MOSTRAR VISUALIZAÇÕES DE PÁGINAS

sexta-feira, 11 de setembro de 2015

"ELA ACREDITAVA EM ANJOS. E, PORQUE ACREDITAVA, ELES EXISTIAM..." CLARICE LISPECTOR - DEVEMOS SORRIR SEMPRE, MESMO ESTANDO TRISTE. EVA IBRAHIM

ANA BANANA
CAPÍTULO UM
            A menina fora encaminhada à diretoria; teria que se explicar mais uma vez. Depois do intervalo ela adentrou à classe com a roupa suja e um arranhão no rosto, foi a reclamação da professora. Hermínia, a diretora, estava acostumada a receber a Ana em sua sala. Era uma menina mal arrumada, que brincava com moleques na rua e tinha pouco interesse nos estudos. Muito magra, alta para sua idade, tinha os cabelos castanhos sempre despenteados e uma aparência de desleixo.

Quando a inspetora de alunos entrou na sala, segurando no braço da menina de doze anos, percebeu que já havia outra aluna sentada na cadeira, ela estava aguardando a Ana para se explicarem diante da diretora. As duas estavam sujas e com arranhões, por isso seriam suspensas das aulas por três dias. Hermínia não conseguiu retirar delas o motivo da desavença, eram reincidentes.

Ficaram sentadas na diretoria até a sineta tocar para irem para casa. Levavam na mochila uma carta de suspensão, que deveriam trazer assinada pelo pai ou não entrariam na sala de aulas. Quando saíram, a diretora ligou para as mães das duas alunas, contando sobre a briga ocorrida no intervalo e pedindo providências.

Alda, a mãe de Ana, estava na porta e recebeu a filha com dois safanões, que a jogaram dentro do banheiro. A menina tomou um banho e saiu enrolada na toalha indo para seu quarto. E, Alda gritou da cozinha:

- Depois do jantar, seu pai acerta as contas com você.

A menina tremeu; o pai batia pesado. Era melhor colocar calças compridas e blusão, pois, com certeza levaria algumas cintadas. Ela já tinha marcas de outras sovas no corpo, o pai era violento. No entanto, apesar de saber disso, ela não tomava jeito; estava sempre metida em encrencas.

Vitório, o pai, era um caminhoneiro ríspido, intolerante, grosseiro e gostava de beber. Quando chegava do trabalho bêbado, ameaçava a mãe e as vezes batia nela também. Os meninos se escondiam e sempre sobrava uns tabefes para a filha, que o enfrentava para defender sua mãe.

A menina magricela trazia dentro de si uma revolta contra o pai e quanto mais apanhava, mais molecagens fazia. Não tinha vaidade, na escola ela brincava com os meninos e participava das bagunças que eles faziam, ela e sua amiga Gisela. Certo dia as duas se desentenderam e a Gisela passou a chama-la de Ana Banana, até o dia em que a Ana revidou e passou a chama-la de Gisela Cadela, então a amizade acabou. Mas, essa história correu boca a boca e ambas passaram a ser conhecidas, no meio em que viviam, pelo apelido: Ana Banana e Gisela Cadela.

Naquela noite não foi diferente, o pai chegou bêbado e a filha apanhou para valer. E, depois de um empurrão ela caiu e raspou o braço no muro de cimento, causando-lhe mais um ferimento. A menina chorou de raiva até pegar no sono. O castigo foi duro, ficaria trancada em casa durante os três dias que estaria suspensa da escola.

O pai não a queria sentada na mesa do jantar; parecia odiar a filha. Alda sofria com as agressões do marido e temia pela sorte da menina. Vitório dizia que a maioria das mulheres não prestavam, por isso ele batia na filha para ela não pensar em sair da linha.

 - Que comesse sozinha, longe dele, dizia o homem irado.

A situação naquela casa era insuportável, Alda tinha medo do marido e sentia por não conseguir defender a filha, no entanto, com os meninos ele não implicava. O foco principal de Vitório era a filha, que recebia as grosserias do pai diariamente.
Um texto de Eva Ibrahim.

Continua na próxima semana.

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

"O CAMINHO É VOCÊ QUEM DEFINE. AS SUAS ESCOLHAS VÃO REFLETIR NO SEU FUTURO. SAIBA O QUE VOCÊ REALMENTE QUER PARA SUA VIDA. SE LHE FAZ BEM, SIGA EM FRENTE". AUTOR DESCONHECIDO -- VEJO O MEU FUTURO EM VOCÊ. EVA IBRAHIM

A VIDA COMEÇA TODOS OS DIAS
CAPÍTULO VINTE E CINCO
           Reinaldo entrou na Igreja Matriz, a mesma que o acolhera no Batismo, na Primeira Comunhão e, quando homem, em seu Casamento. Depois recebeu seus filhos, Larissa e Vitor para o Batismo. Posteriormente, numa tarde chuvosa, recebeu o corpo de Amanda, inerte, pálido e sem vida, para ser encomendado na casa de Deus. Em seguida, seguiram para o cemitério e diante da comoção dos presentes, o corpo de sua jovem esposa foi sepultado; aquele foi o dia mais terrível de sua vida, pensava Reinaldo. Sentia-se triste, estava perdido em seus pensamentos, envergonhado por querer refazer sua vida; pensava que todos iriam condená-lo.

            - Será que aquele sentimento, que crescera em seu coração, estava proibido para ele? Queria ouvir o padre e acolher seu conselho.

