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quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

"NOITES TRAIÇOEIRAS" GOSPEL/RELIGIOSO "...DEUS TE TROUXE AQUI PARA ALIVIAR O TEU SOFRIMENTO. É ELE O AUTOR DA FÉ DO PRINCÍPIO AO FIM, EM TODOS OS SEUS TORMENTOS. E AINDA SE VIER NOITES TRAIÇOEIRAS, SE A CRUZ PESADA FOR, CRISTO ESTARÁ CONTIGO. O MUNDO PODE ATÉ FAZER VOCÊ CHORAR, MAS DEUS TE QUER SORRINDO..." PADRE MARCELO ROSSI

LUGAR NENHUM

CAPÍTULO OITO
            Andou a esmo, atravessou uma feira livre e esbarrou em uma banca de verduras. O dono das verduras olhou feio para Cirilo Artur, que saiu pedindo desculpas e foi sentar-se em um banco do jardim, que ficava em frente a uma igreja católica.

           Não queria pensar em nada, estava entorpecido pela dor da perda da mulher amada. A vida para ele terminava ali; não saberia viver sem Olívia. Foram felizes durante três anos; muito pouco para quem tinha imensos projetos de vida a dois.

            Dentro da igreja havia um alarido de crianças e outras tantas chegando a todo momento, trazidas pelos parentes. Entravam acenando com as mãos para os familiares, que as deixavam ali.

           Crianças! Eles planejavam ter uma também. Despertou sua curiosidade e ele foi verificar, precisava ocupar a mente para não começar a gritar desesperado. Ele tinha um nó na garganta que o sufocava.

           Eram crianças aprendendo o catecismo; então, Cirilo Artur sentou-se no banco logo na entrada e ficou observando. Ele nunca estivera em uma igreja católica e ali havia uma energia contagiante, pensou o rapaz. E, como se tivesse orando começou a balbuciar:

             - Deus está em todos os lugares e aqui dentro também; esta é sua casa. Não importa a religião, Deus é único e vive presente em cada um de nós. Assim dizendo, as lágrimas vieram e ele chorou baixinho, depois suspirando continuou:

            - Meu Deus receba a minha amada esposa e olhe por mim, porque sou fraco e preciso de sua ajuda.

           A igreja era um lugar grande e alto, onde as vozes das crianças faziam eco, quando cantavam.  E, quando paravam de cantar, ficava no ar um burburinho de felicidade. Vez ou outra, para acompanhar o som do órgão, alguns pássaros davam voos rasantes, que quase atingiam o rapaz.

            Depois, pousavam em seus ninhos no cantinho da nave da igreja, que com seus afrescos e vitrais coloridos transmitia paz em sua grandeza. Diante de tanta beleza, Cirilo Artur chegou a esquecer-se, por um momento, que Olívia estava morta.

            No entanto, quando se lembrou do passamento ocorrido naquela manhã, deixou a igreja e voltou, cabisbaixo, para o hospital. Percebeu, então, que aquela dor era só dele e de sua família, pois, a vida continuava lá fora.  Seu coração estava ferido mortalmente, mas havia voltado a bater em ritmo normal. As crianças acalmaram seu coração, que vivia uma emoção intensa.

            Precisava ser forte, porque ele tinha o pior compromisso de sua vida, preparar o funeral de sua esposa. Entretanto, quando chegou, o irmão e um tio já haviam providenciado o velório e os trâmites legais do enterro. A ele restava esperar a liberação do corpo e fazer o seu papel de viúvo; palavra que ele já detestava.

           Sentou-se em frente ao necrotério para esperar o corpo de Olívia. Logo chegaram alguns amigos, parentes e irmãos da igreja e todos diziam para ele ir tomar um banho e comer alguma coisa, que o corpo iria demorar.

         Ele só fazia sinal com a cabeça, não poderia responder, havia uma obstrução em sua garganta. Parecia um bolo de emoção mal resolvida, que o impedia de falar. Não tinha fome e sua vida estava acabada, não precisava de banho, aliás, ele não precisava de nada. Era o dia mais triste de sua vida e seu futuro seria enterrado com sua esposa. 

