MOSTRAR VISUALIZAÇÕES DE PÁGINAS

quarta-feira, 15 de maio de 2019

"ROMARIA" (...) "ME DISSERAM, PORÉM, QUE EU VIESSE AQUI. PRA PEDIR EM ROMARIA E PRECE, PAZ NOS DESAVENTOS. COMO EU NÃO SEI REZAR, SÓ QUERIA MOSTRAR MEU OLHAR, MEU OLHAR, MEU OLHAR." RENATO TEIXEIRA

ROGAI POR NÓS

CAPÍTULO CINCO
           Marcelo encostou o automóvel em uma pracinha e retribuiu o beijo. Este foi diretamente na boca de Angel; eles já estavam prontos para trocar carícias. Brotava, naquele momento, um sentimento de amor, que vinha sendo germinado desde o dia, em que se encontraram no P.S.

Ficaram ali se entreolhando e trocando beijos durante algum tempo, depois saíram em direção à casa de Angel. Ela desceu do veículo, estava andando nas nuvens, lhe faltava o chão firme. Estava emocionada com a chegada do primeiro amor; um sentimento que surgia forte e promissor.

A menina se mostrava ansiosa para a chegada do domingo de manhã, porque seguiriam para a cidade de Aparecida do Norte, no vale do Paraíba. Estava eufórica para a viagem com os pais de Marcelo. Uma visita de agradecimentos à santa de devoção dos peões de boiadeiro, de quem agora ela, também, se tornara devota.

             Ainda estava escuro, quando a caminhonete encostou para levar mãe e filha para a viagem programada. Marcelo estava sentado no banco da frente com seu pai e atrás iam as três mulheres. A mãe do rapaz, Olga e Angel, estavam alegres e conversavam amistosamente.

             Após uma parada para esticar as pernas e tomar um café, a viagem alcançava seu destino. Ainda estavam na entrada, quando avistaram a Basílica, altiva e imponente. O pai parou o veículo e todos desceram para apreciar a paisagem maravilhosa. Uma vista única, onde o destaque era a imensa Basílica de Aparecida. Situada em um plano elevado e tendo a cidade aos seus pés, com toda a estrutura de estacionamentos ao redor de sua sede, parecia reinar e abençoar toda a região.

             Extasiados, seguiram viagem e entraram na cidade, que tem seu comércio todo voltado para os romeiros e turistas que visitam o santuário. Aos domingos, desde as primeiras horas da madrugada, os visitantes começam a chegar em ônibus e, aos poucos tomam conta de todas as ruas e estacionamentos existentes por ali.

             O Sol apareceu dando brilho a fachada da Basílica e anunciando um domingo luminoso. Os novos romeiros seguiram a pé as escadarias da igreja. Entraram e se surpreenderam com a quantidade de pessoas que havia lá dentro. Uma multidão pronta para assistir à missa das dez horas e render homenagens à santa.

             O tempo passou rápido, envolvido pelos cânticos e louvores à Nossa Senhora; um clima de amor e paz reinava entre os fiéis. Uma fila enorme se formou, para receber a comunhão das mãos do bispo e padres, que entregavam a hóstia aos comungantes.

           Quando a missa terminou, a fila se formou em frente a imagem original da santa, aquela que foi encontrada pelos pescadores no rio Paraíba do Sul, no Estado de São Paulo em 1717. Exposta em um nicho dourado na parte alta da igreja e protegida por vidros blindados, era o foco principal de todos os romeiros. Cada um se ajoelhava e rezava à virgem, em agradecimento por graças recebidas ou até por um pedido urgente e necessário.

            A imagem original da Santa, que ficava exposta no altar, sofreu um ataque, que a despedaçou e teve que ser restaurada. Depois desse fato, a imagem só pode ser contemplada, mas não pode ser tocada.

