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sexta-feira, 6 de setembro de 2013

"O CONSOLO"- TERCEIRO CAPÍTULO DE "ESTAÇÃO SOLIDÃO". "SE A GENTE CRESCE COM OS GOLPES DUROS DA VIDA; TAMBÉM PODEMOS CRESCER COM OS TOQUES SUAVES NA ALMA". CORA CORALINA. AS VEZES, PRATICAR O DESAPEGO É A ÚNICA SAÍDA". EVA IBRAHIM..

                                              O CONSOLO
                                              CAPÍTULO 3

A VELHA IGREJA. 
                                                                                                     29/01/1983  
Estou vendo a Igreja, a mesma que em criança,
O salgado gosto do Batismo senti
Quando a vida era só esperança,
Nos braços da madrinha que me trouxe ali,
Enrolado em um xale azul cheio de trança.
A bênção Divina foi dada com muita pujança.

Estou vendo a Igreja, a mesma que em moço,
Com minha noiva ali me ajoelhei,
Eu e ela trocamos aliança,
Naquele dia de tanto alvoroço.
Tive em meus braços aquela que muito amei,
Coroando um grande amor com muita festança.

Estou vendo a Igreja, a mesma em que tristonho,
Em prantos, para ali transportei,
Inerte, pálida, sem esperança,
A mesma noiva, que o corpo deponho,
Gelada e morta, Oh! Como chorei,
Partiu me deixando somente a lembrança.

Estou vendo a Igreja, a mesma que em sonata,
Tanta canção á Virgem Maria ouvi
Coros de vozes de adultos e criança,
E o órgão dedilhado com muita confiança,
Tocavam minha alma abstrata,
Trazendo-me doce frenesi.

Estou vendo a Igreja, agora agonizante,
Era pequena, mas muito aconchegante,
Já sufocada por uma nova Matriz,
Levando doces e tristes lembranças,
Com minha alma já caminhando,
Revendo o tempo em que fui feliz.

Eu vejo a Igreja em seu dia derradeiro,
Sinto meu corpo também, já no seu temor,
O que antes era força e coragem,
Tornaram passos lentos e tremor,
Tudo na vida é breve e passageiro,
Só permanece para sempre o amor.

 (ALI-BABÁ)

        O consolo chegara de maneira muito estranha, porque depois do estouro da pedra amarela, tudo na vida de Antonio tornara-se mágico e atemorizador. Com a carta na mão ele tentou com o olhar, vislumbrar novamente o mendigo, mas, já não estava mais ali. 
        - Quem seria aquele homem que lhe trouxera uma mensagem que falava de sua dor, seria um enviado de Deus querendo consolá-lo? Um anjo disfarçado de maltrapilho?
       -Tudo bem, pensou Antonio, ele guardaria aquela carta e sempre a leria quando estivesse muito solitário, pois havia alguém sofrendo como ele e há muito tempo, pela data da carta. Lá no fundo do seu coração brotou uma nostalgia pelo seu passado com Verônica; era estranho, lhe trazia conforto. Guardou o papel e seguiu em frente, estava menos triste.

A solidão agora era sua companheira diária. A magia maléfica exercida em sua vida por uma pedra amarela ele queria exorcizar; nada mais ela poderia tirar dele, pois nada tinha; estava sozinho. 
Sentado no banco da praça, Antonio pensava em como tudo aquilo havia começado; talvez fosse bom rever o fato que tanto o atemorizava. 
Um texto de Eva Ibrahim. 
Continua na próxima semana.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

"O VIÚVO". SEGUNDO CAPÍTULO DE "ESTAÇÃO SOLIDÃO" RECOMEÇAR FAZ PARTE DA VIDA. EVA IBRAHIM..