          O corpo chegou e Cirilo Artur se postara estático ao lado do caixão. O pessoal do escritório também foi prestar solidariedade ao colega. Ele recebia os pêsames e agradecia como se fosse um robô. Seu coração estava morto e seu futuro seria em lugar nenhum.

Um texto de Eva Ibrahim

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

"NOITES TRAIÇOEIRAS"- GOSPEL/RELIGIOSO - "DEUS ESTÁ AQUI NESTE MOMENTO. SUA PRESENÇA É REAL EM MEU VIVER. ENTREGUE SUA VIDA E SEUS PROBLEMAS. FALE COM DEUS, ELE VAI AJUDAR VOCÊ..." PADRE MARCELO ROSSI

QUERO DORMIR

CAPÍTULO SETE
            A primeira quimioterapia de Olívia não teve reações significativas. Um mal-estar estomacal, pouco apetite e uma apatia natural devido a fraqueza já estabelecida. No dia seguinte, outra sessão de radioterapia e alternadamente a quimioterapia.

          Tamanha carga de medicação foi minando as forças de Olívia e, em duas semanas ela já não comia e nauseava quando falavam sobre comida. Além das quimioterapias, ela tomava corticoides e isso a estava deixando inchada. Olívia estava cada dia mais empalidecida, fraca e desanimada. Vivia tomando soro e tinha pouca vontade de conversar.

            Durante o dia era sua mãe que lhe fazia companhia e a noite o marido fazia questão de ficar com ela. Ninguém estava contente com aquela situação e, o médico foi categórico ao conversar com Cirilo Artur.

         - A situação está se agravando, porque a doença não estacionou, pelo contrário, está ganhando força. Se continuar assim, logo perderemos o controle sobre ela. Na verdade, estamos perdendo a luta para o câncer, que está se espalhando pelo corpo. Teremos que procurar um doador para o transplante e, precisa ser o mais rápido possível. Coçou a cabeça, estava desolado, então, continuou:

            - O caso de Olívia já chegou complicado, com a doença em estado adiantado e ela está muito fragilizada; temo pelo seu futuro. Vou agilizar o banco de doadores de medula óssea, espero contar com a sorte, afirmou o médico.   
      
            Cirilo Artur prometeu trazer os parentes e amigos para fazerem o teste de compatibilidade; estava muito preocupado. Depois saiu e foi chorar lá fora, encostado em uma parede que dava para lugar nenhum; ninguém precisava ver a sua dor. Ficou ali durante algum tempo, pedindo a ajuda de Deus; ele estava com maus pressentimentos.

           Em seguida, tomou água e lavou o rosto, para que ninguém percebesse sua fraqueza. Na verdade, ele queria morrer para não ver o sofrimento de Olívia. No entanto, tinha que se mostrar forte para ela não desistir da vida, que estava por um fio. Ele havia programado uma surpresa para ela, seria, na semana seguinte, o aniversário de três anos do primeiro encontro. E, agora ela estava entrevada na cama; uma situação inesperada.

             Terceira semana e muitas pessoas se apresentaram para a pesquisa de compatibilidade. Amigos, parentes e irmãos da igreja, que não se cansavam de orar por Olívia. No entanto, ela piorava a olhos vistos, seus cabelos estavam caindo e seu corpo ficando mais inchado a cada dia.

            Quarta semana e a paciente parecia outra pessoa, o seu corpo dobrara de tamanho, já não se alimentava por boca, somente por sonda. O médico dissera ao marido que seus recursos estavam se esgotando e, a situação era tão grave, que não sabia se haveria tempo para o transplante.

            Trinta e dois dias e Olívia amanheceu com muita febre e falta de ar e, quando o médico chegou fez uma cara, que Cirilo Artur identificou como sendo desanimadora. Estava claro que ela estava muito pior.