             Depois do grupo se ajoelhar diante da imagem, em agradecimento aos livramentos recebidos, foram até a sala de milagres. Um verdadeiro arsenal de velas, partes do corpo humano confeccionados pelos mais variados materiais, lembranças de todos os tipos e vindas de todas as partes do país, testemunham a fé e os milagres recebidos.

             Marcelo e Angel se deslocavam mais rapidamente que seus pais e ele a levou a uma barraca de lembranças de Aparecida. Lá ele escolheu uma corrente com medalha da santa e deu de presente à Angel. Disse que era para protege-la de qualquer mal que se aproximasse. Ela sorriu e colocou no pescoço, depois o beijou na boca.

            No entanto, teriam que levá-la para ser benzida e o casal voltou à igreja, enquanto os pais ficavam descansando em uma lanchonete. Procuraram um padre e a medalha foi benzida com água benta e colocada novamente no pescoço da menina.

             Angel estava orgulhosa do presente recebido e ostentava em seu colo a imagem da santa, estava feliz da vida. Almoçaram na lanchonete e ao adentrar o veículo, todos olharam para trás e pediram.

          - Rogai por nós, Santa Mãe de Deus!

E, seguiram a viagem de volta, envolvidos por sentimentos de amor e paz, depois de um dia de devoção e muita fé.  
    
 Um texto de Eva Ibrahim Sousa

quarta-feira, 8 de maio de 2019

"ROMARIA" (...) SOU CAIPIRA PIRAPORA NOSSA, SENHORA DE APARECIDA, ILUMINA A MINA ESCURA E FUNDA O TREM DA MINHA VIDA. SOU CAIPIRA PIRAPORA NOSSA, SENHORA DE APARECIDA. ILUMINA A MINA ESCURA E FUNDA O TREM DA MINHA VIDA". (...) RENATO TEIXEIRA

CONVERSA VAI, CONVERSA VEM

CAPÍTULO QUATRO
            Marcelo reclamava de dores de cabeça o tempo todo, apesar dos remédios administrados pela equipe de enfermagem. Foram realizados novos exames de imagem e nada foi encontrado de mais grave. No entanto, o impacto do coice abriu uma lesão, que deixou o osso da calota craniana a mostra e ali era o ponto frágil da dor relatada. Nesse local havia dois pontos inflamados e dolorosos.

               A lesão fora costurada pelo cirurgião plástico, porque o corte chegava até bem perto da sobrancelha. A queixa era natural, dizia o médico, temos que aguardar os efeitos dos antibióticos e mantê-lo em observação.

           Após doze dias da ocorrência, Marcelo recebeu alta hospitalar, estava relativamente bem. Havia cumprido o tempo de antibióticos prescritos e poderia convalescer em sua casa. O rapaz que era moreno queimado de Sol, estava pálido e fraco ao se levantar. Angel estava ali para ampará-lo, depois de todos aqueles dias de internação e com as visitas frequentes da moça, tornaram-se amigos.

            Passaram-se mais alguns dias, sem que Angel se encontrasse com Marcelo. E, grande foi seu espanto, quando ele foi até sua casa.

                - Precisamos conversar, disse com um largo sorriso.   

            Angel ficou muito feliz ao vê-lo fora do hospital, ele estava bonito, mas um pouco abatido e a cicatriz recente na testa o deixava vulnerável. Então, ela disse:
               - Sim, vamos entrar, minha mãe vai gostar de vê-lo bem. O rapaz desceu do automóvel e entrou pelos fundos da casa, onde a mãe estava lavando roupas.

                – Olha mãe, quem está aqui? A filha falou sorrindo.

            Olga cumprimentou o rapaz se desculpando pelas mãos molhadas. Entraram e, ela se dispôs a fazer um café para a visita inesperada. O rapaz protestou, mas de nada adiantou e sentaram se à mesa para conversar.

