A
MAGRELA
CAPÍTULO
NOVE
Benjamim foi para o quarto que
dividia com seu irmão Rui. Um quarto com piso de tijolos e sem forro, tinha duas
camas de ferro antigas, com colchões de palhas de milho secas colocados sobre
as mesmas. Travesseiros feitos com penas de galinhas, abatidas no quintal para
comer.
Uma casa grande e arejada, não
tinha forro em nenhum cômodo, nem vidraças, apenas janelas de madeira com
tramelas e portas com trancas. No calor era uma beleza, a brisa quente inundava
o ambiente, deixando seus moradores relaxados.
Entretanto, no inverno se igualava a uma
geladeira, onde somente do fogão a lenha emanava um pouco de calor no ambiente.
Os bichanos se encolhiam perto dos braseiros em cima do fogão e os cães
deitavam no chão ao lado do mesmo.
Tudo muito simples, afinal era um sítio de
agricultura familiar de subsistência. Ali havia uma criação de galinhas, porcos,
vacas leiteiras e animais para uso próprios, era a década de sessenta.
O paciente deveria fazer repouso e
ficar dentro da casa, para não contaminar a lesão e não correr risco de cair e
complicar a sua situação. A perna fora engessada para ficar imóvel, com uma
abertura para o curativo. O gesso era muito pesado e o menino evitava
levantar-se.
O terreno, no pequeno sítio, era totalmente
irregular, altos e baixos, pedras, pedregulhos, pedaços de tijolos, morros,
buracos e moitas de capins em meio a terra de chão batido em toda a extensão ao
redor da casa. Era impossível andar de muletas sem correr riscos. Apesar de
todas as restrições, o menino estava alegre e feliz por estar de volta à sua
casa.
A mãe fazia todas as suas vontades e os irmãos
também, isso porque ele estava se recuperando de um grave acidente. Teresa
arrumou todos os apetrechos do curativo, para uma vizinha cuidar do ferimento
da perna fraturada.
Bibiana era tida como uma boa curandeira
da região, além de benzer crianças e adultos, ela fazia partos e todos os tipos
de curativos rudimentares, que havia por ali. Assim, Benjamim parecia
conformado em ficar dentro da casa.
Às vezes, jogava dominó ou damas
com Rui ou Marília. E, para sua distração, quando estava só, ele tinha uma vitrola
e alguns discos de vinil. Tinha também, um rádio antigo de bateria para ouvir, ou
passava o tempo lendo os livros que trouxera consigo do hospital.
Alguns dias se passaram e Benjamim
saíra de casa somente uma vez, de carroça com seu pai para ir até a vila. Dirceu
queria alegrar o filho, que andava tristonho. No entanto, quando voltou,
Benjamim sentia-se muito mal, pois os sacolejos na estrada irregular de terras,
provocara dores em sua perna fraturada. Sendo assim, o menino ficaria dentro da
casa até seu retorno ao hospital, decidiu seu pai.
E, na véspera do Natal a família
recebeu uma visita. Antonio, irmão de
Teresa, apareceu inesperadamente. Ele morava em outro estado e raramente via a
família da irmã. Na verdade, nem ficara sabendo do acidente do afilhado; o tio
era padrinho de Benjamim.
Antonio
possuía um caminhão pequeno, que transportava materiais de construção para uma
Olaria da região. Estivera na cidade vizinha para fazer uma entrega e
aproveitara para passar na casa de Teresa. O filho de Antonio já estava moço, então,
ele trouxera a bicicleta que era do rapaz e estava num canto sem utilidade,
para doar aos filhos da irmã.
Para
os sobrinhos, a bicicleta era um sonho, eles nunca esperavam ganhar uma, pois
não tinham condições financeiras para isso. Os olhos de Benjamim se encheram de
lágrimas, ele não poderia desfrutar do presente.
Rui
e Marília correram para o terreiro de café com a Magrela. Esse era o nome da
bicicleta, dissera Antonio. Aquele era um lugar amplo e calçado de tijolos,
para experimentar a bicicleta.
Benjamim ficou olhando pela janela da cozinha.
Viu as quedas e as risadas dos irmãos e sua tristeza aumentou. Rui tinha mais
equilíbrio, enquanto Marília caia toda vez que tentava se equilibrar.
O menino voltou para o quarto e não jantou naquela noite, estava sentindo-se aniquilado.
Não poderia ficar parado olhando seus irmãos andarem de bicicleta. Ainda não
tinha ido ver o seu cavalo Corisco, sabia que ficaria chorando o resto do dia.
Estava triste e precisava mudar a situação, também era dono da Magrela.
Depois
que todos adormeceram, ele pegou suas muletas e foi até o rancho para ver a
bicicleta, levando em suas mãos uma lamparina de carbureto. Lentamente ele
ganhava terreno; por duas vezes quase caiu, mas seguiu em frente. Finalmente
estava junto dela, era sua também e não abriria mão disso.
Um texto de Eva Ibrahim Sousa
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