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sábado, 5 de julho de 2014

"...QUE MINHA SOLIDÃO ME SIRVA DE COMPANHIA. QUE EU TENHA A CORAGEM DE ME ENFRENTAR. QUE EU SAIBA FICAR COM O NADA E MESMO ASSIM, ME SENTIR COMO SE ESTIVESSE PLENA DE TUDO." CLARICE LISPECTOR. A MORTE É UM MISTÉRIO.. EVAIBRAHIM

ADEUS AO PAI

CAPÍTULO OITO

       Sandro crescia com saúde, estava acostumado com a escuridão; aceitava a situação e procurava aguçar os outros sentidos. Aprendera a tocar órgão e sentia-se feliz. O menino tinha ouvido apurado e talento musical. O padre Guima arranjou um lugar para ele tocar na Igreja ao lado da organista da paróquia. Gilda era a sombra do menino, cuidava e protegia o filho de todas as maneiras; Sofia também ajudava em tudo que fosse necessário.

       Porém, Danilo estava cada dia mais deprimido e se afogava na bebida; perdera o gosto de viver. Quando chegava à sua casa, tarde da noite e bêbado, acusava Gilda da cegueira do filho, depois deitava e dormia. Não era um homem mau, apenas não se recuperara do acidente do filho; ele se dizia acovardado. Trabalhava para sustentar sua família e nas horas de folga bebia muito.
        Quando Sandro estava com treze anos Danilo adoeceu e foi hospitalizado. Estava com cirrose hepática em estado avançado, era um caso irreversível, dissera o médico. Depois de alguns dias internado, Danilo faleceu. 
       Gilda se desesperou e foi saber por que o marido se fora tão rapidamente; era jovem demais para morrer. O médico foi categórico em afirmar que seu fígado não aguentara tanta bebida e a consequência fora à morte. 
      O padre Guima ajudou Gilda com os funerais e a consolou; gostava daquela família, que fora marcada com um fato tão terrível, o acidente que causou a cegueira do menino. Depois ele explicou à Gilda que muitas pessoas quando sofrem algum tipo de perda se fecham e perdem também o rumo. Ficam deprimidas e começam a beber, depois se isolam do mundo e chegam ao fundo do poço; então, desistem de viver. A morte ocorre por suicídio ou de forma natural, isto é, em consequência da agressão imposta ao organismo, como foi o caso de Danilo.

       A mulher estava viúva, não sabia descrever como se sentiu diante daquela notícia tão dolorosa e como poderia agir diante do filho, que agora teria privada sua convivência com o pai. Danilo, apesar de tudo, sempre procurou dar carinho ao filho e fazer suas vontades. Seria mais uma perda irreparável imposta ao menino, que já tinha sofrido muito com sua cegueira.

       Gilda teria que compensá-lo de alguma maneira, contava com Sofia ao seu lado para minimizar a ausência do pai. O menino chorou e ficou abatido por vários dias, gostava do pai e não entendia por que ele morreu. Gilda tentava suprir a falta de Danilo dando toda a assistência que podia ao filho.

      O tempo passava rápido, Sandro com dezoito anos de idade se formou no segundo grau e ganhou um acordeão de sua mãe; o rapaz ficou muito feliz. Rapidamente aprendeu a tocar o instrumento e foi convidado a tocar em uma Banda, que se apresentava na noite. Depois estenderam suas apresentações para festas de casamentos e Bailes de Debutantes. Sandro se entrosou rapidamente e passou a faturar um bom dinheiro com seu trabalho. Tornara-se um homem interessante e de gosto apurado.

     – Ganhava seu sustento e poderia se casar, não estava morto, tinha sentimentos e queria companhia. Todos os seus amigos tinham mulher ou namorada, ele também queria ter um amor, dizia Sandro para sua mãe.

      Era um rapaz bonito e inteligente; apareceram algumas moças interessadas nele, porém, Gilda as afastava do filho. Dizia que eram interesseiras e que ele se casaria com uma moça igual a ele. Assim, não haveria perigo de ser traído.

     A mulher recebia a pensão do marido e vendia as tapeçarias que fazia juntamente com a Sofia. O filho ganhava seu dinheiro tocando na banda com os amigos; era o que gostava de fazer. Entretanto, Sandro era ambicioso e queria aprender a tocar piano e músicas clássicas; demonstrava muito orgulho quando dizia que era músico. Na verdade, ele descobriu a música e nela se descobriu; foi o que o ajudou a superar a falta de visão.

     Gilda procurou um Conservatório de músicas onde houvesse partituras em braile, para que ele recebesse as aulas necessárias. O Conservatório ficava na cidade vizinha e a mãe ou Sofia o acompanhavam à escola. Passados dois meses, ele queria viajar sozinho, aprendera a viajar de ônibus. E, fazia questão de demonstrar independência, que podia e sabia andar sozinho com sua bengala.

      Nas primeiras vezes, Gilda fingia que não ia e o seguia para ter a certeza que nenhum mal lhe aconteceria. Com o tempo ela foi deixando que Sandro fosse sozinho, ele era esperto e a escola ficava em frente à parada de ônibus. O motorista e o cobrador sempre o ajudavam e assim ele sentia-se seguro.   
  
      Sandro gostava de frequentar o Conservatório, ficava eufórico no dia em que tinha aulas; fazia questão de estar vestido impecavelmente. Gilda e Sofia ficaram desconfiadas de que havia algo mais naquela escola. Gilda o acompanharia de longe, para assuntar o motivo de tanta euforia.

Um texto de Eva Ibrahim.

Continua na próxima semana.

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