              Marcelo estava um pouco acanhado, mas, assim mesmo começou a falar:

             - No domingo, meus pais querem ir á Basílica de Aparecida agradecer pelo meu livramento e eu queria convidar Angel e a senhora também, para nos acompanhar. A caminhonete é grande e podemos viajar confortavelmente, durante os trezentos quilômetros que nos separam.

              A mulher pensou rápido, seria a realização de um sonho, fazia tempos, desejava conhecer aquele lugar. Mas, deveria conversar com o marido, antes de aceitar. Angel fazia que sim com a cabeça, estava ansiosa e Olga respondeu:

               - Estou lisonjeada pela sua lembrança, mas eu preciso falar com o meu marido, antes de confirmar com vocês.

              - Está bem, eu aguardo, mas faça uma força, pois Angel também deve agradecer por estar bem. Depois, levantou-se e saiu acompanhado da menina. Havia uma atração evidente entre eles.

              - Quer dar uma volta de carro? Voltamos logo, disse Marcelo.

            – Sim, vou avisar minha mãe. Angel correu para dentro.

               Em seguida, saíram no automóvel de Marcelo, estavam alegres, eram jovens e prontos para viver. Enquanto dirigia ele falou:

            - Este carro eu ganhei como prêmio, na arena do rodeio de Barretos. Foi a noite mais feliz da minha vida, afirmou o rapaz.

              - Verdade? Você não caiu do touro bravo?

              - Caí sim, mas fui eu que permaneci no lombo do animal, durante o maior tempo na prova.

             – Assim que eu puder voltar a montar, vou leva-la para assistir um rodeio importante. A festa do peão de boiadeiros de Barretos, fica no interior do estado de São Paulo. É a maior festa de rodeios do país; todos os peões sonham em vencer naquela arena e ganhar o prêmio máximo. São verdadeiros momentos de glória.

            O rapaz contou o fato emocionado e seus olhos brilharam lindamente; um acontecimento marcante em sua vida.

             - A festividade acontece todos os anos no mês de agosto e arrasta multidões de todo o Brasil e até do estrangeiro. Os eventos de música sertaneja dão o tom artístico na festa. A cidade fica em polvorosa, quando acontecem os eventos, que atravessam a madrugada. Ele concluiu, emocionado.

            Angel ficou agradecida pelas palavras carinhosas dele. E, passou as mãos entorno do seu ombro e o beijou na bochecha. Ele sorriu, estava confortável nos braços dela.

              Um texto de Eva Ibrahim Sousa

quarta-feira, 1 de maio de 2019

"ROMARIA" (...) "O MEU PAI FOI PEÃO, MINHA MÃE, SOLIDÃO. MEUS IRMÃOS PERDERAM-SE NA VIDA, A CUSTA DE AVENTURAS. DESCASEI, JOGUEI, INVESTI, DESISTI. SE HÁ SORTE EU NÃO SEI, NUNCA VI". (...) RENATO TEIXEIRA

COM MUITA FÉ

CAPÍTULO TRÊS
            A tarde chegou e a menina estava eufórica, nunca estivera fazendo visitas em hospitais. Era uma grande novidade e se arrumou com mais afinco. Apesar da dor de cabeça intermitente, que a fazia sentir um pequeno coração na altura da testa, Angel queria rever o rapaz, que estava ferido no hospital.

              Deixou seus cabelos negros e encaracolados soltos ao vento, assim encobria parcialmente o curativo e acentuava sua beleza natural. Ela tinha grandes olhos esverdeados, olhos de camaleão, diziam em sua casa.

            - Cada vez que olho para ela, estão de uma cor diferente. Sua mãe dizia e completava, que eram olhos incisivos e desconcertantes. As vezes eram verdes, outras vezes, cor de mel. Quando sua dona ficava irada, eles escureciam a um tom de marrom escuro, profundo e misterioso. Seus irmãos saiam de perto, pois era sinal de agressividade, na certa. Angel era uma menina brava, mas tinha um bom coração, que fora tocado pelo acidente de Marcelo.

