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sexta-feira, 26 de junho de 2015

"QUE MINHA SOLIDÃO ME SIRVA DE COMPANHIA, QUE EU TENHA A CORAGEM DE ME ENFRENTAR, QUE EU SAIBA FICAR COM O NADA E MESMO ASSIM ME SENTIR COMO SE ESTIVESSE PLENA DE TUDO". CLARICE LISPECTOR-- VIVER O LUTO PARA SOBREVIVER. EVA IBRAHIM

SOLIDÃO
CAPÍTULO QUINZE
            Quando Celina chegou ao portão de saída do cemitério, amparada por sua mãe, olhou para trás e viu uma calmaria inquietadora; nem uma folha de árvore se mexia. O tempo parecia haver parado ali, naquele silêncio assustador. A moça andou rapidamente até o automóvel de seus pais e se jogou no assento traseiro, pois, Cesar segurava a porta aberta para ela e a mãe entrarem. Em seguida, chorando pediu para sair logo dali; queria sumir e apagar aquele dia de sua vida.

             O trajeto até a casa de seus pais demorou uns trinta minutos, todos em silêncio, onde só se ouvia os soluços de Celina. A família permanecia calada, pois nada poderia minimizar a situação vivida pela viúva. A mãe aconchegava a filha apoiada em seu peito e o pai e irmão mantinham respeito pelo momento trágico.

             Os dias se arrastavam naquela casa e a moça ficava a maior parte do tempo dentro de seu antigo quarto. Estava emagrecida, pálida e muito triste; fora afastada de suas funções na escola por tempo indeterminado. Precisava se recuperar para assumir sua classe de educação infantil. As crianças precisavam da antiga alegria de Celina e não de sua depressão.

           O traço mais comum do luto, não é somente a depressão, mas, episódios de dor lancinante, carregados de ansiedade. A saudade de Fernando era quase insuportável para Celina, que compareceu à missa de sétimo dia com sentimentos de pânico, boca seca, revolta e mão trêmula; sempre apoiada pela mãe e familiares.

             No décimo dia, ela, a mãe e a sogra foram à casa onde a moça morava com o marido, pois, precisavam resolver o que fariam com as coisas que havia ali. A dor que começou desde o momento da dolorosa notícia, atingiu seu ápice no momento do retorno a casa do casal. As fotos do casal sorrindo em sua lua de mel na praia, despertaram em Celina uma crise de dor sufocante. A sogra se pôs a chorar e a mãe da viúva tentava mediar tanta dor.

         Foi uma grande tortura mexer nas coisas de Fernando; as três mulheres saíram arrasadas. O luto estava muito recente e deveriam chorar seu morto até aquela angustia se esvair. Os sentimentos de dor vinham a qualquer hora do dia ou da noite. Começava com a respiração permeada por suspiros profundos, inquietações, dificuldades de concentração e pensamentos relativos a perda, causando grande sofrimento.

             Em seguida, vinha o sentimento de revolta contra Deus; depois o isolamento forçado e a recusa em receber os amigos e parentes. Celina queria viver a solidão que lhe fora imposta do seu jeito. Então, passou a sair de casa disfarçada com roupas grandes, cabelos soltos e óculos escuros; dizia à sua mãe que precisava caminhar para não enlouquecer.

             Andava furtivamente a procura de alguma coisa nos lugares onde estivera com o marido; queria um sinal, uma lembrança dos momentos felizes que viveram juntos. Os dias passavam e ela nada encontrava e num certo dia ela pensou em ir à um centro espírita, na esperança de entrar em contato com Fernando. Entretanto, sua mãe a demoveu da ideia, incentivando-a a procurar o Padre e se aconselhar com ele.

         A viúva estava vivendo as dores do luto recente, dissera o pároco para a mãe da moça; deveriam vigiar e ter paciência, algum dia tudo aquilo passaria. Celina precisava daquele tempo de luto, para poder sobreviver a tragédia que fora seu casamento.

Antes da missa de um mês da morte de seu marido, a viúva quis ir ao cemitério e quando pôs suas mãos sobre o mármore frio, que cobria o túmulo, ela sentiu que ele não estava lá e saiu chorando. Naquele momento ela compreendeu que ele não seria encontrado em nenhum lugar, apenas viveria em suas lembranças.
Um texto de Eva Ibrahim.

Continua na próxima semana.

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