            Ajoelhou-se em frente ao altar e fez uma oração com intenção da alma de Amanda, queria lhe pedir perdão. Enquanto rezava, o padre Germano adentrou ao recinto e parou a alguns metros de distância para observar o rapaz. Gostava daquele paroquiano, era um bom rapaz e já sofrera bastante.

O padre se aproximou e colocou sua mão no ombro de Reinaldo, que se virou prontamente, levantando-se a seguir, para cumprimentar o pároco. E, depois de um abraço fraterno, os dois seguiram para a Sacristia; Reinaldo queria abrir seu coração. Seria uma longa conversa, sincera e esclarecedora. Ele precisava ser ouvido por alguém que conhecia a situação, para então, tomar algumas providências; era temente a Deus e queria viver em paz. Com os olhos marejados de lágrimas ele falou de Amanda:

 - Deus a levara contra sua vontade, era muito cedo, ele a amava e as crianças precisavam da mãe. 

                O padre concordou e disse que ele teria que aceitar a vontade do pai e viver a vida normalmente, nada o impedia de amar outra pessoa e se casar novamente. Fora um bom marido, era um bom pai e devia reconstruir sua vida. Ele teria o maior prazer em celebrar seu novo casamento e dar sua bênção ao novo casal.

            - A vida não para, começa todos os dias e Deus quer ver seus filhos alegres e felizes, vá atrás de sua felicidade, concluiu o vigário

            O rapaz saiu dali com o coração leve; a compreensão do padre aliviou seu sentimento de culpa e o liberou para o amor de Celina. Ele a amava e a pediria em casamento, logo depois de apresenta-la aos filhos e a sua família. Entretanto, esperaria mais três meses para terminar seu tempo de luto e reformar sua casa para viver com Celina.

 Foram momentos difíceis para explicar aos pais, filhos e irmãos que os dois viúvos queriam se juntar e esquecer o passado. As crianças ficaram felizes em saber que voltariam a morar com o pai e Celina, uma vez que a mãe fora morar com Deus. Para elas parecia natural a mãe morar com Deus, estava tudo bem, gostaram de Celina.

 A mãe de Amanda chorou quando soube da possibilidade de ficar sem os netos, no entanto, logo compreendeu que eles precisavam do pai. Reinaldo abraçou Celina e a beijou com carinho, haviam se encontrado em um momento muito triste de suas vidas, mas, agora caminhariam juntos para uma nova vida. Queriam construir uma família feliz.

Os três meses passaram e o casamento aconteceu em um sábado à tarde, somente para os parentes e alguns amigos. Larissa e Vitor entraram na frente com as alianças, estavam felizes. Depois da cerimônia houve um brinde no salão paroquial; bolo e doces. À noite seguiram viagem para uma curta lua de mel, porém, antes olharam para o céu onde viram duas estrelas cadentes e ambos se abraçaram.

- Será que era a Amanda e o Fernando lhes desejando felicidades? Perguntou Celina.
Reinaldo respondeu que acreditava que os dois tentaram se comunicar, do jeito que os anjos sabem fazer; depois sorriu e beijou sua mulher.

 Termina aqui a história de um casal de viúvos, que depois de virados ao avesso, se encontraram. E, descobriram que o avesso era seu lado certo.

Um texto de Eva Ibrahim.

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

"MAIS ESPERANÇAS NOS MEUS PASSOS DO QUE TRISTEZA NOS MEUS OMBROS". CORA CORALINA -- A VIDA COMEÇA TODAS AS MANHÂS. EVA IBRAHIM

RECORDAR É VIVER
CAPÍTULO VINTE E QUATRO
             Reinaldo sabia que estava para tomar uma atitude muito importante para sua vida; estava apaixonado por Celina. Porém, havia um sentimento de culpa que não o deixava pegar no sono; era nostalgia de um passado feliz. A presença de Amanda aparecia forte em seus sonhos, sempre apontando o dedo e acusando-o de traição; se esquecera dela e dos filhos, dizia em seus pesadelos.
              Tomara uma taça de vinho para adormecer mais rápido e não pensar em nada. Entretanto, acordou durante a madrugada e ficou olhando o relógio mudar os ponteiros. Sua insônia estava virando rotina, parecia haver hora certa para pensar na defunta. Balbuciou um palavrão e se calou em seguida.
             – Será que Amanda pode me ver ou ouvir?
          Sentiu pena de si mesmo, estava vivendo contradições em sua vida. Procurou os chinelos, vestiu a camisa do pijama e, então decidiu se levantar e ligar o computador. Reinaldo precisava matar o tempo para não enlouquecer. No computador estavam as fotos de Amanda e dos seus filhos; ele começou a chorar enquanto via as fotos. Ali na tela estava sua vida e sua história dos últimos oito anos.
           - Como poderia se esquecer de toda a felicidade vivida? E, as crianças como iriam receber uma nova mãe?
          Essas perguntas martelavam sua cabeça, no entanto, ele assumira um compromisso com Celina e não queria fugir dela. Estava apaixonado e queria ficar com ela; precisava refazer sua vida. Iria se confessar com o padre Germano, amigo da família e que conhecia sua história. Este pensamento acalentou seu coração e ele pegou um copo com água; estava mais calmo.
          Voltou para a cama e ouviu um trovão, outro relâmpago e, em seguida outro estouro. Levantou-se e abriu uma metade da janela para ver a chuva, porém, o vento invadiu o quarto e ele teve que fechá-la rapidamente. Naquele momento lembrou-se de Amanda e das noites chuvosas que passara com ela aninhada em seus braços.  Lembrou-se também, do edredom rosa que ela puxava para esconder a cabeça a cada novo estouro e ele protestava.
             - Por que essa coberta não poderia ser azul ou de outra cor? Rosa era coisa de mulher, dizia aborrecido e Amanda ria dele.
            Agora ele percebia que era feliz e não se dava conta. Lembrou-se da noite que retornaram de uma festa de aniversário e as crianças trouxeram uma porção de balões e soltaram no meio da sala. Depois caíram no sono, estavam cansadas de tanto brincar. Reinaldo e Amanda foram se deitar, estavam exaustos e logo adormeceram.
            No meio da noite, ouviu-se um barulho ensurdecedor dentro do quarto do casal e Reinaldo deu um pulo da cama, seguido de Amanda; ambos correram para ver as crianças. Estava tudo quieto e os filhos continuavam dormindo, então, o rapaz pegou uma faca de cortar carne e saiu para ver onde estava o ladrão. O barulho era de tiro e a mulher ficou tremendo e implorando para o marido não abrir a porta.
              As luzes foram acesas e nada havia do lado de fora. E, Reinaldo entrou e abaixou-se para olhar debaixo da cama, o bandido poderia estar ali. Mas para sua surpresa, um dos balões havia estourado naquele local; com o quarto fechado, o barulho foi ensurdecedor. Ambos riram e acabaram caindo nos braços um do outro.  
Recordou-se dela na cama e do jeito que dormia, do seu cheiro, dos lábios carnudos convidando-o para muitos beijos. Voltou para a cama vazia, fazia oito meses que Amanda sucumbira a um câncer de mama. Estava triste e solitário quando encontrara Celina, que padecia do mesmo dor e ele sentiu a possibilidade de refazer sua vida.
No entanto, teria que resolver todas as amarguras e guardar as lembranças de Amanda. Viver seu luto integralmente e se confessar com o Padre Germano para poder recomeçar sua vida. Precisava afastar seus fantasmas para se entregar à outra mulher, que estava a sua espera.
Um texto de Eva Ibrahim.