                                             O VIÚVO.    
                                          CAPÍTULO 2.   
          Só conseguiu melhorar depois que chegou á sua casa e tomou um banho, assim mesmo foi dormir sem comer, nada passava em sua garganta; parecia obstruída. Sentia nojo da comida, só pensava nos ferimentos de sua amada. Sua irmã queria levá-lo com ela, mas ele não quis; teria que enfrentar a situação. Longos dias se passaram e sua angustia parecia parada na boca, mal conseguia engolir algum salgado ou refrigerante. A morte o chocara e seu estômago embrulhava sempre que pensava no acidente. Sua aparência era de abandono total. Quando se olhou no espelho ficou assustado, parecia um andarilho, então, o homem tomou um choque de realidade. Teria que fazer a barba e cortar os cabelos para poder sair de casa.
           Na verdade Antonio estava deprimido, tornara-se um homem taciturno. Em apenas três semanas de afastamento do trabalho, concedido pela sua empresa, pois, tinha férias para tirar, perdera aquele jeito bonachão, já não ria como antes, estava preso a sua dor. Ficava imaginando que todas as pessoas tinham problemas, com isso procurava aliviar o peso da ausência de sua esposa. Criara uma fuga para seu desarranjo emocional; uma válvula de escape para não enlouquecer. Às vezes pensava em suicídio, porém, lembrava-se do inferno, que sua mãe dizia ser o lugar para onde os suicidas eram levados e ele tinha medo de queimar no fogaréu.
         Os amigos diziam que era a vontade de Deus, mas era difícil compreender aquilo.
        –Será que Deus queria que ele ficasse sozinho? Sempre pensara que Deus fosse uma figura paterna e seu pai, se estivesse vivo, não gostaria de ver o filho sofrendo, mas, quem pode entender a vontade de Deus?
         Estava tão triste e não queria se indispor com Deus, porque ainda precisava muito dele. Em seu desespero deu um murro na mesa da cozinha, onde costumava jantar, que seus dedos sangraram. O homem estava com ódio do mundo e só pensava na maldita pedra amarela; queria encontra-la para jogar nas águas sujas da represa de onde fora retirada.
Verônica se fora prematuramente, ainda não era hora, somente agora se dera conta da importância da mulher. Ela lavava suas roupas, mantinha a casa limpa e cuidava da alimentação. Ás vezes lhe afagava os cabelos ou massageava os pés e lhe dava beijos, muitos beijos! Era uma mulher brava, com voz estridente, entretanto, quando queria era carinhosa e meiga. Dormiam abraçados e agora que a cama estava vazia ele dormia no sofá da sala.
         Casaram-se por amor e foram fiéis, jamais pensaram em separação. Não tiveram filhos da maneira convencional e nunca procuraram o médico para saber se havia algum problema, apenas aceitaram como sendo a vontade de Deus e pronto, ninguém tocava no assunto. Há um mês ele vivia sozinho e angustiado naquela casa silenciosa. Comia pouco, ficava a maior parte do tempo deitado, não queria conversar ou ver gente.
          Nunca mais beijou ou foi beijado; sentia pena de si mesmo. Não tinha paciência para arrumar outra mulher e não seria justo com Verônica; suas coisas ainda estavam na casa.
         Era um homem triste; sua vida perdera o sentido. Não sabia o que fazer de suas noites, que eram longas e cheias de pesadelos, por isso criava personagens cheios de problemas. Ficava horas imaginando tragédias iguais ou piores que a sua, depois adormecia exausto.
        Chegava a sentir saudades das brigas com Verônica; aqueles bate-bocas eram rotineiros e não deixavam mágoas. Antonio tinha que confessar que depois de algumas discussões tivera vontade de esganar a mulher, dizia que ela falava demais. Ele ficava enfurecido, depois passava; agora, daria tudo para ouvir aquela voz de taquara rachada. Queria a mulher de volta, ela foi levada contra sua vontade.
          A explicação do médico não saia de sua cabeça.
         -"Não teve jeito de salvá-la, tivera múltiplas fraturas pelo corpo e hemorragia interna, que não conseguiram estancar".
 Foi o que o médico disse a ele, para justificar a morte de Verônica. Fora atropelada e seus ferimentos eram gravíssimos; Antonio ainda não conseguia entender como a mulher não vira o coletivo.
         -Será que estava ficando cega? Ela nunca se queixou!
         O destino fora injusto com ele, pensava o homem entristecido, sem a mulher a vida não tinha nenhuma graça; estava perdido, se tornara um guerreiro sem causa. Continuava trabalhando para ter aonde ir todos os dias, mas, sua vontade era dizer uns desaforos para seu chefe e cair fora daquele empreguinho, que sua esposa vivia criticando. A mulher tinha razão, aquela turma do escritório era um “pé no saco”, e o chefe, um grande fingido. Só agora ele entendia porque ela não queria ir ás festas de fim de ano, que sempre terminavam em brigas, discussões e até agressões físicas.
          Antonio pegava o ônibus para voltar do trabalho ou caminhava observando ás pessoas nas ruas. Ele imaginava quais seriam seus problemas, assim passava as horas e não se sentia tão infeliz. Tornara-se um homem introspectivo e desleixado, perdera o hábito de tomar banho diariamente, só de vez em quando. Abusava do desodorante para disfarçar; a casa estava uma bagunça e suja. Precisava criar coragem e tirar tudo que lembrasse a falecida. Estava com quarenta e oito anos e uma vida pela frente, mas, perdera a vontade de viver.
         Numa tarde de sábado ele saíra sem destino e quando deu por si estava sentado em um banco dentro da Igreja em que se casara com Verônica. A última vez em que ele esteve ali havia construção por toda parte; a pequena Igreja tornara-se uma grande Matriz. Estava muito diferente, mal conseguia imaginar a sua amada entrando naquela Igreja vestida de noiva.
        O silêncio foi quebrado pelo voo rasante de um pássaro. A paz que reinava naquele local com certeza era a presença de Deus. Antonio ficou sentado ali durante horas pensando em seu passado e seus olhos finalmente encheram-se de lágrimas. Chorou muito até lavar sua alma e quando saiu estava aliviado; tirara um peso de suas costas.