            Olívia estava irreconhecível, lutava para respirar. Recebia os cuidados necessários, mas aparentava total desânimo A semana arrastou-se entre pequenas melhoras e muitas pioras; já não havia esperança; agora estava com pneumonia. Não respondia aos medicamentos para controlar a infecção.

            - É uma questão de tempo para ela nos deixar, dissera o médico consternado, para o marido desesperado.

           Na manhã de sexta-feira ela foi levada à sala de emergência, estava ofegante, apesar do oxigênio que recebia.

             Cirilo Artur segurava em suas mãos e ela balbuciou:

            - Vejo amor em seu olhar. Me perdoe, já não aguento mais. Quero dormir para descansar.

           E, em seguida, foi sedada e intubada, para ter um melhor suporte respiratório. No entanto, ela nunca mais acordou; seu óbito foi constatado na manhã de sábado, depois de quarenta dias internada. Estavam presentes, os pais, o irmão e o marido.

            Cirilo Artur saiu para a rua, precisava tomar ar ou morreria sufocado. Queria fugir daquela situação insuportável.

Um texto de Eva Ibrahim

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

"ANJOS DE DEUS" "...QUANDO OS ANJOS PASSEIAM A IGREJA SE ALEGRA. ELA CANTA, ELA CHORA, ELA RI E CONGREGA. ABALA O INFERNO E DISSIPA O MAL. SINTA O VENTO DAS ASAS DOS ANJOS AGORA. CONFIA IRMÃO, POIS É A TUA HORA. A BENÇÃO CHEGOU E VOCÊ VAI LEVAR..."

SEM REAÇÃO!

CAPÍTULO SEIS
        Olívia chorou durante a noite e Cirilo Artur ouviu, mas deixou que desabafasse; fingiu que estava dormindo. Pela manhã, depois da radioterapia, ela disse que estava preocupada com as sessões de quimioterapias. Então, contou o que ouviu de outra paciente mais antiga, que estava aguardando a vez para fazer a radioterapia.

- A mulher, de cerca de quarenta anos, já está careca porque seu tratamento está com quatro meses e os seus cabelos começaram a cair no final do primeiro mês. Ela tirou o turbante para eu ver e me disse que, assim que começa o ciclo de quimioterapias vermelhas, cresce a expectativa da queda de cabelo.
Suspirou fundo e prosseguiu:
- O que, geralmente, ocorre dentro de duas a três semanas após o seu início. Ela contou que o travesseiro amanhece cheio de cabelos e no banho, o ralo também fica cheio de fios de cabelos, enquanto a cabeça queima tipo uma inflamação. Me disse também, que caem todos os pelos do corpo, os pubianos e das axilas; ficamos lisas como bebês. Concluiu Olívia com uma nuvem de tristeza no olhar.

Depois, olhando nos olhos do marido, ela continuou:
-Meu amor, eu acho que vou cortar meus cabelos para fazer a peruca, porque depois eles não vão prestar mais, e deixou rolar duas lágrimas de seus olhos. 

Cirilo Artur não se conteve e a abraçou dizendo:
         - Sim, vou pedir a minha mãe que traga sua cabeleireira para cortar seus cabelos bem curtos. Depois que tudo isso passar ele crescerá novamente. Em seguida, a beijou com carinho.
        
        Na quinta-feira à noite, a cabeleireira chegou; no dia seguinte começariam as quimioterapias. A moça amarrou os cabelos longos de Olívia e foi cortando o mais curto possível. Em seguida, entregou ao marido o chumaço de cabelos da moça;

         - São valiosos, se quiser vender, pois nunca receberam tintas. Observou a cabeleireira. A paciente fez que não com a cabeça, não conseguiria falar, estava com um nó na garganta.

             A cabeleireira, então se ateve a acertar o corte dos cabelos que sobraram.

             Olívia quis olhar no espelho e chorou novamente; era de dar pena. A comoção foi geral e todos acabaram chorando, até a cabeleireira.