                Sua mãe arrumou uma sacola com algumas frutas e acompanhou a menina até o hospital. Lá estavam a mãe, o pai e uma irmã do rapaz, esperando para visitá-lo. Pareciam ansiosos e Angel se apresentou, dizendo da sua preocupação com a saúde do rapaz. Depois, mostrou sua cabeça costurada debaixo do curativo e, que estava ali para dar apoio ao colega de desventura. A família do rapaz ficou surpresa e acabaram sorrindo para a moça.

                 - Ele teve muita sorte mesmo, disse o pai de Marcelo. E a mãe completou:       
                     
                - Graças a proteção de Nossa Senhora Aparecida, o nosso menino está vivo. Em seguida, o casal se abraçou, estavam comovidos.

              Quando a porta foi aberta para as visitas, entraram os pais do paciente e depois iriam as duas moças. Celina, a irmã de Marcelo e Angel companheira ocasional do atendimento no pronto socorro. Olga e as duas moças ficaram aguardando a vez. A mãe estava ali apenas para acompanhar a filha, não pretendia atrapalhar as visitas.

                Algum tempo depois, os pais de Marcelo saíram e as duas meninas adentraram ao recinto.
               Celina abraçou seu irmão e seus olhos se encheram de lágrimas, estava emocionada, não conseguia falar; tinha um nó na garganta. Ficou alguns minutos olhando para ele e, depois sentou-se na poltrona dando lugar à Angel.

            A nova amiga chegou perto da cama e pegou nas mãos do rapaz, que continuavam quentes e cheias de calos. Foi somente naquele momento que ela percebeu, que as mãos dele estavam cheias de áreas grossas. Então, o rapaz explicou, orgulhoso.

             - Eu seguro o touro bravo com essas mãos e a força é tamanha, que formam calosidades, pelo atrito com a corda do cabresto.

                Angel sabia pouca coisa sobre peões de boiadeiro, mas, já o admirava como se admira a um herói. Era o homem e o animal, numa luta desconcertante e fora do normal, dentro de uma arena. Uma demonstração de poder humano, perigoso, grotesco e que arrasta multidões em suas apresentações. Os músicos e cantores vestidos à caráter, apresentam verdadeiros shows de músicas sertanejas, depois da contenda dentro das arenas.

              Os palcos são montados ao lado das arenas e as apresentações se estendem até a madrugada. São eventos que tem um poder milionário e turístico, proporcionando progresso aos locais de suas apresentações. Aquele mundo desconhecido a atraia, a ponto de querer ficar por perto do rapaz.

Na mesinha de cabeceira estava uma imagem de Nossa senhora Aparecida, que a mãe do rapaz colocara ali. Angel depositou suas frutas ao lado da imagem. No peito de paciente, que tinha a blusa do pijama aberta, brilhava a medalha da santa, agora limpa e polida.

 - Marcelo está bem protegido, eu também quero uma medalha dessas! Pensou Angel.

              Havia uma certeza de sua recuperação, apesar de todos os exames feitos e a preocupação externada pelos médicos. O coice poderia trazer consequências desastrosas, pois o impacto no cérebro fora grande. No entanto, a confiança e certeza da proteção recebida da santa, os deixavam tranquilos.
              Ali estavam pessoas de muita fé.

Um texto de Eva Ibrahim Sousa

quarta-feira, 24 de abril de 2019

"ROMARIA" (...) SOU CAIPIRA PIRAPORA NOSSA SENHORA DE APARECIDA, ILUMINA A MINA ESCURA E FUNDA O TREM DA MINHA VIDA. SOU CAIPIRA PIRAPORA NOSSA SENHORA DE APARECIDA, ILUMINA A MINA ESCURA E FUNDA O TREM DA MINHA VIDA." (...) RENATO TEIXEIRA

DE MÃOS DADAS

CAPÍTULO DOIS
              Instintivamente, Marcelo estendeu a mão para Angel e, esta retribuiu o gesto segurando na mão do rapaz, que começou a rezar uma Ave Maria, para a Santa de sua devoção. Foi acompanhado pela jovem em sua oração e depois, juntos agradeceram pelo livramento recebido. Em seguida, ele explicou que todo peão de boiadeiro tem devoção à Nossa Senhora Aparecida, que é a protetora de todos eles. E, pelo menos uma vez na vida, devem visitar a Basílica, no Santuário de Aparecida do Norte, no Estado de São Paulo.