 Precisava se agarrar a alguma coisa ou desistiria de viver; sua vida se tornara insuportável. Era um homem sem futuro, sem metas, sem compromisso; profundamente infeliz. Desceu a escadaria da Matriz pensando que sua última vontade seria achar a pedra amarela e jogá-la de volta no seu lugar de origem: a represa. Tinha certeza que suas desgraças eram oriundas daquele estouro, que liberou alguma coisa muito ruim. Sentia-se culpado pela morte de sua esposa, se soubesse o poder da pedra, jamais a teria levado para sua casa.
Quando saia da Igreja, como por encanto, um velho maltrapilho lhe pediu uma moeda e lhe deu uma folha de papel, que ele pegou a contragosto e sentando-se no banco da praça abriu e leu:
Um texto de Eva Ibrahim.

Continua na próxima semana.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

"ESTAÇÃO SOLIDÃO", UMA HISTÓRIA CONTADA EM QUINZE CAPÍTULOS. O MISTÉRIO DA PEDRA AMARELA. O QUE PASSOU, PASSOU, NÃO DEIXE QUE O PASSADO SE TRANSFORME EM UM FANTASMA. EVA IBRAHIM.


                   ESTAÇÃO SOLIDÃO
                    CAPÍTULO 1

           Quando Antonio voltou da licença nojo, falecimento de sua esposa, ele estava diferente; parecia mais velho. Os colegas o abraçaram em solidariedade e tentavam animá-lo, mas ele estava vivendo fora do ar; uma nuvem negra pairava sobre sua cabeça. Ele parecia perdido no tempo, havia muita tristeza no olhar e sua voz mal saia para agradecer ou, talvez fosse uma fuga para não pirar de vez. A morte viera de surpresa, nunca imaginara que sua mulher fosse deixá-lo tão rapidamente. Não tiveram tempo de despedir-se, nem mesmo um abraço ou um beijo conseguiu dar no rosto inerte de Verônica.
          A notícia chegou através de um policial que foi buscá-lo no trabalho. O homem enrolou a conversa e Antonio entendeu que teria que acompanhá-lo ao Hospital, que sua esposa estava passando mal. Mas, na verdade ela já estava morta e seu corpo fora levado para o necrotério, estava na geladeira de cadáveres. Antonio teria que aguardar o corpo ser liberado depois da autópsia. Ele só conseguiu ligar para sua irmã, que morava no interior, dizendo que sua mulher estava morta, depois entrou em choque.
         O homem, abalado pela notícia, sentou-se em um banco de pedra em frente ao necrotério e estranhamente não sentia fome ou sede, estava abobalhado. Ao olhar para o edifício fúnebre do Instituto Médico-Legal, ele sentia-se cansado e angustiado; queria esgueirar-se para um canto escuro; estava no fundo do poço. Antonio fazia um grande esforço para manter a cabeça erguida e perceber a extensão do prédio, que abrigava o corpo estraçalhado de sua esposa.
Ele não conseguia chorar e sua mente só pensava no passado bem distante, quando ele conheceu Verônica e apaixonou-se por ela. Uma morena vistosa, com um vestido rosa, balançando os cabelos cacheados, que passava por ele com um sorriso enigmático e convidativo.
A primeira abordagem, a dúvida que a moça lançara no ar:
        - Iria pensar se queria sair com ele ou não. A moça foi taxativa.
        Esperara durante uma semana para saber a resposta; a dúvida agia contra ele, porque o deixava nervoso. Depois viera o tão esperado consentimento para saírem juntos. Era o que ele conseguia pensar, a imagem ficava dançando em sua frente. Dessa vez o golpe fora fatal, a pedra amarela, mais uma vez, estava agindo em sua vida com seus poderes malignos. Dessa vez atingira seu peito, que estava sangrando de tanta dor.
        O dia do casamento e a emoção que sentira ao vê-la vestida de noiva, ainda disparavam seu coração. A festa no Salão paroquial da Igreja de Nossa Senhora da Conceição e a chegada á casa onde se entregaram de corpo e alma, enchia seus pensamentos. Amanheceram alegres e felizes; realizaram um sonho de amor. O homem podia sentir o perfume de alfazema que sua Verônica usava e o antigo desejo voltava; ele queria sentir seu calor. Depois de tantos anos ainda a amava, não podia ser verdade que a morte conseguira apanhá-la.
         O Sol já se punha no horizonte quando sua irmã Nalva chegou e o tirou dali. Ele nem percebeu que ficara por cinco horas aguardando o corpo; estava estático. A irmã dissera que eles poderiam seguir para o velório, a defunta estava liberada. Antonio só viu o caixão quando estava no carro fúnebre; o ataúde estava lacrado e mal dava para reconhecer sua mulher. Com o rosto muito inchado e o corpo coberto de flores amarelas, ela parecia uma estranha. O homem indagou o porquê de tudo aquilo e a resposta foi dura.
        -Sua esposa ficara toda moída debaixo do ônibus, fizeram o que deu, isto é, colocaram os pedaços que recolheram da melhor forma possível- Disse o encarregado de óbitos.
        O homem agia friamente e aquilo incomodava o marido desconsolado. Antonio quase desmaiou só em pensar no sangue jorrando debaixo do ônibus e sua esposa sendo retirada aos pedaços pelos bombeiros.
         Ele sentiu o estômago embrulhar com aquele cheiro de crisântemos da coroa de flores que seus colegas mandaram para o velório; estava enojado. O pessoal do trabalho, algumas vizinhas e sua irmã estavam ao lado do caixão. Ainda não sabia quem pusera o terço em cima da tampa da urna, pois estava lacrada.
         -Pensando bem, que diferença faria saber ou não-? Pensou Antonio.
Havia algumas pessoas estranhas ali no local entre familiares e amigos.
        -Será que eram conhecidas da mulher ou apenas curiosas?
Queria ficar sozinho, porém, teria que manter a postura de homem civilizado. Sentia-se sujo e fedido, ainda não tinha tomado um banho depois que recebera a triste notícia. Morte, sangue, médicos, necrotério, aquela situação gerava uma aversão no íntimo dele. O homem permanecia com sua aparência de viúvo intacta, como se estivesse dentro de uma armadura de horror.
        Queria vomitar, aquela situação era insuportável; esgueirando-se entre as pessoas ele foi saindo e quando adentrou ao estacionamento despejou o que tinha no estômago. Vomitou na roda do automóvel de seu chefe. Então, respirou profundamente; sentia-se melhor. Logo depois procurou uma torneira para lavar a boca e, ficou um tempo do lado de fora tomando o ar fresco da noite. Quando melhorou voltou para perto do caixão; já era tarde da noite e ele teria que permanecer ali, afinal aquela seria a última noite que teria sua esposa presente. Só o corpo estava ali, porque a alma dela deveria estar com Deus; o velho mistério rondava a cabeça de Antonio, mas, não queria pensar nisso.                                                
         A mais longa das noites, algumas pessoas rezavam o terço, outras aguardavam do lado de fora. O dia amanheceu cinzento, igual o coração do viúvo. Na verdade ele queria sumir dali, evaporar para não presenciar aquela situação deprimente.
Mais pessoas foram chegando para o cortejo fúnebre e Antonio parecia um zumbi, mais morto que vivo. Amparado pela irmã ele não conseguiu chorar, mas, tinha um nó na garganta. Seguiu o cortejo calado, estava morto por dentro.
        Jogou uma margarida, que alguém lhe deu, sobre o caixão da falecida para ela não voltar mais e descansar em paz. Depois saiu acompanhado da irmã, seguia a passos lentos até sentar-se no automóvel do colega, que o levaria de volta para casa. Finalmente poderia ficar só para sentir sua dor. Com um rápido olhar disse adeus á Verônica. Antonio estava só, não sabia o que fazer da vida.

