MOSTRAR VISUALIZAÇÕES DE PÁGINAS

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

"NÃO EXISTE AMOR QUE SOBREVIVA SÓ DE SENTIMENTOS, SEM A CONVERSA MANSA". RUBEM ALVES--- SIGA EM FRENTE, ESTE É O SEGREDO DA VIDA. EVA IBRAHIM.

                                  PERDAS E GANHOS
                                    CAPÍTULO OITO.
O domingo foi de reclusão total, as crianças foram ao Clube com um casal de amigos de Marcos. Clara ficou só, estava exausta por ter sofrido tanta emoção negativa. Quando as crianças voltaram já estava escuro e logo foram dormir. Na segunda feira, Sara a colaboradora da casa, chegou para trabalhar e viu que sua patroa estava com os olhos inchados de tanto chorar; ofereceu um chá, tentando consolá-la.
Depois que os filhos tomaram o ônibus escolar, Clara sentou-se na cadeira em frente à mesa da cozinha; precisava desabafar. E, enquanto catava os feijões que Sara havia colocado ali, para serem escolhidos, ela contou os últimos acontecimentos de sua vida para a mulher, que a ouvia enquanto cuidava de lavar a louça.
A mulher era de confiança e naquele momento era o ombro amigo que acolhia Clara. Vez ou outra Sara balançava a cabeça e dizia conhecer aquela história; havia muitas mulheres em sua comunidade que foram casadas e traídas. Eram histórias corriqueiras para as mulheres pobres de seu bairro, que tinham que trabalhar para sustentar os filhos pequenos.
A conversa fluía fácil, Sara era simples, porém, inteligente e esperta; uma mulher diplomada pela vida. Vivia com a filha, cujo marido estava preso e ela ajudava a criar as três crianças menores. A patroa perguntou do marido de Sara e soube que ele a deixou há muitos anos. Continuava casada, pois, não sabia se o marido estava vivo ou morto; era, portanto, mais uma mulher de papel. Sorrindo, a moça disse que tinha um namorado de fim de semana; vivia feliz.
        Clara foi para seu quarto imaginando como Sara poderia ser feliz com tantos problemas e uma vida tão difícil. Entretanto, aquela conversa lhe fizera bem, mostrou-lhe que havia vida após separações; ela aprenderia a sobreviver também. Os dias passavam lentamente e ela procurava ver televisão ou ler livros e revistas; precisava encontrar alguma coisa para preencher seu tempo.
        Sara a ouvia com muita atenção e a ajudava a entender algumas coisas que ela não conhecia, como por exemplo, ser independente do marido e poder curtir sua liberdade. Andar a esmo, passear sem destino, sair para dançar, participar de reuniões de mulheres da comunidade e dividir suas preocupações com outras pessoas. Clara sentia que seu problema encolhia, sempre que ela contava sua história.
        No sábado seguinte, Marcos apareceu dizendo estar com saudades dos filhos e também queria saber como sua esposa estava passando sozinha. Estava vestido com roupa esporte, bonito e cheiroso como sempre. Seu olhar era misterioso e parecia procurar algo diferente ou algum sinal que revelasse como sua mulher estava vivendo sem ele. Clara desceu serena e elegante; cumprimentou Marcos com educação e o deixou à vontade com os filhos.
        O homem ficou surpreso ao encontrar sua mulher bem disposta e arrumada; tudo continuava no mesmo lugar. Marcos almoçou com ela e as crianças e depois a chamou para conversar na varanda, onde tentou agarrá-la, no que foi repelido violentamente.
        - Que ficasse com sua piranha. Retrucou Clara, fechando a cara.
        Então, ele disse que ela deveria se preparar para acompanhá-lo ao casamento do filho de um de seus sócios. E, deveria levar as crianças também, era uma festa familiar. Todos os seus amigos a conheciam e não era bom dizer que a abandonara, ela deveria lhe fazer companhia sempre que ele precisasse. Ainda tinha deveres para com ele, já que ele continuava pagando as contas da casa.
Ela concordou em acompanha-lo e era só isso, que não tocasse nela. Antes de sair ele a ameaçou, dizendo:
        - Cuidado com o que você faz, estou de olho em você. Em seguida saiu cantando pneus.
       A mulher, além de magoada, agora fora intimidada, ele iria demarcar território, isto é, não a deixaria em paz. Ela chamou os filhos e contou-lhes toda a verdade sobre a saída do pai daquela casa. Ele tinha outra mulher e não voltaria a morar com eles; viria somente para visita-los. As crianças ficaram surpresas, mas não deram muita importância, não faltava nada para eles.
O casamento seria dentro de quinze dias e ela teria tempo suficiente para se preparar.  Mostraria a ele que estava muito bem sozinha.
Na quinta feira à tarde, Sara pediu dispensa do trabalho para ir a uma reunião de artesanato na comunidade de seu bairro e Clara perguntou se poderia acompanha-la. A moça ficou temerosa, pois, o lugar era simples. Mas, disse que seria muito bem recebida.
Clara ficou surpresa com os trabalhos das mulheres daquela comunidade; cada uma fazia um tipo de artesanato e depois vendiam na feira livre do sábado. Colchas de retalhos de fuxico, toalhas de crochê, guardanapos pintados à mão, sacolas de barbante, colares de contas e conchas. E, tantas outras coisas, que a mulher ficou encantada com a criatividade e a camaradagem que havia ali. Comprou algumas coisas e prometeu voltar outras vezes.
        Durante a semana, Clara procurou assuntar com Sara sobre aquelas mulheres e suas vidas; eram alegres e brincalhonas. Bem diferente das mulheres de seu círculo de amizades; fúteis e vazias. Ficou sabendo que o marido de uma delas, o Josias, e o irmão dele, o Tiago, orientavam as vendas e compravam o material necessário com o dinheiro arrecadado na feira. O restante era depositado num fundo que no final do mês era repartido entre as participantes. Havia uma organização que garantia o sustento das famílias envolvidas.
Clara acabara de conhecer um mundo novo, onde as pessoas eram simples, porém, mais felizes. Seu coração lhe dizia que aquele era um lugar mágico e que seu futuro estava ali.
Um texto de Eva Ibrahim.

Continua na próxima semana.
MEU MUNDO REINVENTADO.

UM BLOG PARA POSTAR CONTOS CURTOS E EM CAPÍTULOS.