Continua na próxima semana.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

"DE REPENTE A VIDA TE VIRA DO AVESSO E VOCÊ DESCOBRE QUE O AVESSO É O SEU LADO CERTO". CASA DOS ESPÍRITOS. -- TENHA CORAGEM PARA VIVER SEUS SONHOS. EVA IBRAHIM


AH! O AMOR ESTÁ NO AR

CAPÍTULO VINTE E TRÊS
           O novo casal de namorados tinha muitos planos para o futuro. Haviam sofrido muito com doenças e agora que estavam juntos, não poderiam perder tempo. Entretanto, Celina sentia uma grande preocupação em relação aos filhos de Reinaldo; precisava conquista-los para deixar o pai feliz e poder formar uma família unida. Uma vida tranquila era o que Celina e Reinaldo desejavam. O amor que sentiam era o ponto de equilíbrio entre ambos.

Ela sabia que as crianças estavam com a avó materna, porém, para Reinaldo aquela situação era provisória. Ele queria que os filhos voltassem a viver com ele, Celina sabia disso. Sempre dizia ter saudades de brincar, passear e contar histórias até os filhos adormecerem; queria cria-los do seu jeito. Por diversas vezes ele deixou claro, que se algum dia voltasse a se casar, sua esposa teria que aceitar os dois filhos dele; Larissa de cinco e Vitor de dois anos.

  Celina acordara alegre no dia seguinte à sua entrega ao novo amor. Na verdade, parecia que estava em estado de graça, cheia de descobertas e encantamentos. Contou para sua mãe que estava apaixonada e tinha a intenção de viver ao lado de Reinaldo. Depois frisou que, fazia tempo não sentia tanta felicidade.

No entanto, sua mãe a alertou de que era preciso manter a cabeça fria e entender, que na realidade ela tinha muitos obstáculos para transpor. Deveria conhecer a família de Reinaldo, as crianças e depois conquista-las, para então, planejar um futuro. Deveriam começar contando sobre o novo relacionamento para as duas famílias, da descoberta do amor e dos planos do casal.

Celina temia encontrar resistência na mãe de Amanda, que tratava os netos como se fossem seus filhos. Todos estavam feridos pelos acontecimentos e o novo casal deveria conquistar um de cada vez, para eliminar qualquer rastro de mágoas no novo caminho; ponderou a mulher, com uma ruga de preocupação na testa.

Depois, continuou, de comunicar aos adultos a decisão do casal e conseguir sua aceitação, deverá criar vínculos com as crianças de respeito e confiança. Para isso é necessário evitar demonstrações de amor com o pai delas, pois pode dar a impressão de que a namorada esteja roubando o pai dos filhos. Devem deixar as demonstrações de carinho para quando estiverem sozinhos. Celina absorvia todas essas colocações que sua mãe expunha. A mulher compenetrada, falava pausadamente sobre experiências vividas e conhecidas de relacionamentos entre pais e filhos.

               Vida nova era o que ela mais desejava, tinha necessidade de deixar o passado e investir em uma vida com Reinaldo e os filhos. Ela teria que aprender a gostar das crianças e a dividir a atenção de seu amor com os enteados. Muitas dúvidas pairavam no ar e não poderia ser diferente, pois, Celina nunca tivera filhos e teria que aprender a lidar com estes.

- Será que os filhos de Reinaldo vão me aceitar? Essa pergunta martelava a cabeça de Celina dia e noite.