        Logo em seguida, outro médico adentrou ao recinto se apresentando e dizendo que os deixaria novos em folha. Olhou os ferimentos e fez uma avaliação preliminar, então deu o veredito. Primeiro a moça, cujo ferimento era menor e mais superficial, enquanto o rapaz teria que ter uma atenção maior, pela gravidade da ferida.

          Trinta minutos e Angel estava liberada e com a receita na mão.  Levantou-se meio zonza e desejou boa sorte ao rapaz, que segundo o médico, ficaria internado no hospital para observação e medicações necessárias. 

            O ferimento de Angel foi suturado com dez pontos, pois foi decorrente do atrito com a quina do muro de cimento. Olga amparou a filha e foram conversando até o táxi.

             – Mãe, o Marcelo levou um coice do seu próprio cavalo e poderia ter morrido. Ele disse que foi a Santa que o salvou, Nossa Senhora Aparecida. Contou a menina, comovida.

            - Sim, dizem que os peões fazem uma oração para a Santa antes de entrarem na arena, em dias de rodeios. Afirmou sua mãe.

             Angel tinha muitas dores nas escoriações sofridas ao cair. Sua cabeça latejava, pois, a anestesia havia passado e parecia ter um coração na testa. Olga deu um analgésico para a filha e apagou a luz do quarto, queria que ela dormisse um pouco.

             Embalada pelo sono provocado pelo remédio forte, dormiu e sonhou com um rodeio, no qual o Marcelo estava no lombo de um touro bravo, que corcoveava sem parar. Em dado momento, ele foi atirado ao chão e o seu chapéu voou longe. Ela correu e o apanhou do chão, então, viu a medalha de nossa senhora pregada no chapéu de Marcelo. Enquanto a plateia aplaudia, o peão era socorrido pelos ajudantes de arena.

            Foi levado à enfermaria do posto médico, ele tinha caído de mal jeito e Angel ficou tremendo de medo que ele tivesse se machucado. A menina acordou assustada, aquilo tudo parecia ser muito real; precisava ver o rapaz.

           Logo pela manhã, ela ligou no hospital para saber se ele estava bem e quando teria alta.

              - Ele ainda está internado e o restante somente o médico poderá lhe responder. O horário de visitas se dará a partir das catorze horas e terá duração de uma hora. Em seguida, a atendente desligou.

            A menina ficou pensativa. Mal conhecia o rapaz e já se importava com ele a ponto de ficar trêmula e preocupada com sua situação. Iria visita-lo para saber se estava bem, ou não poderia relaxar enquanto se recuperava. Não parava de pensar nas mãos quentes do rapaz e na sua devoção à Nossa Senhora Aparecida. 

            Angel precisava vê-lo novamente, disso ela tinha certeza.

Um texto de Eva Ibrahim Sousa

quarta-feira, 17 de abril de 2019

"ROMARIA" "É DE SONHO E DE PÓ O DESTINO DE UM SÓ. FEITO EU PERDIDO EM PENSAMENTOS SOBRE O MEU CAVALO. É DE LAÇO E DE NÓ, DE GIBEIRA OU JILÓ, DESSA VIDA CUMPRIDA A SOL(...)" RENATO TEIXEIRA

NAS RÉDEAS DO JILÓ

O DUQUE
 CAPÍTULO UM
             O domingo amanheceu iluminado com um Sol brilhante, depois de uma semana de chuvas fortes. As casas foram abertas e as mulheres começaram as faxinas, lavando as roupas e enchendo os varais. Muitos rapazes se dispuseram a lavar seus automóveis, motos e até bicicletas. Os passarinhos estavam felizes, pulando de fio em fio ou de galho em galho, caracterizando a chegada da primavera.