Um texto de Eva Ibrahim.
Continua na próxima semana. 

sábado, 17 de agosto de 2013

"HÁ TANTA SUAVIDADE EM NADA DIZER E TUDO ENTENDER". FERNANDO PESSOA---O QUE FAZ OS OLHOS BRILHAR, TOCA O CORAÇÃO DA GENTE. EVA IBRAHIM.

                                       SEMPRE NO MEU CORAÇÃO.

        Mara estava quieta em seu quarto, sua filha deitada no sofá da sala assistia á um programa da televisão; era a rotina dos domingos e feriados. Uma buzina soou e Leila, a filha, levantou-se rapidamente. Em seguida saiu dizendo que não sabia a hora que retornaria; bateu a porta e Mara pode ouvir o barulho de uma motocicleta arrancando. Imaginou a filha agarrada ao Jonas, o namorado, e fechou os olhos, de onde brotaram duas lágrimas.

         Lentamente levantou e foi sentar-se em frente ao computador. Estava carente, seu marido a deixara há muitos anos e somente agora a solidão viera para ficar. Quando Dalton, o marido, a trocou pela bebida ela foi trabalhar e tinha pouco tempo para se divertir. Mara viveu anos difíceis que a fizeram amadurecer muito; tornara-se forte e decidida lutando para sobreviver e manter sua filha.

       Há quatro anos conheceu um rapaz em seu trabalho, isto é, já se conheciam, mas, começaram a prestar atenção um no outro somente após uma colisão de corpos na saída do corredor. Sérgio abaixou-se para pegar a bolsa de Mara e ela também fez o mesmo movimento e tiveram uma proximidade difícil de explicar; olho no olho. A partir daquele momento alguma coisa se transformou, foram flechados pelo cupido. Seus olhares falavam mais que muitas palavras, amaram-se no silêncio, que trazia muita emoção e penetrava na alma.

       Um dia ele a convidou para saírem juntos e ela o acompanhou á uma palestra relacionada ao seu trabalho. Havia uma empatia entre eles, sentaram-se lado a lado e não prestaram atenção ao palestrante; estavam vivendo um momento mágico, onde não havia lugar para mais ninguém. Apesar de pessoas tão diferentes a atração estava presente. Mara era quase vinte anos mais velha que Sérgio e isto a incomodava. A mulher pensava na filha, amigos e parentes; ficariam chocados.