 Difícil responder logo de cara, disse sua mãe. Eu posso dizer que quem assume uma relação assim, deve ter muita coragem, paciência e tato para agradar os dois pequenos. Celina não poderia reclamar, pois sabia que Reinaldo era viúvo e tinha dois filhos, desde a primeira vez que o viu.

No entanto, o amor estava no ar com muitos sonhos para serem vividos e ela esperaria ele tomar a atitude de promover o encontro com as crianças, para poder entender a vida que levaria no futuro como esposa e mãe substituta; colocou a moça com um sorriso no rosto.

Um texto de Eva Ibrahim. Continua na próxima semana.

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

'AH! COMO AS ENTRELINHAS SÃO IMPORTANTES! É NELAS QUE ESTÃO ESCRITAS AS COISAS QUE SÓ A ALMA PODE ENTENDER!. RUBEM ALVES -- ABRA O SEU CORAÇÃO PARA A VIDA. EVA IBRAHIM.

DE MÃOS DADAS
CAPÍTULO VINTE E DOIS
            Os encontros para conversar passaram a fazer parte da rotina de Celina e Reinaldo. Entretanto, eles procuravam não aparecer em lugares públicos, onde houvesse gente conhecida. Poderiam ser alvo de comentários maldosos, pois ainda era cedo para novo compromisso e não havia nada entre eles.

            Reinaldo precisava viver o tempo de seu luto integralmente, em respeito aos filhos e a família de Amanda. Os encontros aconteciam durante a semana no final da tarde. E, com o passar do tempo, a necessidade de estar com o outro foi crescendo e os dois viúvos se viam quase todos os dias.

Foram vistos de mãos dadas por parentes e amigos. E, questionados por familiares diziam que eram apenas amigos. No entanto, a vida continua e juntaram suas dores para poder sobreviver. Estavam se conhecendo, trocando experiências e apoio diante de tantos sofrimentos vividos por ambos. Reinaldo sorria e ficava alegre somente quando ia ver os filhos, queria tê-los novamente em sua casa, porém, precisava trabalhar e não poderia cuidar deles.

 No sábado à noite marcaram um encontro para ir ao cinema; se conheciam bem agora. Estavam acima de apertos de mãos; na verdade estavam iniciando um namoro. Fazia oito meses que acontecera a passagem de Amanda, parecia uma eternidade para o marido. Precisava de alguém para ouvi-lo ou enlouqueceria, era o que Reinaldo dizia a si mesmo, tinha perdido o acanhamento para marcar os encontros com Celina, que era um bálsamo para suas aflições.

Se falavam por telefone quase todos os dias. Reinaldo ficava esperando o telefone tocar e Celina também, estavam apaixonados. Quando ele não estava pensando nela, pensava em Amanda e pedia desculpas por estar envolvido com outra mulher tão depressa. Não a esquecera, entretanto, fazia muito tempo que ele não tinha prazer sexual e Celina o deixava vislumbrar uma vida de amor e ternura, que o fazia perder o sono.

Saíram do cinema e seguiram de mãos dadas até o automóvel, estavam envoltos em um clima romântico por causa do filme que tinham assistido. Havia muito desejo entre o casal e o sentimento de que algo deveria acontecer. Celina se aproximou dele deixando que seus cabelos macios tocassem levemente a barba feita de Reinaldo e, os braços dele rodearam seus ombros. Ele percebeu que ela também o desejava e com um olhar intenso disse que iriam à um lugar tranquilo. Os lábios dos dois se tocaram, fazendo-os sentir o calor do primeiro beijo apaixonado. Ele a ouviu murmurar, não sabia o quê, mas, era animador e reconfortante. Seguiram para desfrutar do amor que havia entre eles.

Entraram no quarto do motel com Reinaldo abraçado e pressionando o corpo de Celina, que aceitava e correspondia com satisfação. Ambos tinham mergulhado fundo no desespero e na dor e agora sentiam intensa emoção e prazer. A alegria de celebrar o amor estava de volta em uma entrega total.

Depois do amor, dormir abraçados, sem medo de ser feliz, essas coisas simples que foram deixadas para trás por circunstâncias diversas, trouxeram Reinaldo e Celina de volta ao mundo dos vivos. Não estavam mais sós, cada um esperava ansiosamente pelo outro.

Quando acontece o amor, é importante ressaltar que, as pessoas ficam juntas por necessitarem umas das outras e pela satisfação que sentem em compartilhar um mesmo sentimento, um mesmo ideal. É suprir a carência de passear de mãos dadas, dar e receber carinho, projetar um futuro em comum.
Um texto de Eva Ibrahim.


Continua na próxima semana.

sexta-feira, 7 de agosto de 2015

"ABRAÇO É A ÚNICA COISA DO MUNDO QUE QUANTO MAIS APERTADO ELE É, MAIS ALÍVIO ELE DÁ".-- HUGO RODRIGUES-- O CHORO DIMINUI A INTENSIDADE DA DOR. EVA IBRAHIM

DESABAFO
CAPÍTULO VINTE E UM
           Reinaldo continuou contando à Celina todo o seu sofrimento com a morte de sua esposa. Ele ficou só e com duas crianças para cuidar. Amava os filhos, porém, naquele momento precisava refletir para encarar todas as responsabilidades decorrentes da nova situação. Deixara Larissa e Vitor com a avó materna e retornou para sua casa.

          Uma casa semiabandonada, sem vida e cheia de recordações. As boas lembranças pareciam distantes, enquanto as ruins estavam por toda parte. Uma fotografia do casal abraçado e feliz estava sobre o aparador; o rapaz pegou a foto e por um momento fixou seu olhar no sorriso de Amanda. Então, chorou desesperadamente; sua amada não existia mais. Sentiu-se o mais desamparado dos homens; não havia futuro para ele, queria embebedar-se.