               Na casa de Angel, todos estavam empenhados em concluir as tarefas da casa para almoçar. Olga estava no fogão fazendo o almoço e o torresmo cheirava longe. Era a mãe de três filhos adolescentes, Angel, Alcione e Artur. Em dado momento, Olga pediu a filha de 18 anos, que fosse ao supermercado buscar fubá para fazer a polenta.

                – Seu pai vai chegar para almoçar e tudo deve estar pronto, afirmou a mulher.

                A filha tratou de trocar sua roupa e obedecer a mãe, que não aceitaria protestos. Se ela mandasse, era para ser obedecida ou haveria castigo na família. Olga era uma mulher de fibra e muito enérgica, trazia os filhos na rédea curta, dizia sempre. Angel pegou o dinheiro e saiu apressada, estava com um vestido simples e chinelos de borracha. O supermercado era perto, apenas algumas quadras dali. Sendo assim, não havia motivos para grandes enfeites pessoais.

               Naquela rua morava um médico, que trabalhava no posto de saúde local. Era a melhor e mais imponente casa das redondezas. Uma casa grande, com um belo jardim na frente. Na casa havia cinco cachorros da raça Buldogues, todos fortes e bravos. Um deles, o Duque, escapava quando o dono abria o portão para sair e este, que estava sempre apressado, incumbia o jardineiro de capturar o cão. 

            Havia relatos de pessoas que haviam sido atacadas e feridas pelo animal. Quando não conseguiam pegá-lo, ele ficava deitado na calçada fingindo dormir e quando alguém chegava perto, ele corria atrás da pessoa. Algumas se safavam, outras caiam e se machucavam, pois, Duque era um cão assustador: grande, gordo e feio.

                       As pessoas que moravam por ali, cortavam voltas para não passar em frente àquela casa. No entanto, Angel não vislumbrou o cachorro e como estava com pressa, resolveu passar por ali mesmo. Não havia ninguém a vista e ela foi para o outro lado da rua, onde havia um parque infantil. A moça caminhava de olho na casa do médico e não percebeu que o cachorro estava dentro do parquinho, com o portão entreaberto. De repente, o cão saiu correndo e rosnando para cima da menina, que desesperada, começou a correr e gritar.

               A jovem enroscou o chinelo num desnível da calçada e caiu batendo a cabeça no muro de outra casa. O Duque parou assustado e, para sorte dela, ele não a atacou, ficou parado olhando. Em seguida, várias pessoas se aproximaram para acudir a vítima e espantar o cachorro.

            Foi um corre-corre danado e alguém foi avisar a família da menina. Olga, descabelada, apareceu em socorro da filha. Vendo a menina caída no chão, com várias escoriações nas pernas, nos braços e um corte na testa sangrando, atacou o cachorro com pontapés e o pau de macarrão que trazia nas mãos. A mulher estava tão furiosa, que o cachorro também saiu sangrando na cabeça, levado pelo jardineiro. Angel chorava e Olga proferia palavrões se referindo ao cachorro e seu dono.

               Nesse meio tempo alguém chamou a ambulância, que chegou rapidamente para levar a menina ao Pronto Socorro. Chegando lá, havia muita gente esperando a vez e um rapaz estava na sala de emergência sendo atendido. Havia um princípio de tumulto, a maioria discutia reclamando da demora.