        Todos os dias eles viajavam juntos para o trabalho, a conversa fluía fácil; estavam apaixonados. Porém, uma barreira invisível os mantinha afastados. Os dois sabiam que o futuro para eles, como casal, era improvável. Eles ficavam juntos durante todo o trajeto; era a hora da felicidade. Marcavam encontros por telefone na ânsia de desfrutar da presença do outro. Os amigos e conhecidos ficavam boquiabertos em perceber a relação que era construída no dia a dia entre pessoas tão diferentes.

        A confiança que havia entre eles era absoluta, falavam sobre seus problemas mais íntimos. Sentiam o cheiro um do outro, mas, não se tocavam, apenas se admiravam. Durante um ano e meio aquela relação aconteceu e Mara desejava que Sérgio a abraçasse e beijasse; o que nunca de fato aconteceu. Viviam aquele amor platônico de contatos, mas rico em olhares, palavras e desejos. Era o céu e o inferno lado a lado.

        Até o dia em que ele não apareceu, no outro dia também não e assim foram minando as esperanças de Mara. Ele mudara de emprego e ela temia que fosse para se afastar dela, pois tinha certeza de seu amor. No fundo ela sabia que os vinte anos que ela trazia a mais que ele, um dia, faria a diferença. A família dele era totalmente contra o relacionamento dos dois.
A mulher se transformara num zumbi, vivia solitária. Quase não saia de casa, mas quando via um carro igual ao dele, seu coração disparava diante da possibilidade de revê-lo.
        Ela poderia amar qualquer pessoa de sua idade, que tudo seria normal, porém, seu coração escolheu aquele homem; cheio de mistério e quase vinte anos mais novo que ela. Sérgio era introspectivo e calado, um homem de difícil relacionamento. Mara não conseguia deixar de pensar nele; o amor que ele despertara nela era maior que sua razão.

       O tempo foi se arrastando e ela descobriu, por acaso, o local onde ele estava trabalhando, mas seu orgulho a impedia de procura-lo. Depois de tanto tempo ela temia que seu amor houvesse se casado e tantas outras dúvidas rondavam sua cabeça; tornara-se uma mulher angustiada e desiludida.

       Sentada em frente ao computador ela queria encontra-lo de qualquer maneira, tinha urgência em rever aquele rosto tão amado. Entrou confiante nos sites de busca de pessoas e digitou seu nome, Sérgio Amaral e apareceu uma porção de homens com o nome de seu amor, mas, nenhum era ele. Como se nunca tivesse existido, Sérgio não estava em lugar algum, somente em seu coração. Que estranho! Em um período de sua vida ele era real e bastava olhar para ela que tudo se transformava, criava luz e fazia a vida ficar mais colorida.

       Muitas vezes ele dirigia calado e com um simples olhar fazia a ponte mágica para a felicidade de Mara. Absorta olhava para as mãos de seu amor; imaginava ele pegando em suas mãos e todo seu corpo tremia silenciosamente; sentia-se ruborizada. Sérgio falava alguma coisa e Mara voltava á razão. A dúvida pairava no ar.
 -Será que ele tinha o mesmo sentimento por ela?
       No dia seguinte ele parava o carro, ela sentava-se ao lado dele e todas as dúvidas do mundo se esvaiam como por encanto. Naquele momento só existia os dois, o mundo era deles e tinha um nome, felicidade.

       Algumas vezes ele pedia para ela pegar alguma coisa no banco detrás e ela se esticava toda. Os braços dos dois roçavam levemente e a respiração acelerava; ambos ficavam ofegantes, tamanha era a proximidade, mas, desviavam tão rapidamente o olhar que numa fração de segundo voltava á lucidez e seguiam em frente pensativos. Sentados lado a lado tentavam desviar o sentimento falando de coisas rotineiras para esconder o rubor em seus rostos. Tentavam esquecer o sentimento aflorado à pele e os desejos escondidos; um muro invisível ficava entre eles.

       Com Sérgio, Mara conseguiu esquecer o passado e lembrou-se da vida e toda beleza que nela encontram as pessoas apaixonadas. Desejou muito estar ao seu lado, mas, ele afastou-se e o tempo passou deixando atrás de si uma mulher amargurada.
       -E se tivessem ficado juntos? Essa pergunta martelava em sua cabeça.
Teria sido tudo tão diferente, ela o amaria sem fronteiras, daria tudo de si em troca de tê-lo ao seu lado. Porém para ele as expectativas de vida eram outras, queria casar-se e ter filhos, o que Mara não tinha condições de lhe dar.

        O maior empecilho era a idade de Mara, que estava com mais de cinquenta anos e passara da menopausa. Ela tinha vontade de gritar que continuava a mesma e amava como se tivesse dezoito anos. A capacidade de amar não depende da idade, o ser humano pode se apaixonar em qualquer idade. Sérgio pensava em deixa-la apesar do amor que sentia e por isso a manteve distante. Ele sentia medo de não ter coragem de abandoná-la, pois a amava muito, confessara á uma amiga comum.