             O dia seguinte amanheceu e vieram colher o sangue de Olívia, queriam saber se ela estaria em condições de receber a primeira sessão de quimioterapia. Depois de uma hora, voltaram com uma cadeira de rodas e conduziram a moça à sala de quimioterapias.

             Cirilo Artur ficou em pé na soleira da porta de entrada, parecia estar com medo de adentrar ao local. Tinha uma sensação de que aquele lugar faria muito mal à Olívia.

             Depois da medicação instalada, ele foi convidado a sentar-se perto de sua esposa; ela precisava de seu apoio. Cirilo Artur ficou sentado ao lado de Olívia, segurando um lenço nas mãos, para o caso dela nausear.

           Ele não tirava os olhos de sua amada, enquanto o líquido penetrava na veia de sua mão, postada sobre o braço da poltrona.
           Não parecia ser tão terrível, era apenas um soro colorido; um xarope de groselha, pensou o rapaz.

           Quando acabou o soro e a punção foi retirada, ele percebeu que o medo da quimioterapia era um fantasma criado na cabeça das pessoas; nada havia de estranho. As enfermeiras, as pacientes, o ambiente nada tinha de hostil; faziam parte de um conjunto acolhedor à novos integrantes. Tudo muito claro e as pessoas sorriam cordiais enquanto conversavam.

           A enfermeira aproximou-se de Olívia e deu-lhe um pacote dizendo para ela fazer uso dele. Foi o primeiro presente que Olívia ganhou, um turbante colorido, doado pelas voluntárias. Todas as pacientes de quimioterapia tinham um turbante vistoso e colorido. Cirilo Artur sorriu, estava sem reação.

 Um texto de Eva Ibrahim

quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

"ANJOS DE DEUS" - REFRÃO: "...TEM ANJOS VOANDO NESTE LUGAR. NO MEIO DO POVO E EM CIMA DO ALTAR. SUBINDO E DESCENDO EM TODAS AS DIREÇÕES. NÃO SEI SE A IGREJA SUBIU OU SE O CÉU DESCEU. SÓ SEI QUE ESTÁ CHEIO DE ANJOS DE DEUS. PORQUE O PRÓPRIO DEUS ESTÁ AQUI..."PADRE MARCELO ROSSI


                                  PRECISO DE VOCÊ

                             CAPÍTULO CINCO
         Quando Cirilo Artur voltou ao quarto, Olívia não havia chegado, demorou um pouco para voltar da radioterapia. Então, ele sentou-se na poltrona enquanto aguardava. O quarto estava na penumbra e Cirilo Artur ficou imaginando o que poderia fazer para animar sua esposa. Olívia estava triste e parecia definhar a cada dia. Aquela situação estava deixando-o arrasado.

            A moça chegou cansada, trazia as marcas em tinta azul na região da clavícula, parecia um mapa mal traçado. Cirilo Artur olhou e perguntou se estava doendo, mas, diante da negativa ele se absteve de comentários. Aproximou-se e fez carinho em seus cabelos longos, depois beijou sua mulher; ela era seu maior tesouro.

Em seguida, vencido pelo cansaço, recostou-se no sofá e acabou por adormecer, também estava exausto. Dormiu um sono agitado e sonhou com aquele rapaz careca, Jonas, que não saia de sua cabeça. Acordou quando o carrinho de comida entrou no quarto e fez barulho.

 No sonho, teve uma sensação muito boa e lembrou-se de sua infância. Sua mãe sempre dizia, que Deus fala com os seus filhos através de outras pessoas, por isso deveriam prestar atenção quando alguém falava com eles. Tinha convicção nisso.

- O Jonas seria um mensageiro de Deus? Pensou Cirilo Artur.

  Depois do encontro, ele estava com algumas ideias que poderiam ajudar sua amada; teria que pensar e dar corpo à sua imaginação. Pediria à sua mãe para fazer companhia a Olívia e, depois do trabalho iria ao centro da cidade, para investigar a possibilidade de concretizar sua ideia.