            O caso era grave, o rapaz, um peão de boiadeiro, que levara um coice na cabeça. Um ferimento que precisava de mais de vinte pontos, havia uma fenda no couro cabeludo do rapaz. Marcelo voltara do Raio X e estava à espera do médico, para a sutura em sua cabeça. Então, Angel foi colocada na maca ao lado, os dois precisavam de sutura e deveriam esperar outro médico chegar, pois o que estava ali, não poderia deixar toda aquela gente esperando, por mais tempo.

             O casal, que estava com as testas feridas, se entreolharam e ficaram com pena um do outro. Eram dois jovens e um contou a sua história para o outro. Marcelo estava em pior situação, sua cabeça doía fortemente, mas ele bancava o durão. Foi num tropeção que seu cavalo se enfureceu, saiu dando coices e atingiu a cabeça do dono, que tentava pegar a rédea caída no chão. Jiló, era o nome do equino, um garanhão altivo e só se tornava agressivo se algo o atingisse.

            A enfermeira trouxe uma injeção para cada um, era para combater a dor, disse sorrindo. Em seguida, foi logo virando a moça e aplicando a injeção nas nádegas e Angel gritou:
           - Pare com isso, que está doendo muito. E, duas lágrimas rolaram de seus olhos.

A mulher se voltou para o rapaz e olhando fixamente em seus olhos, pediu que se virasse expondo as nádegas. Marcelo obedeceu, não teria outra alternativa. Em seguida, ela cobriu os ferimentos dos dois com gazes e disse que deveriam aguardar.

Angel e Marcelo ficaram ali deitados, olhando o teto, onde girava um ventilador velho e sujo, que fazia um barulho indicando falta de lubrificante. Em dado momento, o rapaz puxou conversa, mostrando a medalha que trazia no peito, que o protegera, mais uma vez, da morte. Era a padroeira dos peões de boiadeiro, a Senhora Aparecida. A medalha suja de sangue foi levada a boca e beijada pelo rapaz, que colocava toda sua fé na santa.

Um texto de Eva Ibrahim Sousa

quarta-feira, 10 de abril de 2019

"FÁCIL É SER COLEGA, FAZER COMPANHIA A ALGUÉM. DIZER O QUE ELE DESEJA OUVIR. DIFÍCIL É SER AMIGO PARA TODAS AS HORAS E DIZER SEMPRE A VERDADE, QUANDO FOR PRECISO. E, COM CONFIANÇA NO QUE SE DIZ." CARLOS DRUMMOND ANDRADE


A MISSÃO

         CAPÍTULO DOZE           
              Alceu parecia encantado, olhava cada canto do grande salão. Foi interrompido, quando o médium orientador o chamou.
              – Olá? Você é o rapaz que veio conhecer nossa casa?
             - Sim, aqui é muito bonito! Respondeu Alceu.
             - Seja bem-vindo, gostamos de visitas e todos são bem recebidos. Esta é uma casa de Deus, sinta-se à vontade.

            Em seguida, estendeu a mão para cumprimentar o rapaz e no rosto iluminado, estampou um belo sorriso. O homem trajava roupas brancas, muito alvas; tinha uma mão fina e quente. Seu olhar era terno e apaziguador, brilhando em um azul céu, límpido. A pessoa perfeita inserida no lugar certo, para acolher os necessitados de amparo espiritual.

        Alceu sorriu de volta, estava extasiado. Com a mão no ombro do rapaz, o médium o conduziu para seu escritório. A família ficou sentada no salão, o rapaz precisava desta conversa sozinho.

              O orientador tinha uma expressão serena e a capacidade de fazer o outro sentir-se à vontade; esbanjava carisma. Leonel, era o seu nome e se apresentou sorrindo. Ele ouvia Alceu e balançava a cabeça em sinal de compreensão.

           Alceu sentou-se em frente ao assistente espiritual e pôs-se a contar os fatos mais relevantes de sua vida. Ficou perdido em acontecimentos e fatos estranhos passados, ao longo dos anos. E, o tempo passou rápido, então de um estalo, Alceu lembrou-se da família que o aguardava lá fora.