       Tanto tempo já se passou e ela sonha com a volta dele, espera ele viver a vida e ter os filhos que quiser para então retornar e viver o amor que nunca concretizaram.
Enquanto procura por ele na internet pensa que seu amor continua vivo e por isso não se interessa por ninguém; recusa-se a aceitar que seu sonho esteja perdido.
Enquanto houver vida, haverá esperança; ela sorri. Sérgio continua sempre em seu coração, disso ela tem certeza, pensa a mulher amargurada.

Um texto de Eva Ibrahim

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

"AS VEZES SÃO AS PEQUENAS DECISÕES QUE PODEM MUDAR A SUA VIDA PARA SEMPRE" AUTOR DESCONHECIDO--- O ESSENCIAL É VIVER EM PAZ CONSIGO MESMO. EVA IBRAHIM

                                            DINAMITE
           Lucas chegou à casa da tia Lola, levado pelos pais, em uma missão muito importante, escolher um cãozinho. A cadela, mãe dos cinco filhotes, fora comprada pelo pai do menino, Celso, irmão de Lola, como sendo cachorro “macho”. Na empolgação, o homem não se lembrou de olhar os órgãos genitais do animal, apenas aceitou o cão que lhe foi vendido e seguiu viagem; era uma surpresa para seu filho Lucas.
O nome fora escolhido pelo menino, “Roger”; durante alguns dias o cão corria e brincava no jardim da casa, tornara-se amigo da criança. Foi levado ao veterinário para tomar banho e vacinas, era peludo e estava gordo; uma beleza de cachorro. Quando o Celso foi busca-lo teve uma grande surpresa. O seu cão era uma cadela, o veterinário explicou ao rapaz. O homem fora enganado, pagara por “Roger” e trouxera a “Rogéria”. O homem ficou nervoso e queria tirar satisfações com a loja, mas seu filho já tinha se apegado a cadela e a melhor solução encontrada foi deixar o animal na casa de sua irmã, que não se importava em ter um filhote de cachorro do sexo feminino em sua casa. Assim, Lucas, o sobrinho poderia visita-la quando quisesse. E, quando que nascessem filhotes, Lucas iria escolher um cãozinho “macho”, filho da Rogéria, que morava com a tia Lola.
Rogéria era uma cadela de raça, uma bela fêmea de “Pastor alemão”. Tinha pedigree e certificado “falso” porque constava ser um cachorro. Ela era mansa, tinha pelos pretos e amarelos; uma fêmea bonita e vistosa. Logo arrumou um namorado na rua de sua nova casa. Um elegante e vistoso cão “Vira-lata” marrom, que a deixou prenha. Quando nasceram os cinco cãezinhos, a mulher não sabia o que fazer; teria que recorrer à doação. Lucas estava lá para escolher o seu presente de aniversário; um cãozinho fofo. Antes de levar o cão escolhido todos examinaram os órgãos genitais do animalzinho, pois, seu pai não queria cadela, ele temia que houvesse procriação em sua casa.
O menino saiu com seu presente no colo, estava muito feliz. Lucas olhou para ele e disse que ele tinha focinho de “Dinamite” e assim passou a ser chamado.
Dinamite era forte, saudável e bagunceiro. Um cão que comia chinelos, meias e roía o que estava por perto. Por diversas vezes Celso ameaçou leva-lo para o sitio de um conhecido. Lucas chorava, o pai se comovia e Dinamite continuava na casa. Certo dia a mãe do menino foi ao Supermercado e comprou carne moída, iria fazer quibes para o jantar.
A mulher colocou a carne sobre a mesa e foi guardar o restante do dinheiro no quarto, quando voltou à carne havia sumido. Saiu à procura e encontrou o cachorro com o focinho dentro do pacote de carne; ele comeu um quilo de carne moída. Só não foi jogado na rua porque Lucas chorava de soluçar; mais uma vez sua mãe relevou a traquinagem; ela amava o filho e não queria vê-lo desesperado.
Dinamite já estava com dois anos, um cachorro adulto, malandro e medroso. Em dias de jogos de futebol ele se escondia debaixo do automóvel da família; a cada rojão era um ganido dolorido.
A avó de Lucas adoeceu e a filha andava muito preocupada com a mãe; planejara uma visita naquela tarde. Era uma boa caminhada e antes de sair, a mulher procurou o cão para deixa-lo no quintal, mas, não o encontrou. Deduziu que estava na rua e seguiu com o filho para visitar sua mãe.
A tarde quente e ensolarada prometia chuva de verão no fim do dia, porém ela voltaria logo para sua casa; antes da chuva, pensou. Deixara a casa toda limpa, pois comprara um jogo novo de sofás e estava feliz com sua casa arrumada.
Ficara algum tempo conversando com sua mãe acamada enquanto Lucas brincava no quintal. De repente ouviu-se o barulho de um trovão e a mulher saiu para ver o tempo, que estava muito escuro. Sua mãe a aconselhou esperar a chuva passar, pois o tempo fechara de repente e viria muita água pela frente. A filha concordou, era perigoso sair com tantos relâmpagos e trovões.
Depois de uma hora a tormenta havia passado e mãe e filho tomaram o caminho de casa. Havia muitas árvores caídas nas ruas, a tempestade fora arrasadora. Ao chegar a casa o menino lembrou-se do cachorro:
- Onde o cão ficara durante a tormenta?-
Ao abrir a porta eles descobriram onde estava o Dinamite. Sobre o sofá novo em meio a muita espuma revirada em toda a sala. Ele destruíra o sofá novo, rasgando e mordendo a espuma; havia buracos profundos em cada assento. O cachorro ficara dentro da casa e com os trovões entrou em desespero e atacou o sofá.
A mulher abanava a cabeça apreensiva, como explicar a situação ao marido; ele ficaria furioso. Lucas olhava assustado para sua mãe, como reparar o desastre provocado por Dinamite?
Essa pergunta pairava no ar. O cão se aproximou abanando o rabo, não entendia que poderia virar um cão sem teto nas próximas horas. Dinamite e o menino saíram dali e a mãe começou a fazer a limpeza do local.
Quando terminou a faxina, a mulher viu o tamanho do estrago. Buracos esfiapados de circunferência de vinte centímetros, em cada assento. Seu sofá estava destruído e ela teria que explicar ao marido que o cão era inocente, deveria ter olhado melhor antes de fechar a casa. Para amenizar a situação ela preencheu os buracos com espuma da almofada e colocou sobre o assento uma toalha florida; ganharia tempo para arrumar uma desculpa.
Lucas, temeroso de perder o cachorro, se manteve calado; deixaria que a mãe resolvesse a situação complicada. O pai saia cedo e voltava tarde da noite, assim, alguns dias se passaram até que, no sábado, o pai sentou-se no sofá. Estranhou o desnível e levantou-se retirando a toalha que cobria os buracos.
Atônito, o homem chamou sua mulher.
- O que era aquilo? Perguntou espantado e furioso.
Mãe e filho se postaram em frente ao homem pedindo que ele perdoasse o cachorro, pois, ele não tivera culpa. O pai saiu sem responder e foi deitar-se, depois pensaria no caso.
No dia seguinte ele foi trabalhar e deixou mãe e filho na expectativa; não sabiam o destino de Dinamite. A noite, após o jantar ele expôs sua decisão: Se ficassem com Dinamite o sofá ficaria rasgado, porque ele não pagaria o concerto. Porém, se quisessem consertar o sofá ele doaria o cachorro a um amigo. Era uma escolha justa, pois todos estavam errados.
Lucas foi deitar-se chorando e sua mãe foi conversar com o filho. Ficariam com Dinamite e ela deixaria a toalha sobre o sofá até conseguir economizar dinheiro para comprar outro sofá. Por ora a situação fora contornada e Lucas passou a vigiar Dinamite até ele crescer e sossegar.
Há dois anos a toalha está cobrindo o sofá e o Dinamite continua bagunceiro, mas nada que se pareça com a tragédia do sofá, que já incorporou a toalha.
Um sofá novo está prometido para o próximo Natal, o pai relevou a decisão para fazer sua família feliz.