            Retornou alegre, porque o seu desejo era de fácil conclusão. Só teria que convencer sua mulher, a cortar seus cabelos na altura do pescoço. Quando estavam sentados jogando conversa fora, ele resolveu falar. Aproximou-se e pegando em suas mãos foi dizendo:

- Olívia, hoje eu fui ao cabeleireiro que fabrica perucas e expus o seu caso. Ele disse que pode fazer uma peruca do seu próprio cabelo, que ninguém vai desconfiar que não está implantado no seu couro cabeludo. Precisamos cortar o cabelo bem curto e levar para ele tratar, que até os seus cabelos caírem, a peruca já estará pronta.

- Não quero cortar meus cabelos, ela respondeu, enquanto as lágrimas escorriam pelo seu rosto. 
- Não tenho lembrança da última vez que cortei os cabelos, deveria ser muito pequena; soluçou a moça.

A mãe do rapaz fez sinal para ele dar um tempo para Olívia pensar.

- Foi só uma ideia, se você não quiser, nada faremos, fique calma meu amor, e a abraçou com carinho.

No dia seguinte foram iniciadas as sessões de radioterapia e em seguida viriam as quimioterapias, que levariam à queda dos cabelos de Olívia. Ela teria algum tempo para decidir o que faria, pensou Cirilo Artur.

O primeiro dia da quimioterapia seria na sexta-feira e ele faria uma surpresa para seu amor. A mãe de Olívia passou a quinta-feira com ela e no final da tarde, o marido iria busca-la para Cirilo Artur passar a noite ali. Então, entraram no quarto, o seu pai, o irmão e Cirilo Artur, todos de cabeça raspada.
A surpresa foi tão grande que ela gritou.

 – Que loucura! Por que fizeram isso?

  - Em solidariedade a você, porque a amamos e não queremos que sofra.
            Olívia não conteve as lágrimas e agradeceu a todos; seriam quatro carecas e não apenas ela.

            Os dias passaram e ela já ostentava queimaduras na pele por causa da radioterapia. Sentia-se enfraquecida e com náuseas. E, a tendência era piorar com o início da quimioterapia, todos sabiam disso.

 Um texto de Eva Ibrahim

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

"ANJOS DE DEUS"- GOSPEL/RELIGIOSO. 'SE ACONTECER UM BARULHO PERTO DE VOCÊ. É UM ANJO CHEGANDO PARA RECEBER. SUAS ORAÇÕES E LEVÁ-LAS A DEUS. ENTÃO, ABRA O CORAÇÃO E COMECE A LOUVAR. SINTA O GOSTO DO CÉU, QUE SE DERRAMA NO ALTAR. QUE UM ANJO JÁ VEM COM A BÊNÇÃO NAS MÃOS..." PADRE MARCELO ROSSI

UM DIA APÓS O OUTRO

CAPÍTULO QUATRO
         A noite foi um pesadelo; Cirilo Artur passou o tempo todo vigiando sua esposa e a cada som diferente, ele pulava da poltrona. Olhava as luzes da cidade pela janela do quarto, estavam no terceiro andar do hospital universitário, e imaginava a vida lá fora, sem o fantasma do câncer corroendo seus pensamentos.

          Orou a noite toda, procurava um alento divino. Seu corpo estava dolorido por estar em uma poltrona incômoda, mas, o que mais doía era seu coração. Batia acelerado e formava uma bola em sua garganta, que o impedia de comer; uma sensação de vômito iminente. Sentia-se mal, estava vivendo um drama.

            Precisava acreditar que aquilo tudo era passageiro, e que logo Olívia estaria de volta ao lar. A paciente dormiu porque tomou calmante e quando acordou, lembrou-se do diagnóstico e começou a chorar.

Olívia tomou banho e logo chegou o café, que ambos somente beliscaram, não tinham fome; estavam inquietos e temerosos. Uma tristeza enorme por estar sofrendo uma dor causada por um inimigo invisível, para o qual, não tinham armas para lutar.

             Se fosse um membro ou um órgão doente poderia ser extirpado, mas a leucemia estava no corpo todo, como enfrentar aquela situação? Não sabiam a resposta.