Abriu a geladeira e pegou uma garrafa de vinho que estava ali fazia tempo. Em seguida se jogou no sofá e tomou a bebida gelada, sorvendo com a boca no gargalo. Bebeu até o último gole e depois caiu no sono ali mesmo. Estava exausto, não queria pensar em mais nada, somente dormir e esquecer.

Reinaldo acordou com o Sol batendo em seu rosto e com a cabeça latejando. Estava com fome, então, levantou-se para procurar comida, cambaleou e segurando nos móveis abriu a geladeira. Havia pouca coisa ali, pois a família ficara na casa da sogra, desde o agravo da doença de Amanda. Tomou um pouco de água e foi tomar banho, comeria na padaria antes de ir trabalhar.

O banho foi para lavar sua alma, além do corpo, sentia-se sujo depois de tantos dias passados no Hospital. Precisava respirar e tomar coragem para conversar com os filhos sobre a partida prematura da mãe. Essa missão era de sua responsabilidade e não queria traumatiza-los.

Foi direto para o trabalho e a noite passaria na casa da sogra para ver os filhos. O dia transcorreu normalmente, apesar de perceber olhares de piedade da maioria dos funcionários da Drogaria. Entretanto, procurou se concentrar no trabalho para não pensar em nada relacionado aos últimos acontecimentos.

Conversou com as crianças depois do jantar, Larissa e Vitor concordaram que a mãe fora morar com Deus e foram brincar, não entenderam a extensão da informação. Reinaldo agradeceu a Deus, não aguentaria ver os filhos chorando. Em seguida foi para sua casa; as crianças ficariam com a avó. Rute gostava de ter os netos por perto, assim, não tinha tempo de pensar na morte da filha.

                 Era isso que ele tinha a dizer sobre tudo que vivera nos últimos meses. Estava vivendo um dia de cada vez até encontra-la, disse à Celina, que o ouvia atenta. E, a partir daquele dia sentiu que, ainda havia uma esperança no ar. O rapaz, com os olhos cheios de lágrimas, abraçou Celina.

             - Tenha paciência comigo, isso tudo vai passar, então, poderemos falar sobre nós.

                 Ela concordou com a cabeça, sentia um grande carinho por ele; o seu luto já estava no final, porém, Reinaldo ainda estava muito machucado.
Um texto de Eva Ibrahim.

Continua no próximo capítulo.

sexta-feira, 31 de julho de 2015

"ABRAÇAR É DIZER COM AS MÃOS O QUE A BOCA NÃO CONSEGUE, PORQUE NEM SEMPRE EXISTE PALAVRA PRA DIZER TUDO".MÁRIO QUINTANA -- ABRA O SEU CORAÇÃO PARA UMA NOVA VIDA. EVA IBRAHIM

EU PRECISO DE COLO

CAPÍTULO VINTE
Os dias se arrastavam e Amanda não dava sinais de melhora. Algumas vezes chamava os filhos e os acariciava dizendo palavras de amor; entretanto, logo seus olhos enchiam-se de lágrimas e a avó os tirava dali. As crianças eram pequenas para compreender o drama que a família estava passando.

Larissa tinha somente cinco anos, no entanto, sabia que sua mãe estava doente e procurava ficar por perto para atende-la em suas necessidades. Levava água para a mãe e a ajudava a tomar os remédios, mas o pequeno Vitor se agarrara a avó.

- A minha mãe está sempre dormindo - dizia correndo pelo jardim.

Reinaldo precisava cuidar da sua Drogaria para suprir as necessidades da família. Com a doença da esposa as despesas aumentaram muito. Amanda passava mal após as quimioterapias e precisava ser internada no Hospital. A paciente vomitava muito e sentia dores horríveis. Os médicos estavam pessimistas, o caso era complicado e não havia progressos; estavam perdendo a paciente para o câncer. Ela recebia tratamento paliativo para amenizar suas dores e controlar o vômito; nada mais podia ser feito.

O rapaz continuava relatando os fatos com amargura, falava entre linhas para segurar as lágrimas e engolir o choro. A história da doença de Amanda doía como se fosse uma faca cravada em seu peito, disse para Celina enquanto deitava sua cabeça no colo da moça. Ficou ali por um bom tempo e baixinho sussurrou:

 - Eu quero colo, estou carente e só você pode me ajudar.

A moça, emocionada, lhe deu um breve beijo, não sabia o que dizer para uma situação tão definitiva. Ela também precisava de colo, porém, ambos necessitavam de calma; aquilo tudo tinha necessidade de passar para que suas ideias clareassem; estavam sob forte emoção e não era hora de decisões.

          O luto deve ser vivido em toda sua amargura; são dias escuros cheios de lembranças de um passado que não volta mais. No entanto, às vezes é preciso desabafar ou a depressão se instala e a vida perde o sentido. O melhor caminho é chorar com quem conhece a mesma dor, a mesma solidão e a falta de futuro.   
                
          A dor sofrida deixa a pessoa arredia; não quer falar sobre o assunto, pois, é como se tocasse na ferida aberta. No entanto, quando encontra alguém para partilhar a mesma dor, aquieta o coração percebendo que o sofrimento não é exclusividade de ninguém e aceita uma nova tentativa. É o começo de aceitação de uma dor profunda, que deve e precisa ser deixada de lado.