Um texto de Eva Ibrahim.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

"O ÊXITO DA VIDA NÃO SE MEDE PELO CAMINHO QUE VOCÊ CONQUISTOU, MAS, SIM PELAS DIFICULDADES QUE SUPEROU NO CAMINHO" ABRAHAM LINCOLN--- NÃO HÁ LUGAR ONDE SE ESCONDER DA JUSTIÇA DIVINA. EVA IBRAHIM

                                                                                                         
                                         A COBRANÇA. 
Os colonos da Usina de açúcar formavam um grupo alegre e trabalhador; a maioria eram imigrantes italianos. Moravam em Colônias distribuídas em lugares estratégicos para facilitar a locomoção dos cortadores de cana até os canaviais. Uma fazenda com muito verde, fartura de rios e animais. A natureza exuberante estava em toda parte, parecia um manto verde de vários tons. Havia pasto a perder de vista no horizonte; muitos animais de corte, vacas leiteiras e outros para trabalhar na lida, puxando carroças ou arando a terra. Uma fazenda próspera que construíra uma represa de onde era gerada sua própria energia elétrica.

 As casas dos colonos eram geminadas formando Colônias homogêneas que abrigavam muitas famílias; parecia um pedacinho da Itália naquele local. Nos quintais das casas formavam hortas, pomar de árvores frutíferas, galinheiros e chiqueiros de onde saia parte do sustento das famílias.