           O médico chegou para a visita matinal e trazia novidades.

          – Já temos um plano para atacar o câncer que está fazendo você sofrer. Disse, olhando Olívia nos olhos.
            - Logo mais, virão busca-la para marcar a radioterapia e iniciar o tratamento para minar os nódulos aparentes. São pequenas marcas e riscos para identificar o local exato onde a radiação deverá incidir. E, amanhã iniciaremos o tratamento com a primeira sessão de radioterapia. Iremos explicar tudo passo a passo; não tenha medo, existe algumas reações adversas, mas a aplicação é indolor.

             Dr. Júlio Rocco, estava escrito em seu jaleco, Cirilo Artur prestou atenção enquanto ele falava. Era um homem de meia idade e falava calmamente, parecia que estava em uma conversa informal do dia a dia; no entanto, para o casal era uma questão de vida ou morte.

          Ambos ouviram calados, não sabiam do que se tratava. Radioterapia, quimioterapia eram novidades para eles. Entretanto, sabiam que não era uma coisa boa, mas armas agressivas contra a doença.

         O médico percebeu o desconforto e sorriu com uma carreira de dentes alvos; era um sorriso acalentador e foi logo dizendo:

           - Conforme a doença é o remédio e, neste caso tem que ser muito amargo. Em seguida pegou o estetoscópio para ouvir os pulmões de Olívia. Sorriu novamente e, dizendo que estava tudo dentro do esperado, saiu fechando a porta de mansinho.

             Cirilo Artur sentiu-se reconfortado, aquele homem era um calmante para seu coração desesperado. A vida de Olívia estava em boas mãos, pensou, beijando sua esposa no rosto. A paciente também parecia mais calma, até sorriu para o marido.

             Olívia foi levada para a marcação da radioterapia e Cirilo Artur aproveitou para sair e tomar um pouco de ar puro. Tinha uns quarenta minutos até que sua esposa voltasse para o quarto.

             Ele desceu os três andares até a recepção e sem saber o que fazer, sentou-se em uma mureta do lado de fora. Estava tão preocupado que não percebeu a aproximação de um rapaz pálido e sem cabelos, que lhe fez uma pergunta:

            - Você tem horas, por favor?

             - Dez horas E cinco minutos, respondeu e olhando para o rapaz sentiu que havia algo em comum com os pacientes do hospital.

            - A minha sessão de quimioterapia começa as dez e meia, ainda falta um tempo, e sorriu para Cirilo Artur, que reparou que ele estava careca e poderia lhe contar coisas sobre o tratamento. Estava desesperado e qualquer luz, por pequena que fosse, seria benvinda.

             Conversaram um pouco sobre a doença, que era a mesma de Olívia e logo apareceu um senhor, que Jonas, o rapaz careca, apresentou como sendo seu pai. O homem estava com a cabeça raspada e disse para Cirilo Artur, que havia raspado a cabeça em solidariedade ao filho, que amava muito.

          Ambos se foram abraçados, deixando um sentimento de grandeza de alma no ar. Uma certeza de que não estavam só naquela triste jornada; havia apoio emocional entre eles.

 Um texto de Eva Ibrahim

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

"...SE EU ROUBEI. SE EU ROUBEI TEU CORAÇÃO. TU ROUBASTE. TU BOUBASTE O MEU TAMBÉM. SE EU ROUBEI. SE EU ROUBEI TEU CORAÇÃO. É PORQUE. É PORQUE TE QUERO BEM." MÁRIO LAGO E ROBERTO MARTINS

NAS SOMBRAS

CAPÍTULO TRÊS
           Cirilo Artur ficou assustado, não poderia nem pensar, que sua amada pudesse ficar doente; sentiu-se enjoado com aquela possibilidade.

           - Iremos ao médico, com certeza; afirmou para o dentista.