         Juntar duas pessoas que trazem consigo histórias pesadas de dores intensas é uma maneira de amenizar a dor e afastar a tristeza gerando aceitação e conforto. Assim, podemos afirmar que é a conquista da serenidade pelos caminhos mais difíceis.

Reinaldo não tinha tempo para dar assistência aos filhos, vivia entre a Drogaria e o Hospital; os filhos ficavam aos cuidados das avós, ora uma ora outra. Amanda estava sofrendo e ele nada podia fazer para amenizar a situação; ela pressentia que iria morrer e pedia que ele cuidasse bem das crianças. Durante um mês inteiro, Reinaldo passou as noites sentado em uma poltrona ao lado da cama de sua esposa, que definhava a olhos vistos.

Foi em uma manhã de sábado que Amanda pediu para ele chamar o Padre, ela queria receber a extrema unção; estava perdendo a luta e entregando sua vida a Deus. Depois da bênção os dois choraram abraçados e naquela madrugada a última chama de vida se apagou para Amanda.

Um texto de Eva Ibrahim.
Continua na próxima semana.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

"A LÁGRIMA MAIS PESADA É AQUELA QUE NÃO CAI." AUTOR DESCONHECIDO -- NÃO TENTE SER FORTE, APENAS SEJA VERDADEIRO" EVA IBRAHIM


                     CÂNCER DE MAMA

                                   CAPÍTULO DEZENOVE
     Reinaldo continuava contando, visivelmente emocionado, o drama de Amanda. Dos exames para a biópsia foi rápido; o médico tinha pressa em fechar um diagnóstico, pois temia o pior. Depois de alguns dias de angustia veio o veredicto final: Câncer de Mama invasivo. Duas lágrimas rolaram de seu rosto. Ele as enxugou com o dorso da mão; em seguida tomou um gole de suco ou não conseguiria prosseguir. O diagnóstico soava como uma sentença de morte, soluçou o rapaz, o que depois se confirmou.

Celina cobriu as mãos de Reinaldo com as mãos dela em sinal de solidariedade. Na verdade, queria abraça-lo e afagar seus cabelos, conhecia todo aquele sofrimento, então disse:
 - Chega dessas lembranças dolorosas, vamos caminhar e falar de outros assuntos; outro dia você continua.

          O rapaz concordou, estava muito abalado, precisava de ar puro. Ainda estava fragilizado, os acontecimentos da passagem de Amanda eram recentes; havia um buraco em seu coração. Pagou a conta e saiu segurando a mão de Celina, que se deixou conduzir para um parque onde havia muita gente e crianças se divertindo.

           Ficaram um tempo parados contemplando a vida e a alegria que havia lá fora. Carrinhos de pipoca, roda gigante, balões e muitas crianças sorrindo em meio ao vai e vem das pessoas; precisavam contemplar a vida para ter esperanças.

Em um certo momento ele a puxou para si e aconchegou seu rosto em seu peito, alisando seus cabelos. Ela se deixou ficar; aquele parecia ser um lugar seguro e aconchegante, de onde ela não gostaria de sair, nunca mais. A noite estava linda e ambos caminhavam como se fossem íntimos; estavam unidos pela dor da perda. Andaram a esmo, tomaram sorvete e riram de algumas coisas, depois foram para casa, estavam aliviados. Entretanto, não se tocaram como namorados; ainda, era muito cedo, traziam no peito corações partidos.

Depois de três dias, Celina não se conteve e telefonou para Reinaldo, que ficou de encontrá-la na saída da escola, gostava de sua companhia. Sentados no banco da praça, o rapaz prosseguia em sua história com Amanda. Agarrada aos filhos sua esposa chorou e depois pediu para o marido distraí-los; não queria assustá-los.

Amanda sabia que a sua situação era delicada, entretanto, seguiria todas as orientações médicas; queria ver os filhos crescerem. Começou, então, uma grande luta contra o câncer. Primeiro veio a radioterapia para diminuir o nódulo e depois a cirurgia radical com a retirada dos linfonodos. A moça perdeu uma mama e iniciou a quimioterapia. Cada sessão do medicamento era seguida de vômitos e dias de intensa fraqueza, que a fazia recusar comida. Os seus cabelos começaram a cair e seu corpo foi perdendo massa muscular.

Em três meses, Amanda parecia apenas uma sombra da moça bonita com quem Reinaldo se casara. Fecharam a casa e foram para a casa da mãe dela. Rute, a mãe de Amanda, cuidava das crianças para a filha poder descansar, pois ela passava a maior parte do tempo deitada; não tinha ânimo para nada.

A cicatriz cirúrgica apresentava vários pontos de necrose e infecção. A outra mama ficou entumecida, onde abriram várias feridas, que só aumentavam, apesar dos curativos e cuidados dos profissionais de saúde.  No sexto mês, o médico foi taxativo:
 - Estavam perdendo a luta para o câncer, que era dos mais agressivos. A paciente estava piorando a olhos vistos e não respondia ao tratamento.

Amanda parecia uma flor murcha aninhada na cama, mal podia falar; se entregara à doença. Reinaldo estava desesperado e procurava atender a todos os seus desejos, pois via nos olhos da esposa que havia poucas esperanças de restabelecimento.

Duas lágrimas teimaram em rolar pelo seu rosto e Celina, delicadamente, as aparou com a mão. O rapaz, comovido, segurou a mão da moça e a beijou em agradecimento.
Um texto de Eva Ibrahim.