               - Calma filho, eles estão bem e te esperam calmamente. Parecia que Leonel conseguia ler os seus pensamentos. Sorriu novamente e o assistido percebeu, que o médium tinha poder sobre ele.

              - Estou muito feliz por estar aqui, parece que esta é a minha verdadeira casa. Alceu falou impulsivamente, era como estava se sentindo, pleno e satisfeito. Encontrara seu oásis, que tinha água pura para satisfazer seu espírito.

           – Você precisa de um tratamento espiritual. Afirmou Leonel e depois continuou:
            - Com seu afastamento do centro espírita, os espíritos impuros se aproximaram de você. Sim, existe um chamado de Deus para trabalhar em favor dos mais necessitados. Algumas pessoas são escolhidas, mas demoram a encontrar seu lugar. Ainda é cedo para dizer, mas me parece que você tem uma missão a cumprir. Leonel concluiu sorrindo. Levantando-se fez sinal para Alceu acompanha-lo.

              - Vamos para a sala de passes, você precisa receber boas energias, ainda está fragilizado pela doença.

                 Passando pelo salão, chamou os familiares do rapaz, todos precisavam de boas energias. Mais três médiuns estavam esperando, para ajudar no procedimento.

                 Alceu, Elisa, Rosa e André sentaram-se em umas cadeiras, dispostas lado a lado. Em seguida, os médiuns impuseram suas mãos sobre suas cabeças e começaram a orar por eles. O lugar era calmo, cheio de energia positiva e todos estavam concentrados.

               Quando terminou, Leonel entregou alguns livretos para o rapaz e disse que voltasse na semana seguinte e na outra e na outra. Fariam um tratamento completo, até o rapaz sentir-se livre das vozes e presenças, que sempre o acompanhavam.

            Depois de agradecer, todos voltaram para o automóvel, já era hora de regressar à casa. Alceu estava alegre, a visita lhe fizera bem, pediu para parar e comer alguma coisa; voltara a ter apetite.

            Em uma semana, o rapaz se recuperara de forma inacreditável. Em seu retorno ao hospital, o médico ficou espantado e iniciou o processo para a retirada da traqueostomia. Alceu estava muito melhor.

              No dia seguinte, voltaram à Casa do Carinho e Leonel já o aguardava, tinham uma missão a ser cumprida. Havia uma interação entre os dois, era como se fossem velhos conhecidos. Alceu levou para casa alguns livros sobre o espiritismo, recomendados por Leonel para ele ler. Durante o mês, o rapaz, em companhia do irmão André, esteve na casa de assistência espiritual por quatro vezes.

        No último retorno ao hospital, foi retirada definitivamente a traqueostomia e paciente estava liberado para voltar à vida normal. Levava consigo o compromisso de voltar ao hospital nas datas marcadas, ou se tivesse alguma intercorrência.

             E, na visita à Casa do Carinho, Alceu foi convidado a se juntar a eles, com direito de levar sua esposa para trabalhar na casa de assistência aos mais necessitados, que ficava ao lado da casa principal. Havia muito trabalho a ser feito por ali e ele sabia que aquele era o lugar, onde ele deveria ficar.

            Assim, o casal mudou-se para perto da instituição. Os filhos estavam encaminhados e o casal seguiu em busca de seu destino. O novo integrante da Casa do Carinho estava muito satisfeito e ao entrar no salão, abraçou sua esposa e disse:

              - Senhor: Olhai por mim. E, duas lágrimas rolaram pelo seu rosto. Alceu estava feliz, encontrara o seu caminho.

          - A estrada foi longa e difícil, mas a missão será cumprida. Conclui Eliza, estava satisfeita.

            Alceu sentia que era mais um escolhido por Deus e a ele se entregava com muita fé.

 Um texto de Eva Ibrahim Sousa
MEU MUNDO REINVENTADO.

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