           E, no mesmo dia procurou um hospital, onde sua esposa foi atendida no Pronto Socorro e liberada em seguida: estava, aparentemente, recuperada. O médico pediu diversos exames e marcou o retorno da paciente para o consultório médico do convênio de Cirilo Artur.

          Olívia fez todos os exames e ficou constatado que ela estava com anemia. Necessitava de medicamentos, além de um reforço alimentar. O marido esforçava-se, para que ela tivesse a melhor alimentação para curar sua anemia; ficara temeroso pela saúde da mulher.

           Ele fazia tudo o que as pessoas de suas relações, diziam ser adequadas para curar anemia. Comprara uma panela de ferro para Olívia cozinhar e introduziu fígado bovino na alimentação diária do casal. Quando sua mulher protestava ele dizia:

           -Se não fizer bem, também não fará mal.

           Depois de alguns dias, Olívia parecia bem, estava corada, disposta e com uma boa aparência. Parecia que a paz voltara ao lar de Cirilo Artur. No entanto, depois de um mês, apareceram alguns caroços nas axilas da moça. Além disso, apareceu também, um caroço na base do pescoço, que cresceu e inflamou.

            A moça passou dias com muita dor e só conseguia dormir sob o efeito de analgésicos e anti-inflamatórios receitados pelo médico. Mas, a medicação não desinflamou o abcesso e, ela precisou ser submetida a uma incisão cirúrgica no local, com a colocação de um dreno e a introdução de antibióticos.

             Durante dias, Olívia ia fazer curativos no pronto atendimento da clínica e sempre havia drenado muita secreção purulenta; a infecção não estava controlada. O médico, temeroso, percebeu que a situação estava muito complicada e resolveu encaminhá-la para um hospital grande e com mais recursos.

             A moça ficou internada para ser submetida a outra bateria de exames; seu caso parecia ser pior do que se poderia imaginar. Um mês inteiro tomando antibióticos e não melhorou. Diante desta situação, Cirilo Artur pediu para o médico a transferência de sua esposa para um hospital de referência da região, ele estava desesperado com a doença, que acometera sua esposa.

             Olívia havia emagrecido cinco quilos em um mês, estava pálida, sempre enjoada e com o estômago doendo:

            - Uma situação preocupante, porém, vamos aguardar os exames, dissera o médico que a recebeu no complexo universitário.

             Novos exames e tomografia, ressonância magnética e uma biópsia do local do caroço supurado. Cirilo Artur perdera o sossego, vivia do trabalho ao hospital e vice e versa, estava exausto. Olívia estava cada dia mais enfraquecida; parecia que estava sumindo aos poucos.

             Mais uma semana de espera pelo resultado da biópsia, que era urgente, dissera o médico. E quando veio, o diagnóstico foi fechado:

            - Uma facada no peito teria doido menos, disse Cirilo Artur para sua mãe no telefone. Depois calou-se, estava emocionado.

             - Fala meu filho, não me deixa nesta aflição. Pediu a mãe apreensiva.

             - O médico chegou com um papel na mão e disse para mim e Olívia, que as notícias não eram boas. Em seguida, olhando para Olívia e com um jeito sério, compenetrado, falou:

             - Sinto muito, mas você está com câncer nos gânglios linfáticos. É um câncer agressivo, que se chama “Linfoma Não-Rodgkin”. Faremos tudo que a ciência disponibiliza e usaremos todos os recursos que temos para combater esse mal. Inclusive a quimioterapia, radioterapia e tudo o que for necessário; juntos venceremos essa etapa difícil, mas perfeitamente possível. Vou marcar a quimioterapia e depois voltaremos a conversar.

             - Então, ele saiu do quarto nos deixando paralisados. Olívia agarrou-se a mim e chorou até adormecer. Eu fiquei na mesma posição, parecia que o quarto estava cheio de sombras escuras. Sua voz embargou e ele conteve um soluço.

            - É isso mãe, minha mulher está com câncer.

Engoliu o choro e desligou, deixando mais uma pessoa nervosa e com o coração na mão.

Um texto de Eva Ibrahim
MEU MUNDO REINVENTADO.

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