Continua na próxima semana.

sexta-feira, 17 de julho de 2015

"PARA O CAMINHO: LUZ; PARA A VIDA: FORÇA; PARA O AMANHÃ: FÉ E PARA TOMAR A FRENTE DE TUDO: DEUS. YLA FERNANDES-- FELIZ É AQUELE QUE NÃO DESISTE DE SEUS SONHOS. EVA IBRAHIM.

                       AFINIDADE
CAPÍTULO DEZOITO
   Celina estava amargurada, aquele dia lhe trazia muitas recordações. As lembranças tristes se sobrepunham as alegrias vividas naquela data e ela trazia os olhos cheios de lágrimas quando se voltou para Reinaldo. O rapaz, condoído com a situação, passou os braços ao redor do corpo de Celina e a conduziu para fora da Igreja. Rapidamente adentraram à uma lanchonete e quando a moça se deu conta da situação, já estavam sentados em uma mesa nos fundos do estabelecimento.

 Era um lugar reservado, onde eles poderiam manter um diálogo, longe dos olhos do mundo. Ele compreendia sua dor, disse Reinaldo, pois padecia da mesma amargura. Pediram um suco, precisavam aliviar o nó que traziam na garganta. O rapaz queria ouvi-la e depois lhe contaria sua história.

A moça contava sua desventura e Reinaldo aquiescia com a cabeça; deixou que ela chorasse sempre que a emoção falava mais alto. Na realidade, naquele lugar aconteceu um monólogo, pois, Celina falava e o rapaz ouvia atentamente. A moça lavou sua alma, pôs para fora todos os tormentos, que havia guardado durante aquele ano. Quando terminou, olhou para o rapaz e suspirou.

– Como conseguira falar tudo que sentia para um estranho?

 Ele segurou sua mão e disse que não era mais um estranho, uma vez que conhecia sua história. Celina olhou para o relógio e disse que deveria se apressar, já estava tarde. Sentiu-se culpada, parecia estar traindo Fernando. Reinaldo concordou dizendo que ela poderia ir, mas deveria marcar um novo encontro com ele para ouvir a sua história. Ela sorriu e aquiesceu, poderiam se ver no dia seguinte; também gostara de conversar com ele.

Finalmente ela conseguira falar de seus sentimentos e sentia-se aliviada. Aquele homem conhecia a dor da qual ela falava, estava escrito em seus olhos. Eram parceiros na desventura e tinham uma estranha afinidade. Ela sentia-se mais leve e ansiosa por ouvir a história dele; queria ajuda-lo também.

No horário marcado os dois se encontraram na lanchonete e foram sentar-se na mesma mesa, parecia que desde sempre marcavam encontros ali, naquele lugar. Tudo estava igual ao dia anterior, os dois corações pulsavam forte dentro do peito; havia uma atração mágica entre eles.

Reinaldo, segurando a mão de Celina começou a contar os últimos meses de sua vida. Casara-se há cinco anos com Amanda, estavam apaixonados e logo encomendaram a pequena Larissa; uma criança linda. Quando a filha completou dois anos nasceu Vitor, que agora tinha dois anos de idade. Formavam um casal feliz, tinham uma família linda, saudável e estabilidade financeira. Reinaldo era farmacêutico e dono de uma drogaria.

Ele, Amanda e as crianças conseguiram tirar uma semana de férias e foram para a praia. Estavam felizes descansando em um Hotel maravilhoso em frente ao mar. As crianças adoravam andar na orla da praia recolhendo conchas, que a água do mar despejava na areia. No terceiro dia estavam cansados e felizes; entretanto, sua esposa saiu do banho com uma expressão assustadora e quando ele quis saber o motivo ela começou a chorar.

Entre soluços, ela conseguiu falar que encontrara um nódulo no seio esquerdo durante a apalpação. Reinaldo a aconchegou em seus braços e disse que procurariam um médico e resolveriam a situação. Ela gemia e dizia que duas tias, irmãs de sua mãe, haviam morrido de câncer de mama, estava na genética da família.

               Naquele mesmo dia voltaram para casa num clima pesado; Amanda pressentia algo de ruim, que a deixava transtornada. A consulta foi marcada e Reinaldo acompanhou a esposa. O médico apalpou o nódulo e fez uma cara estranha, que deixou o casal apreensivo. Em seguida pediu uma porção de exames: de imagem, de ultrassom e de sangue, dizendo ser precoce dizer alguma coisa, queria ver os exames.
Um texto de Eva Ibrahim.

Continua na próxima semana.

sexta-feira, 10 de julho de 2015

"É O TEMPO DA TRAVESSIA E, SE NÃO OUSARMOS FAZÊ-LO TEREMOS FICADO, PARA SEMPRE, A MARGEM DE NÓS MESMOS". FERNANDO PESSOA-- É LÁ DE CIMA QUE VEM SUA FORÇA!!! EVA IBRAHIM

ATRAVESSAR A PRÓPRIA SOLIDÃO
                                           CAPÍTULO DEZESSETE
              A missa prosseguiu solene em intenção aos entes queridos de vários paroquianos. O organista tirava notas doídas do instrumento musical. Havia tristeza no ambiente carregado de orações e emoções contidas. Quando a celebração terminou, alguns familiares pararam para cumprimentar conhecidos e a sogra de Celina se afastou um pouco da moça. Reinaldo se aproximou e estendeu a mão para cumprimenta-la dizendo que, sentia muito por tudo que acontecera com Fernando.

