio sabia que a mulher era curiosa e algum dia abriria a porta do guarda roupas; era um risco iminente.
        Com muito jeito, ele convenceu a moça a fazer uma visita aos seus parentes. A cunhada de Flora dera a luz recentemente e estava com problemas de saúde; depressão pós-parto diagnosticara o médico.
         Júlio, o irmão de Flora, telefonara pedindo a ajuda da irmã; sua mulher estava doida, dissera o rapaz. Lorena estava sentada na poltrona com a filha recém-nascida no colo, no quarto da maternidade e Júlio, seu marido, em pé olhando o bebê. A enfermeira entrou e perguntou à moça se não iria amamentar a filha e a resposta foi muito estranha.
- Trás a criança que eu amamento, disse Lorena. A enfermeira, surpresa, afirmou que a criança estava em seus braços e a resposta foi chocante:
          - Essa aqui é só uma foto, trás a criança. O marido, espantado, pediu para segurar a foto e tirou a filha dali, sua esposa não estava bem.
          O médico foi chamado e constatou um surto psicótico. Em seguida, Lorena recebeu um sedativo e foi levada dali. Júlio não sabia o que fazer e quando o médico disse que Lorena permaneceria internada e a criança teria alta, o rapaz entrou em desespero.
         - O que ele faria com o bebê?  Estava sozinho e não poderia cuidar da criança. Então, pensou em pedir a ajuda de Flora, sua irmã, depois pensaria em outra solução.
Antonio vislumbrou uma saída para seu drama, incentivou a moça a pedir férias do serviço e passar alguns dias na casa do irmão, até sua cunhada melhorar. Flora não pode recusar e acertou sua permanência na casa do irmão.
O homem tratou de levar, rapidamente, a mulher e a criança para a casa do irmão dela e foi ver uma casa de aluguel em Petrópolis. Pretendia por em prática o plano que criara para se livrar de Flora e seu filho.
O plano era perfeito, nem sua irmã Nalva poderia saber onde ele estava; queria privacidade total. Sentiu pena da irmã, gostava dela, porém, cortaria relações com o mundo todo para ter privacidade.
A casa ficava no alto da montanha, era isolada das outras, tinha um quintal grande e no fundo um resto da floresta que um dia existira ali. A vista era ótima, ficava pertinho do céu e bem na periferia da cidade, era tudo o que ele almejara. Antonio precisava de apenas uma semana para por em prática seu plano.
Um texto de Eva Ibrahim.
Continua na próxima semana.
MEU MUNDO REINVENTADO.

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