Aquele povo viera em busca de uma nova vida e trouxera consigo os costumes de sua terra. Em frente ás Colônias havia muitas árvores que faziam sombra para os animais pastarem. Viviam soltos e cada colono sabia qual era o seu animal, pois, traziam marcados com ferro quente as iniciais do nome do dono. Ali conviviam cabras, carneiros, cavalos, burros, vacas e cães, juntamente com o vai e vem dos moradores do local. Era um povo ordeiro, trabalhador e festeiro. Quando havia um casamento ou batizado a festa varava a noite com vinho e muita comilança.

Nessa época as famílias tinham muitos filhos, pois precisavam de muitos braços para trabalhar na lavoura. Poucos frequentavam a Escola, precisavam ajudar os pais na roça e no corte da cana de açúcar. Viviam felizes e prósperos na terra adotada. Tinham cooperativa de produtos variados, salão de festas, campo de futebol e uma Igreja para agradecer a Deus por tanta fartura. Aos domingos as moças sentavam-se embaixo das árvores para bordar os enxovais e sonhar com o futuro príncipe encantado. Era uma sociedade patriarcal; todo o dinheiro da família ia para as mãos do pai e este cuidava para que os filhos tivessem uma vida boa e com muita responsabilidade.

Enzo era filho de uma dessas famílias e destacava-se por ser um rapaz de pavio curto e sangue quente. Era trabalhador e honesto, mas, vivia arrumando brigas; ora com colegas, ora com vizinhos, era mal visto na Colônia. O rapaz havia notado que quando estava em casa, aos domingos, ele era acordado pelo barulho das cabras que vinham em frente a sua casa berrar, Mééé... Mééé..... Elas o estavam deixando nervoso e irritado. Precisava dar um jeito naquela situação, não seriam meras cabras que o iriam incomodar.

Pensou muito e resolveu dar uma lição nas criaturas que o irritavam tanto. Enzo levantou-se bem cedo no domingo, acendeu o fogão á lenha e pôs a chaleira de água para ferver. Quando as cabras chegaram, ele pegou a chaleira com água em ebulição e despejou sobre as costas delas. Saíram em alvoroço e os Mééé se multiplicaram enquanto o rapaz ficava rindo baixinho e pensando: ”estas não voltam mais”. Satisfeito voltara para a cama, a lição fora boa. O aprendiz de lobo mau deitou e dormiu como se nada tivesse acontecido.

Os dias foram passando e alguém, no trabalho, comentou que o vizinho perdera três cabras que morreram com estranhos ferimentos de queimaduras nas costas. Enzo ficou calado, porém, estava feliz, ficara livre das cabras para sempre.
 O tempo corria e o rapaz cada vez mais nervoso, implicava com tudo e todos; “era desajeitado e resmungão por natureza”, sua mãe dizia balançando a cabeça.

Depois de alguns meses ele estava trabalhando nas caldeiras de melaço de cana, já não se lembrava das cabras, quando houve um defeito na máquina em que ele trabalhava. Enzo não conseguiu consertar a caldeira  que estava prestes á explodir, levando o pânico ao local. O rapaz apavorado tentou segurar com as mãos a enorme caldeira, cujo metal estava avermelhado pelo calor. Ele soltou um grito desesperado enquanto suas mãos frigiam no metal fervente. Desfigurado pela dor, o rapaz caiu no chão e na mesma hora lembrou-se das cabras. A dor que sentiu era indescritível, diria mais tarde á sua mãe.

O problema no trabalho foi solucionado pela equipe de segurança da empresa, mas, as mãos de Enzo sofreram queimaduras de terceiro graus e levaria anos para sarar, disse o médico. Ele teria que submeter-se a diversas cirurgias para implante de pele nas palmas das mãos. O rapaz teria comprometida a sensibilidade das mãos para sempre, e não teria digitais, pois os dedos ficaram em carne viva.

Enzo sentiu medo pela ira de Deus, pois tinha certeza que aquilo fora castigo pelo ato criminoso que praticara com as cabras. Agora ele compreendia o tamanho da atrocidade que praticara e a dor que causara nos animais.Certamente Deus não aprovara sua atitude.
Chamou sua mãe, ainda no Hospital, e contou-lhe o que havia feito. Sua mãe chorou pela crueldade do filho e disse que acreditava que aquilo era a paga pelo crime cometido e o aconselhou a procurar o padre. Quando recebeu alta do Hospital, o rapaz foi à Igreja se confessar e pedir perdão á Deus.

Muitos anos já se passaram e o velho Enzo mostra para seus netos as cicatrizes que trás nas palmas das mãos e conta essa história para ilustrar a ira de Deus quando se comete maldades.
-A cobrança é cara e dolorida, por isso não gerem sofrimento, apenas promovam a paz- Diz o velho olhando para suas mãos.
Durante o tempo que passou para curar as mãos o homem aprendeu a ter paciência com tudo e todos, pois até para usar o banheiro precisava de ajuda. Até hoje ele tem dificuldade para segurar os objetos nas mãos.
Enzo sofreu muito e entendeu que sua maldade lhe foi cobrada com justiça para torna-lo um homem melhor. A mão que fere, um dia, também será ferida.


               Um texto de Eva Ibrahim.
MEU MUNDO REINVENTADO.

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