             Celina respondeu dizendo que também sentia pela morte prematura de Amanda. Em seguida, a moça ruborizada, pediu licença e foi procurar a sogra. As duas mulheres saíram da Igreja mais conformadas; não estavam sós no sofrimento da perda. A busca de Deus conforta e proporciona atravessar a própria solidão gerando conforto e menos sofrimento.

             Viver o silêncio exterior, que é importante, mas fundamentalmente o silêncio interior, que age como abertura quando descobrimos que a nossa verdadeira identidade se desvenda na presença do mistério de Deus, que nos habita. A solidão, tantas vezes sentida como dor intensa, quando atravessada abre uma nova porta para a vida.

Celina voltou para casa pensativa; não tirava da cabeça o gesto de Reinaldo. Ele conhecia a história dela e também estava sofrendo. Em seu íntimo sentiu vontade de consolá-lo, já amargara sua cota de sofrimento e agora sentia-se mais leve para lhe dizer que, “afinal a vida continua”.

A viúva estava mais disposta, queria sair e andar a esmo; havia sofrido muito e o tempo começava a anestesiar sua dor. Ir à missa tornara-se um hábito e consequentemente as antigas amizades voltaram a chama-la para sair. No entanto, o tempo não para e nove meses da morte de Fernando e um ano de casamento se passaram; uma data impossível de não se lembrar.

Celina foi à Igreja para aliviar seu coração cheio de amargura e quando adentrava ao local, apesar de ser dia de semana, viu que já havia algumas pessoas ajoelhadas diante do Santíssimo, fazendo suas orações. Foi juntar-se a elas e quando ajoelhou viu Reinaldo no banco detrás. Ele a cumprimentou com a cabeça e um leve sorriso; seu coração disparou.

Ambos ficaram ajoelhados, rezando com o pensamento disperso, um pensava no outro; havia uma ligação de perda entre eles. Depois de um certo tempo, ela saiu apressada; sentia seu rosto ferver. Reinaldo foi atrás e quando a alcançou disse que precisavam conversar; era inevitável aquele encontro. Tinham um assunto em comum, estavam viúvos e carentes. Precisavam de um ouvinte que entendesse de perdas; que houvesse experimentado o amor e suas surpresas, a dor e seus enganos.
Um texto de Eva Ibrahim.
Continua na próxima semana.


sexta-feira, 3 de julho de 2015

"UM DIA APÓS O OUTRO, É ASSIM QUE A VIDA VAI SEGUINDO; VAI MUDANDO, VAI VIRANDO PASSADO". AUTOR DESCONHECIDO-- E, O FUTURO A DEUS PERTENCE. EVA IBRAHIM

TEMPOS DIFÍCEIS

CAPÍTULO DEZESSEIS

         A cada dia que Celina acordava em sua antiga cama, lhe dava a certeza de que estava irremediavelmente só. Ela conseguia dormir, somente após tomar calmantes. Então, mergulhava num sono profundo onde não havia lugar para seus fantasmas; vivia dopada. Muitas vezes pensou em ir juntar-se ao marido, porém, tinha medo da ira de Deus. Não queria causar mais sofrimento aos seus pais e temia o inferno. Motivos mais que suficientes para continuar viva.

           Um mês, dois, três e ela deveria retornar ao trabalho. O psicólogo dissera que já era tempo de cicatrizar a ferida e ela precisava de ocupação. A moça concordou, voltaria à escola e tentaria agir normalmente, "afinal a vida continua", todos diziam isso; parecia um mantra que alguém inventou para ela.

               Celina tinha pensamentos contraditórios, pois ao mesmo tempo que queria esquecer todo o sofrimento por que passara, queria relembrar os momentos felizes e eles acabavam se misturando. No entanto, ela não poderia simplesmente apagar tudo e recomeçar como se nada tivesse acontecido. Aquela era a sua história de amor, referência de sua juventude; teria que aprender a conviver com a realidade. Tornara-se uma mulher solitária, que procurava uma saída para se conformar com a situação.

               As crises de choro diminuíram, porque ela não tinha muito tempo para tristezas; as aulas tomavam grande parte de seus dias. O difícil era aguentar os finais de semana e feriados, quando ela ficava em casa pensando em seu amor. Sua família tentava arrasta-la para passeios e viagens, porém, ela se negava; dizia que estava de luto.

No sexto mês da morte de Fernando a sogra procurou por ela para irem à missa juntas. A mãe sentia muita saudade do filho e encomendara a missa para aliviar um pouco sua dor. A moça concordou, ele ficaria feliz se as visse juntas. 

            Sentadas na segunda fila dos bancos da Igreja, podiam ver toda a cerimônia de perto. O órgão começou a tocar e o pároco deu início ao sermão sobre os mortos. Finalizando a pregação, referiu-se a um caso recente em que uma jovem havia morrido de câncer. Em seguida, externando suas condolências à família, apontou para o marido que estava na primeira fila. Era a missa de sétimo dia da morte de Amanda, em seguida ele elencou todos os mortos que tinham a missa como intenção.

           E, quando falou o nome de Fernando, o rapaz olhou para trás e cruzou o olhar com Celina. Com os olhos marejados de lágrimas deu um sorriso de cumplicidade; como se dissesse que ela não fora a única a sofrer uma perda tão grande.

            Ela o conhecia, mas não sabia da doença de sua esposa e nem que ela havia morrido. A moça estava surpresa, pelo que ela sabia eles tinham filhos.
          - Reinaldo deveria estar sofrendo muito, coitado! Suspirou a moça olhando para sua sogra.
Um texto de Eva Ibrahim.

Continua na próxima semana
MEU MUNDO REINVENTADO.

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